2020-06-01
Susana Vieira

A moratória no pagamento das rendas devidas no âmbito de contratos de arrendamento urbano não habitacional, em vigor desde 7 de abril de 2020, foi prolongada de modo a vigorar após o fim do estado de emergência.

Com efeito, a Lei n.º 17/2020, de 29 de maio, vem estabelecer que:

  • Pode ser diferido até 1 de setembro de 2020 o pagamento das rendas que se vençam durante o período em que os estabelecimentos abertos ao público destinados a atividades de comércio a retalho e de prestação de serviços estiverem encerrados ou tiverem as atividades suspensas ao abrigo de disposição legal ou medida administrativa aprovada no âmbito da pandemia da doença COVID-19 (ou no primeiro mês subsequente desde que compreendido no período até 1 de setembro de 2020);
  • O pagamento das rendas em dívida deve iniciar-se a 1 de setembro de 2020 ou após o fim do mês subsequente àquele em que cessar a obrigação de encerramento ou suspensão se tal ocorrer primeiro, não podendo, no entanto, ultrapassar o mês de junho de 2021;
  • As rendas em dívida devem ser pagas em prestações mensais não inferiores ao valor que resultar da divisão do montante total em dívida pelo número de meses em que esta deva ser regularizada (i.e. até junho de 2021) juntamente com a renda do mês em causa;
  • A falta de pagamento das rendas que se vençam nos meses em que vigore a obrigação de encerramento ou suspensão e no mês subsequente, e até 1 de setembro de 2020, não pode ser invocada pelo senhorio para resolver, denunciar ou extinguir o contrato nem para exigir a desocupação do imóvel.

Recordamos que, de acordo com a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, com a redação dada pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, o encerramento de estabelecimentos ao abrigo de disposição legal ou medida administrativa aprovada no âmbito da pandemia provocada pela doença COVID-19 não pode ser invocado para resolver, denunciar ou extinguir contratos de arrendamento não habitacional nem para exigir a desocupação dos imóveis em que tais estabelecimentos se encontrem instalados.

Acresce que, até 30 de setembro de 2020, está suspensa a produção de efeitos da denúncia, revogação e oposição à renovação de contratos de arrendamento não habitacional efetuadas pelo senhorio bem como a caducidade dos contratos de arrendamento não habitacionais, salvo se o arrendatário não se opuser à cessação.

Depois de consecutivos meses de contenção social e económica, devido à crise sanitária provocada pela Covid-19, o País regressa gradualmente à normalidade com o levantamento de algumas das medidas de contenção, entre elas, o fim da suspensão dos prazos processuais.

A Lei n.º 16/2020, de 29 de maio determina a suspensão dos prazos processuais já no dia 3 de junho e com isso o regresso ao normal andamento dos processos judicias parados desde 9 de março. Assim, por exemplo, se até ao dia 8 de março tinham decorrido 20 dias do prazo para apresentar uma contestação (a apresentar em 30 dias), os restantes 10 dias contam-se a partir de 2 de junho, ou seja, o vigésimo primeiro dia do prazo será dia 3 de junho.  

Quanto aos prazos urgentes (em providências cautelares, insolvência e PER), os prazos já estão a decorrer desde o dia 7 de abril e só ficaram suspensos entre os dias 9 de março a 6 de abril. Para estes e demais processos, assiste-se ainda a um retorno da realização presencial das diligências processuais, mas com algumas diferenças.

Retoma-se a realização presencial das audiências de julgamento e de diligências que importem a inquirição de testemunhas, mantendo-se, todavia, como opção, os meios de comunicação à distância (teleconferência, videochamada ou outro equivalente), caso não resulte prejuízo para a realização da justiça. Por seu turno, nas demais diligências que requeiram a presença física dos seus intervenientes (por exemplo, audiências prévias), os meios de comunicação à distância são os meios preferenciais (salvo nos casos em que a sua utilização não seja possível), o que seria uma medida bem-vinda a manter no futuro.

