Ao longo destes últimos dois anos tem ocorrido a muitos a questão: e se Portugal sair do Euro? Alguns defendem-no abertamente; outros opõem-se firmemente; a maioria interroga-se, receia e procura não pensar nas consequências que antevê catastróficas.

A verdade é que o nível da dívida pública reconhecida que se situa em 127% do produto interno bruto (PIB). A dívida pública reconhecida tem aumentado pela soma dos défices anuais consecutivos e das dívidas de empresas públicas que hoje consolidam com o Estado. Daí que se tenha passado de cerca de 90% do PIB para os actuais 127% do PIB. Se considerarmos ainda a dívida das empresas públicas que ainda não consolidam com o Estado e, principalmente, as responsabilidades que resultam das parcerias público-privadas, a dívida pública deve estar acima dos 140% do PIB, com aliás já se anuncia que sucederá em breve na sequência da revisão das normas contabilísticas europeias. Já em 2010, se a memória não me falha, um estudo do BPI calculava a dívida do Estado (consolidada e não consolidada) em mais de 126% do PIB.

Por princípio, este editorial não serve para defender correntes de opinião nem interesses políticos ou económicos. Este editorial serve para discutir temas de interesse geral de forma objectiva, procurando partilhar com os nossos leitores aquilo que sabemos, ou seja, falar de leis, justiça e Direito. Obviamente, ao prosseguirmos esse objectivo a nossa opinião cruza-se, por vezes confronta-se, com temas políticos, opções legislativas, interpretações de leis. Procuramos sempre ser objectivos na análise dos factos e rigorosos na leitura das leis.

Serve esta introdução para enquadrar os leitores no tema que me ocupa hoje: a proposta presidencial de um acordo de salvação nacional fundada na ameaça e na promessa de dissolução da Assembleia da República. Fiel aos princípios deste editorial, não me pronunciarei sobre os méritos e deméritos desse acordo, nem sobre as posições dos partidos e personalidades da vida pública portuguesa, nem mesmo sobre as consequências do sucesso desta iniciativa. Analisarei apenas e tão só o cabimento "constitucional" da proposta presidencial.

2013-03-26

Quando se esperava que as soluções para gerir os sucessivos episódios da crise do Euro já tivessem estabilizado, a União Europeia resolveu demonstrar que também sabe pensar fora da caixa.

Até agora, para evitar levantamentos descontrolados e a descapitalização dos sistemas bancários nacionais, nenhuma das intervenções da Troika tinha envolvido o confisco de depósitos bancários. E havia boas razões. Para além de haver uma garantia europeia de € 100.000 para depósitos no caso de falências dos bancos, o sistema bancário dos países periféricos poderia sair fortemente abalado e verificar-se uma corrida aos levantamentos. Já para não falar de ser extremamente injusto confiscar depósitos de pequenos montantes sem qualquer tipo de progressividade.

O Tribunal Constitucional ("TC") declarou inconstitucional o regime de limitação dos fundamentos de oposição à execução baseada em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória. A regra no processo declarativo é que toda a defesa deve ser deduzida na contestação, sob pena de se considerarem admitidos os factos a que o réu não se opôs, vendo o réu vê precludido o seu direito de apresentar defesa.  O TC põe agora em causa o princípio da preclusão, defendendo que o executado com base em injunção pode invocar os fundamentos gerais de oposição à execução, não porque o devedor executado foi impedido de invocar fundamentos de oposição que poderia ter invocado no procedimento de injunção, mas porque o processo de injunção não teve intervenção de um juiz - apenas de um secretário judicial.

Consequências práticas: numa execução baseada em injunção, o devedor passa a poder opor-se invocando, por exemplo, que o contrato não é válido, que o montante indicado no título foi calculado erradamente, que a dívida tem de ser compensada com outros créditos que já tinha sobre o credor, entre outras defesas possíveis.  O devedor poderá não se opor à injunção, sabendo que, se o credor eventualmente proceder para a execução, poderá aí invocar todas as defesas que pretender.

Pode ainda aceder a um estudo mais completo sobre esta matéria aqui

O governo publicou recentemente uma nova lei das parcerias público-privadas ("PPPs"). Trata-se de mais uma medida imposta pela Troika que melhora significativamente o processo de negociação e acompanhamento das PPPs mas que fica aquém do que deveria ser feito para corrigir os graves desequilíbrios que existem nas actuais parcerias sempre favoráveis ao sector privado.

A nova lei das PPPs, embora represente uma evolução significativa no domínio "processual" deveria ser complementada por uma reforma do regime "substantivo" que se nos afigura urgente. A reforma que propomos poderia servir de travão a novas PPPs sem nexo, contribuiria para pôr fim ao regime de "privilégio" vigente nas actuais concessões e permitiria eliminar por via de uma renegociação equilibrada as actuais rendas "excessivas" dos contraentes privados.

Poderá consultar a versão integral deste artigo aqui.