Subsistem ainda algumas medidas excecionais de proteção, entre elas:

(a)    A suspensão do prazo de apresentação do devedor à insolvência;

(b)    A suspensão das ações e dos procedimentos especiais de despejo e dos processos para entrega de coisa imóvel arrendada, em caso de fragilidade do arrendatário por falta de habitação própria ou outra razão social imperiosa; e

(c)    A suspensão dos atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a entrega judicial da casa de morada de família, bem como a suspensão, a pedido do visado, de vendas e entregas judiciais de imóveis que sejam suscetíveis de causar prejuízo à sua subsistência, e desde a suspensão não cause prejuízo grave ou irreparável à contraparte.

Sobre as medidas tomadas durante o estado de emergência, poderá consultar as nossas anteriores publicações, disponíveis aqui e aqui.

No âmbito do plano de levantamento das medidas de confinamento associadas à pandemia da doença COVID-19, o Governo aprovou novas medidas, entre as quais se destaca um novo regime de teletrabalho e organização do trabalho.

Contrariamente às medidas excecionais adotadas durante o estado de emergência, em que se consagrava a obrigatoriedade do teletrabalho, este deixa de ser obrigatório a partir de 1 de junho, a não ser nalguns casos excecionais.

Eis as novas regras:

(i)             Possibilidade de ser adotado o regime de teletrabalho, nos termos previstos no Código do Trabalho (v.g. por meio de acordo escrito entre as partes);

(ii)            Obrigatoriedade, em determinadas situações, de adoção do regime de teletrabalho quando, independentemente do vínculo laboral e sempre que as funções em causa o permitam, o trabalhador o requeira expressamente:

a)     Trabalhador abrangido pelo regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos, legalmente consagrado, desde que tal situação se encontre comprovada por meio de certificação médica;

b)     Trabalhador portador de deficiência ou grau de incapacidade igual ou superior a 60%;

c)     Trabalhador que tenha a seu cargo filho menor de 12 anos, ou, independentemente    da idade, com deficiência ou doença crónica, que frequente estabelecimento de ensino ou equipamentos sociais de apoio à primeira infância ou à deficiência, que permaneça encerrado por determinação legal ou de autoridade administrativa, sendo certo que a medida apenas se aplica a um dos progenitores, independentemente do número de filhos ou dependentes a cargo, fora dos períodos de interrupções letivas;

Impossibilidade de os espaços físicos e a organização do trabalho cumprirem as orientações da Direção Geral de Saúde e da Autoridade das Condições de Trabalho, na estrita medida do necessário ao seu cumprimento (v.g. distanciamento físico entre trabalhadores).

Relativamente às situações em que não seja adotado o regime de teletrabalho, podem ser implementadas medidas específicas de organização do trabalho, entre as quais:

a)     Adoção de escalas de rotatividade de trabalhadores entre o regime de teletrabalho e o trabalho prestado no local de trabalho habitual, que podem ser diárias ou semanais; e

b)     Adoção de horários diferenciados de entrada e saída, bem como de pausas e de refeições.

As novas medidas apenas podem ser aplicadas se forem assegurados os limites máximos do período normal de trabalho e o direito ao descanso diário e semanal previstos na lei ou em instrumento de regulamentação coletiva aplicável.

As novas modalidades de organização do tempo de trabalho podem ser  aplicadas pelo empregador ao abrigo do seu poder de direção, desde que respeitado o procedimento legal aplicável.

O procedimento legal determina que devem ser consultados os trabalhadores e as respetivas  organizações representativas e dado um pré-aviso de 7 dias (ou de 3 dias, em caso de microempresa) antes de ser implementada a nova organização do trabalho (217.º Código do Trabalho).

Em suma: o teletrabalho pode permanecer, nos termos gerais do Código do Trabalho, mas deixa de ser obrigatório, como sucedeu durante o estado de emergência, no auge da pandemia da doença Covid-19. 

No início do combate à pandemia da COVID-19, os governos e os reguladores europeus aprovaram várias medidas regulatórias com o objetivo de mitigar as distorções que poderiam advir das medidas de confinamento generalizado das populações. Tomando como exemplo Portugal, na fase que coincidiu com a declaração do Estado de Emergência, verificou-se de facto não só um aumento acentuado do volume de tráfego como sobretudo uma alteração do perfil de tráfego, tendência que, de acordo com os dados mais recentes, tende a normalizar durante o corrente mês (ver situação em abril e situação em maio).