Nos últimos meses temos ouvido vezes sem conta falar da falta de financiamento bancário. As empresas dizem-se incapazes de aumentar a sua produção e exportar mais por falta de crédito. A má notícia é que os bancos não irão financiar a economia nos próximos anos mesmo que venham a obter a liquidez que hoje lhes falta. A boa notícia é que existe financiamento disponível para a economia portuguesa e que as boas empresas não devem temer a falta de crédito bancário mas encará-la como um desafio que podem ultrapassar.

Se olharmos de perto para as 1000 maiores empresas portuguesas encontramos muitas que padecem dos defeitos acima descritos mas existem igualmente muitas outras que têm o potencial para se tornarem melhores e maiores.

"Proponho que se comece pelas coisas mais simples e atacar dois dos maiores defeitos que encontramos nos juízes e nos advogados. Aos primeiros retiraria o luxo do tempo. Aos segundos limitaria o uso e o abuso da palavra". Refere o sócio fundador da Macedo Vitorino & Associados, António de Macedo Vitorino, num artigo de opinião para o Advocatus sobre a reforma do Código do Processo Civil.

Todas as tentativas de reforma do sistema da justiça em Portugal têm procurado agilizar a marcha dos processos modificando competências, formas de processo, organização dos tribunais, tramitação do processo, recursos etc.. Todas as reformas foram bem-intencionadas e tiveram alguns méritos. E, no entanto, persistem muitos dos mesmos problemas de sempre e os processos acumulam-se nos tribunais sem fim à vista. Dos vários artigos de opinião que se têm publicado sobre este tema ressalta invariavelmente uma crítica à mentalidade dos diversos intervenientes no processo. Na minha opinião, qualquer reforma da justiça que exija uma reforma de mentalidades estará certamente votada ao insucesso porque o tempo urge e é necessário que a justiça corra.

Como fazer, então, uma reforma de mentalidades que tenha efeitos imediatos? Não se faz. Não vale a pena reformar as pessoas porque as pessoas serão sempre as mesmas. Em todos os magistrados, oficiais de justiça e advogados persistem defeitos e virtudes. Proponho, por isso, que se comece pelas coisas mais simples e atacar dois dos maiores defeitos que encontramos nos juízes e nos advogados. Aos primeiros retiraria o luxo do tempo. Aos segundos limitaria o uso e o abuso da palavra. Olhemos a matéria dos prazos para as decisões dos tribunais. Não há nenhuma razão para que uns juízes decidam depressa e outros devagar.

Há processos iguais que correm na mesma comarca e na mesma vara que tardam muito com um juiz e menos com outro. Independentemente do mérito de um e do demérito do outro - não esqueçamos que os juízes são mulheres e homens como todos nós - a realidade indesmentível é que aos juízes é dada uma liberdade na condução dos processos que faz com que uns processos andem depressa e outros devagar. Ninguém mais tem essa liberdade. Aos advogados que falham um prazo aplicam-se sanções mais ou menos gravosas, o que faz com que os advogados organizem a sua agenda para atempadamente apresentar as peças processuais que lhes competem, assistir a julgamentos etc. O mesmo faz o médico, o operário fabril, o agricultor e assim se faz em todas as outras profissões. Só os juízes não têm prazos, o que leva a que haja sempre alguma razão para deixar para trás este ou aquele processo em detrimento de outro.

Aos juízes deve, portanto, ser imposto que pratiquem as diligências que devam tomar em prazos fixos e que o processo que tiver dado entrada primeiro seja o primeiro a ser resolvido. Aos advogados imporia limites para o número de factos que poderiam alegar a propósito de cada causa. Há duas formas simples de o fazer: primeiro, limitar o número de artigos que cada peça processual pode conter de acordo com o valor da causa; segundo obrigar os advogados a apresentar um resumo dos factos que fundamentam o pedido dando ao juiz o poder de só com este resumo fundamentar a sua decisão. Na realidade, todas as peças processuais poderiam ser apresentadas através formulários online limitando o número de caracteres.

Perdoem-me os meus colegas mas, regra geral, o advogado é palavroso, fala demais e gosta de se ouvir. Usa demasiados adjectivos, advérbios de tempo e modo. É palavra a mais. Alguns acham que assim servem o interesse dos seus clientes. A experiência diz-me que não, mas como não se pretende com este artigo mudar mentalidades, proponho apenas que se estabeleçam limites e regras para que a justiça melhore sem ter de mudar as pessoas.

Adivinho uma crítica: dir-se-á que as minhas propostas reduziriam a justiça a números e que não se pode fazer justiça limitando o tempo que os juízes têm para fazer justiça nem a liberdade dos advogados de invocar tudo quanto entenderem para melhor defender os seus clientes.

Acredito que não é assim e que nem o luxo do tempo nem o culto da palavra ajudam a que se faça melhor justiça. Certo é que tal como estamos sempre se fará menos justiça. Artigo de opinião da autoria do sócio fundador da Macedo Vitorino & Associados, António de Macedo Vitorino.

Fonte: Advocatus I Nº20 I Novembro 2011