Para dar uma noção da intensidade da intervenção nos mercados, analisámos, com base numa recolha da Cullen International, as medidas tomadas numa amostra de 20 países, no início da pandemia, ou seja, durante o mês de março. A amostra é constituída pela Alemanha, Áustria, Bélgica, Croácia, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo,  Noruega, Polónia, Países Baixos, Portugal, República Checa, Reino Unido, Roménia e Suíça, agrupando-se a intervenção em cinco áreas distintas: (i) gestão de tráfego, (ii) portabilidade, (iii) espectro, (iv) preços de ofertas grossistas e (v) outras.

A primeira conclusão que retiramos é que, em 40% dos casos, os reguladores intervieram em apenas uma daquelas áreas, sendo o caso da Bélgica, Croácia, Finlândia, Luxemburgo, Países Baixos, e Suíça. Em 30% do total dos países, não tinha havido qualquer intervenção. No outro extremo, os países com maior intensidade de intervenção foram a Dinamarca, com intervenção  em duas áreas; Espanha, França, Irlanda, Itália, com intervenção em três áreas;  e Portugal, que atuou em quatro áreas.

Curiosamente, não se verificou nenhuma correlação entre a intensidade da intervenção dos reguladores e o impacto da pandemia nos respetivos países, pelo que, aparentemente, a reação se deveu a uma diferente perceção do risco ou a uma maior propensão para intervir no mercado.

As medidas aplicadas pelos reguladores diretamente sobre a utilização de redes variaram entre a aplicação de restrições aos serviços de streaming, à suspensão de funcionalidades em função da eventual necessidade da presença de profissionais on site, até à proibição de cancelamento de contratos. Ao nível da relação entre o regulador e os operadores, as medidas variaram entre a suspensão de obrigações e procedimentos de licenciamento e a cobrança de taxas. Além destas, registaram-se ainda alguns casos de intervenções sobre preços de ofertas grossistas.

A intervenção do governo e regulador em Portugal mostrou-se a mais intensa, centrando-se nas medidas gestão de tráfego, proteção de utilizadores, portabilidade, quer diretamente quer através da sensibilização do público para evitar a sobrecarga das redes, para além da suspensão de procedimentos administrativos (consulte aqui a situação do leilão 5G).

Já se encontram publicados no Boletim do Trabalho e Emprego os novos Acordos de Empresa da CP, que substituem acordos celebrados há cerca de 20 anos. São dois acordos, um para os trabalhadores pertencentes às categorias gerais e outro para os trabalhadores com a categoria de maquinista. A negociação foi acompanhada pela equipa de Direito Laboral da Macedo Vitorino &  Associados.

Os novos acordos foram celebrados com os sindicatos representativos de todas as categorias profissionais: SMAQ, SFRCI, FECTRANS/SNTSF, ASSIFECO, SNAQ, ASCEF, SINFB,   SINFA, SINAFE, SINDEFER, SNEET.

O Acordo de Empresa Geral foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, de 8 de maio, e o Acordo de Empresa do SMAQ no Boletim do Trabalho e Emprego de 29 de março.

Em termos breves, os novos Acordos de Empresa consagram, nomeadamente:

(i)     Aumento de €15,00 na tabela indiciária para todos os trabalhadores;

(ii)    Aumento do subsídio de refeição para €7,60;

(iii)   Aumento do montante das diuturnidades para €24,00;

(iv)   Aumento do subsídio de escala para 18,5%;

(v)    Atribuição de um subsídio de transporte no valor de €4,91/dia pago 13 meses a todos os trabalhadores operacionais, e que cumpram os requisitos definidos na respetiva cláusula;

(vi)   Afixação do mapa de escalas e de turnos com a antecedência de 15 dias, podendo, todavia, serem fixados com 10 dias de antecedência.

(vii)  Atribuição de complemento do subsídio de doença; e

(viii) Atribuição de seguro de saúde e de subsídio de pré-escolar.

A celebração dos novos Acordos de Empresa enquadra-se no princípio da autonomia coletiva e no direito à contratação coletiva, consagrados entre os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, no artigo 56.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.

A negociação coletiva, na qual se enquadra a celebração dos Acordos de Empresa, permite a adaptação das normais laborais, a flexibilização das condições de trabalho, bem como a regulação de uma diversidade de questões laborais que não têm previsão na lei laboral, garantindo a adaptabilidade da legislação laboral às especificadas das empresas. 

Em complemento das diversas medidas que têm vindo a ser adotadas no contexto da pandemia COVID-19, foram ontem publicadas novas medidas excecionais de caráter social, tendo em vista o alargamento da proteção concedida pelos diplomas em vigor.

Consagra-se:

(i)             O alargamento das medidas de apoio extraordinário aos membros de órgãos estatutários de pessoas coletivas com funções de direção, desde que: (1) tenham trabalhadores ao seu serviço, (2) estejam exclusivamente abrangidos pelo regime de segurança social nessa qualidade, (3) desenvolvam a atividade numa única entidade e (4) a entidade em questão tenha tido, no ano anterior, uma faturação inferior a €80.000;

(ii)            O alargamento das medidas de apoio extraordinário aos trabalhadores independentes não abrangidos, quer por não terem obrigação contributiva, quer por não preencherem os restantes requisitos de acesso ao apoio;

(iii)           A definição de um limite mínimo de €219,40 para os apoios referidos em (i) e (ii);

(iv)           A redução para 50% dos prazos de garantia previstos para acesso ao subsídio de desemprego, com uma diminuição de 180 para 90 dias de trabalho com registo de remunerações nos 12 meses imediatamente anteriores à data do desemprego e dos atuais 120 dias para 60 dias para as situações de desemprego involuntário por caducidade do contrato a termo ou de denúncia do contrato por iniciativa do empregador durante o período experimental;

(v)            A desburocratização do procedimento de atribuição do rendimento social de inserção, deixando de estar dependente da celebração de contrato de inserção;

(vi)           A criação de um apoio adicional, no valor de €219,40, para os trabalhadores a recibos verdes, nomeadamente para aqueles que nos últimos 12 meses não fizeram descontos, para a Segurança Social, por estarem isentos.

O alargamento dos referidos apoios pretende, pois, abranger um maior número de empregadores e trabalhadores que estavam até agora desprotegidos, motivo pelo qual, por um lado, foi facilitado o acesso ao subsídio social de desemprego e, por outros, os gerentes das pequenas empresas podem ter a sua remuneração financiada pelo Governo, durante os primeiros meses da crise.

No atual contexto da pandemia da doença Covid-19, as empresas questionam-se que medidas de prevenção do contágio entre trabalhadores poderão ser adotadas tendo em vista o regresso progressivo à atividade, nomeadamente se é admissível a recolha de dados relativos à saúde dos seus trabalhadores, incluindo a medição da sua temperatura corporal.

A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) veio pronunciar-se sobre este tema através de uma orientação sobre a recolha de dados de saúde de trabalhadores. A CNPD considera que o empregador não poderá proceder à recolha e registo da temperatura corporal dos trabalhadores, exceto quando recorra a profissionais de saúde no âmbito da medicina no trabalho e mediante justificação escrita.

Ao abrigo do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD), a temperatura corporal insere-se numa das categorias especiais de dados – dados de saúde – sujeito a proteção jurídica reforçada. O RGPD proíbe que os empregadores possam recolher ou registar dados de saúde dos trabalhadores, salvo para os efeitos previstos na legislação laboral. O Código do Trabalho prevê que o empregador não poderá exigir ao trabalhador dados de saúde, salvo quando particulares exigências inerentes à natureza da atividade o justifiquem e seja fornecida por escrito a sua fundamentação. Os dados de saúde devem ser prestados perante um médico, que só poderá comunicar ao empregador se o trabalhador está apto para trabalhar.

Partindo de uma interpretação literal desta norma do Código do Trabalho, a CNPD considera que o legislador não transferiu para o empregador uma função que é exclusiva das autoridades de saúde, nem estas delegaram tal função nos empregadores, o que é verdade. Esta norma não foi, todavia, pensada para ser aplicada em situações excecionais, mas num contexto dito “normal” da relação laboral. A aplicação da referida norma é, portanto, discutível neste cenário.

O Ministério do Trabalho já se pronunciou sobre o tema, considerando que a medição da temperatura corporal dos trabalhadores poderá ser viável em determinadas circunstâncias. O Governo deverá, em breve, clarificar o tema, por via legislativa, não sendo de esquecer que compete ao empregador o dever de cuidado, incluindo o dever de zelar pela segurança dos seus trabalhadores no local de trabalho e obviamente com recurso à proporcionalidade.

A título excecional, o RGPD (de aplicação imediata), prevê que o tratamento de dados de saúde é admissível, através de um profissional de saúde (sujeito a sigilo profissional), se esse tratamento for necessário por motivos de interesse público no domínio da saúde pública, nomeadamente para evitar a monitorização de epidemias e da sua propagação, o que é, sem dúvida, o caso. Este é o fundamento que legitimará os empregadores a procederem à recolha da temperatura corporal dos trabalhadores (dentro de determinados condicionalismos). Para situações excecionalíssimas, justificar-se-á a aplicação de regras também elas excecionalíssimas.

O direito administrativo, nomeadamente na vertente da contratação pública, é uma das áreas visadas pelas várias alterações introduzidas pelo governo para responder à adversidade criada pela Covid-19, com o objetivo de simplificar os procedimentos pré-contratuais. Eis um resumo das principais medidas aprovadas até à data.

Agilização nos procedimentos de ajuste direto

O Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março  estabeleceu medidas relativamente aos procedimentos de ajuste direto para a celebração de contratos de empreitada de obras públicas, de contratos de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços. Destacamos:

  • O ajuste direto é permitido com fundamento no requisito de existência de motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis, que não permitam o cumprimento dos prazos inerentes aos demais procedimentos e não sejam, em caso algum, imputáveis à entidade adjudicante;
  • Aumenta de € 5.000 para os € 20.000 o limiar máximo dentro do qual é possível recorrer ao procedimento de ajuste direto simplificado;
  • Não são aplicáveis as seguintes limitações:
    • Dever da entidade adjudicante adotar o procedimento de ajuste direto sempre que o recurso a mais de uma entidade seja possível e compatível com o fundamento invocado para a adoção deste procedimento;
    • Proibição de convidar a apresentar propostas entidades às quais a entidade adjudicante já tenha adjudicado, no ano económico em curso e nos dois anos económicos anteriores, propostas para a celebração de contratos cujo preço contratual acumulado seja igual ou superior a € 30.000, no caso de empreitada de obras públicas, ou € 20.000, no caso de locação ou aquisição de bens móveis e de aquisição de serviços;
    • Proibição de convidar a apresentar propostas entidades que tenham executado obras, fornecido bens móveis ou prestado serviços à entidade adjudicante, a título gratuito, no ano económico em curso ou nos dois anos económicos anteriores, exceto se o tiverem feito ao abrigo do Estatuto do Mecenato.
  •  Os contratos celebrados ao abrigo deste regime excecional produzem todos os seus efeitos logo após a adjudicação;
  • A entidade adjudicante pode efetuar adiantamentos de preço com dispensa dos pressupostos legalmente exigidos, nomeadamente:
    • O valor dos adiantamentos não ser superior a 30% do preço contratual; e
    • Ser prestada caução de valor igual ou superior aos adiantamentos efetuados.
    • Os contratos celebrados ao abrigo deste regime excecional sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas produzem todos os seus efeitos antes do visto ou da declaração de conformidade.

    O Decreto-Lei n.º 10-E/2020, de 24 de março, alargou este regime excecional de contratação pública a todas as entidades adjudicantes e não apenas às entidades do setor público empresarial, do setor público administrativo e autarquias locais.

    Suspensão de prazos, dispensa de documentos e de caução

    Inicialmente, a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, impôs uma suspensão dos prazos para a prática de atos por particulares no âmbito de procedimentos administrativos, abrangendo os procedimentos pré-contratuais.

    A Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, procedeu à segunda alteração ao regime excecional de contratação pública com  as seguintes medidas:

    • Levanta a suspensão dos prazos relativos aos procedimentos de contratação pública, retomando a sua contagem a partir do dia 7 de abril;
    • Os adjudicatários podem ser dispensados da apresentação dos documentos de habilitação, sem prejuízo da entidade adjudicante os poder pedir a qualquer momento;
    • Pode ser dispensada a prestação de caução, independentemente do preço contratual.

    Regime especial para aquisições na área da saúde

    A mais recente alteração ao regime excecional de contratação pública é o Decreto Lei n.º 18/2020, de 23 de abril, que traz as seguintes medidas:

    • Facilita, na medida do estritamente necessário e por motivos de urgência imperiosa, o recurso ao procedimento de ajuste direto simplificado para a celebração de contratos cujo objeto consista na aquisição de equipamentos, bens e serviços necessários à prevenção, contenção, mitigação e tratamento de infeção da Covid-19, ou com esta relacionados;
    • Apenas a Direção-Geral da Saúde, a Administração Central do Sistema de Saúde, I.P., o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, I.P., e os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E.P.E. podem recorrer ao procedimento de ajuste direito simplificado para este efeito.

    Este regime excecional de contratação pública deverá ser revogado logo que o controlo da Covid-19 em Portugal não o justifique,  o que se espera que aconteça após o levantamento do estado de calamidade que deve suceder ao atual estado de emergência.

À medida que a literacia digital ganha importância, cidadãos, empresas e a Administração Pública serão os pilares do novo Plano de Ação para a Transição Digital (o “Plano de Ação”) que acaba de ser publicado e que integra a estratégia portuguesa para o digital a ser implementada entre 2020 e 2023.

A inclusão digital dos cidadãos é um dos objetivos fundamentais do Plano de Ação, tendo em conta que um quarto da população portuguesa nunca utilizou a internet, números significativamente acima da média europeia (o que está a ter um impacto negativo na tentativa de promover o ensino à distância durante a pandemia da Covid-19).

Uma das dimensões mais importantes, considerando a conjuntura atual, é o programa de qualificação profissional (o “Upskill”) que, espera o governo, venha a suprir as carências de mão-de-obra qualificada em áreas de IT. O objetivo é ambicioso dado que prevê formar cerca de três mil participantes durante seis meses, de modo a dar resposta à escassez de recursos humanos qualificados em tecnologias da informação e da comunicação. Ainda na dimensão de qualificação, o plano pretende introduzir pelo menos um milhão de adultos à economia digital e deverá ainda promover a oferta de internet a preço reduzido. Será interessante ver como o Covid-19 poderá impactar esta dimensão.

No que respeita às empresas, é esperada a criação de zonas livres tecnológicas (ZLT) em várias regiões no sentido de promover a investigação e o desenvolvimento inovadores. Tanto as ZLT como o programa  +CO3SO Digital, visam promover empreendedorismo digital, particularmente em regiões menos povoada. Por último, existe ainda um programa de cidadania virtual inspirado no exemplo estónio (E-Residency) vem complementar os programas de inclusão digital e internacional da economia portuguesa.

O Startup Visa, Tech Visa, Sign Up for Portugal e o Startup Hub são exemplos de projetos e programas especificamente criados para promover o desenvolvimento do ecosistema empreendedor, tendo o objetivo de preparar Portugal para a transição digital das empresas e negócios e tornar o País num benchmark.

O plano dedica parte significativa dos seus objetivos e metas à transformação dos serviços da administração pública, em especial os que são mais utilizados pelos cidadãos. Nesta matéria, inclui medidas relacionadas com o cloud computing, serviços públicos digitais, escolas preparadas para o digital e acesso internacional aos serviços públicos.

Em certa medida, podemos dizer que o Plano de Ação é uma reconfiguração ou extensão de programas existentes ligados à transição digital, como o +C03SO ou o Startup Visa. É contemporâneo do leilão de espectro 5G que deverá ocorrer em 2020 (poderá ler mais sobre o leilão 5G aqui) e deverá apoiar a transição da economia portuguesa para a era digital.

Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD), aplicável desde 25 de maio de 2018, estabelece as regras relativas ao tratamento de dados pessoais em toda a União Europeia (UE). O RGPD tem como objetivo assegurar um nível coerente e elevado de proteção dos dados pessoais e sem comprometer a livre circulação de dados na UE.

O RGPD revogou a Diretiva 95/46/CE, de 24 de outubro de 1995, em vigor desde 1995, bem com a Lei 67/98, de 26 de outubro de 1998 (anterior lei de proteção de dados pessoais).

Desde agosto último, encontra-se também em vigor a Lei 58/2018, de 8 de agosto de 2019, que assegura a execução do RGPD na ordem jurídica portuguesa (Lei de Execução do RGPD).

Entidades públicas e privadas estão a tomar medidas excecionais para prevenir e mitigar a COVID-19 na UE, não sendo Portugal a exceção. Em Portugal, foi decretado o estado de emergência no passado dia 19 de março e, desde então, já foi prorrogado por duas vezes e permanecerá, pelo menos, em vigor, até ao dia 2 de maio de 2020.

No atual contexto de COVID-19, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) emitiu:

(a)         Deliberação n.º 2020/170, de 16 de março de 2020, na qual informa que os prazos de resposta aos projetos de deliberação se encontram interrompidos durante o período de estado de emergência, voltando a contar-se novo prazo findo aquele período; e

(b)        Três orientações:

(i)        Orientações de 2 de abril de 2020 sobre a utilização de sistemas de videovigilância e de alarmística no contexto COVID-19, nas quais se salienta que as empresas de segurança privada estão proibidas de exercer atividades que se enquadram no âmbito dos  poderes exclusivos das autoridades judiciárias ou policiais, incluindo o controlo fronteiriço e a prevenção e repressão de crimes em locais públicos;

(ii)       Orientações de 9 de abril de 2020 para os diferentes intervenientes nos tratamentos de dados pessoais efetuados na utilização de tecnologias de suporte ao ensino à distância, uma vez que os estudantes portugueses estão a ter ensino à distância; e

(iii)      Orientações de 17 de abril de 2020 sobre o controlo à distância em regime de teletrabalho, emitidas em resposta às múltiplas questões colocadas à CNPD relacionadas com a utilização de diversos softwares para o controlo da atividade laboral prestada em regime de teletrabalho, onde a CNPD esclarece que as normas laborais relativas à inadmissibilidade do controlo à distância do desempenho do trabalhador se mantêm aplicáveis.

Para além destas quatro iniciativas, não foram fornecidas informações adicionais relacionadas com a proteção de dados e a COVID-19 pela CNPD. Em sentido inverso, outras autoridades de supervisão, por exemplo, as suas congéneres no Reino Unido e na Alemanha, divulgaram um conjunto de elementos e de perguntas e respostas (FAQs) nos seus sítios de Internet para esclarecer questões relativas à proteção de dados decorrentes do atual contexto.

A presente situação pode implicar o tratamento de diferentes categorias de dados pessoais, incluindo de categorias especiais de dados pessoais, como é o caso dos dados de saúde, nomeadamente num contexto laboral. Não só na fase atual de propagação, mas também em fases subsequentes de estagnação e mitigação, o tratamento de dados pessoais pode ser necessário para o cumprimento de obrigações impostas por lei à entidade empregadora, por exemplo, obrigações relativas à saúde e segurança no local de trabalho, ou ao interesse público, por exemplo, para controlo de doenças e outras ameaças à saúde.

Tendo em conta que várias questões podem surgir no contexto laboral (mas não só), preparámos uma lista de perguntas e respostas (FAQs) para ajudar as organizações a responderem a estes novos desafios.

1. As entidades empregadoras podem recolher dados pessoais dos seus trabalhadores para evitar a propagação do vírus da COVID-19 no local de trabalho? Em caso afirmativo, que dados pessoais poderão ser objeto de tratamento pela entidade empregadora face ao atual contexto?

A entidade empregadora pode recolher dados pessoais dos seus trabalhadores por forma a evitar a propagação do vírus no local de trabalho, na medida em que tal seja necessário ao cumprimento dos deveres que lhes são impostos por lei (por exemplo, dever de cuidado) e à organização do trabalho nos termos da legislação laboral.

São os seguintes os critérios que devem presidir ao tratamento dos dados pessoais dos trabalhadores: (i) critério da necessidade, ou seja, o tratamento tem de ser necessário à prossecução de determinada finalidade (ou seja, se o tratamento for necessário à proteção da saúde dos trabalhadores e/ou ao cumprimento de obrigações impostas por lei, por exemplo, deveres de informação) e (ii) minimização dos dados em conformidade com o RGPD, o que significa que apenas podem ser objeto de tratamento os dados que sejam adequados, pertinentes e limitados ao que é necessário relativamente à finalidade prosseguida.

À partida, a recolha dos seguintes dados pessoais dos trabalhadores não levantará dúvidas: nome, dados de contacto, dados de contacto de outras pessoas dentro da organização, anterior ou futura permanência numa zona de elevado risco, anteriores contactos com pessoas possivelmente infetadas e ausência de sintomas. Por seu turno, os dados de saúde, os quais são considerados uma categoria especial de dados, estão sujeitos a regras específicas e que exigem critérios mais exigentes e uma inter-relação entre o RGPD, a Lei de Execução do RGPD e a legislação laboral, como melhor veremos abaixo.

2. Nestas circunstâncias, que requisitos devem as entidades empregadoras cumprir quando procedem ao tratamento de dados pessoais dos seus trabalhadores?

As entidades empregadoras podem recolher e tratar dados pessoais dos trabalhadores, incluindo dados de saúde, para determinar se (i) os trabalhadores estão infetados ou estiveram em contacto com uma pessoa infetada, ou (ii) se estiveram numa zona de risco elevado durante um determinado período.

As entidades empregadoras devem informar os trabalhadores sobre os casos COVID-19 e tomar medidas de proteção adequadas, mas não devem divulgar mais informações do que aquelas que sejam consideradas necessárias. Ou seja, as entidades empregadoras devem manter os trabalhadores informados sobre os casos de COVID-19 na sua organização, mas não devem identificar as pessoas em questão.

A divulgação de dados pessoais de pessoas infetadas (confirmadas e suspeitas) com o intuito de informar outros trabalhadores ou terceiros só é lícita se for estritamente necessário, em circunstâncias excecionais, conhecer a identidade dessa pessoa, a fim de mitigar a propagação da COVID-19 e permitir que os trabalhadores adotem as respetivas medidas de salvaguarda. Nestes casos muito excecionais (sempre que seja necessário revelar o nome dos trabalhadores que contraíram o vírus, por exemplo, num contexto preventivo), os trabalhadores em causa devem ser previamente informados e ser adotadas as medidas adequadas para assegurar a proteção da sua dignidade e integridade.

3. Qual é o fundamento jurídico para esse tratamento de dados pelas entidades empregadoras?

O tratamento de dados dos trabalhadores pode ser justificado pelo facto de o tratamento ser necessário para efeitos de prossecução de interesses legítimos da entidade empregadora e/ou de terceiros (artigo 6/1(f) RGPD).

Por sua vez, o tratamento de dados de saúde pode ser justificado se esse tratamento for necessário para efeitos do cumprimento de obrigações e do exercício de direitos específicos da entidade empregadora em matéria de legislação laboral, de segurança social e de proteção social (artigo 9/2(b) RGPD).

Neste âmbito, é ainda relevante ter em conta a inter-relação entre o RGPD, a Lei de Execução do RGPD e a legislação laboral, em particular:

(a)         O artigo 28.º/1 da Lei de Execução do RGPD, que estabelece que a entidade empregadora pode proceder ao tratamento dos dados pessoais dos trabalhadores para efeitos e dentro dos limites previstos no Código de Trabalho;

(b)        O artigo 17.º/1(b) do Código do Trabalho, que estabelece que a entidade empregadora não pode pedir a um trabalhador que divulgue dados de saúde, salvo quando circunstâncias excecionais relacionadas com a atividade profissional possam justificar essa divulgação e os respetivos fundamentos sejam fornecidos por escrito pela entidade empregadora. Os dados de saúde são fornecidos a um médico, que apenas pode informar a entidade empregadora se o trabalhador se encontra ou não apto ao exercício da sua atividade profissional; e

(c)         O artigo 29.º/2 da Lei de Execução do RGPD, que estabelece que categorias especiais de dados, nomeadamente dados de saúde, podem ser tratados por  razões de interesse público no domínio da saúde pública, tais como a proteção contra graves ameaças transfronteiriças à saúde, e que devem ser adotadas medidas adequadas e específicas para salvaguardar os direitos e liberdades do titular dos dados, nomeadamente  o sigilo profissional.

Isto significa que o fundamento jurídico relativo à prossecução de interesses legítimos da entidade empregadora e, relativamente aos dados de saúde, o fundamento jurídico relativo ao cumprimento de obrigações e do exercício de direitos específicos em matéria de legislação laboral, resultam do dever geral de cuidado da entidade empregadora para com os seus trabalhadores. Os dados de saúde devem ser tratados pela entidade empregadora, por meio de um profissional de saúde sujeito a sigilo profissional, o que significa que não podem, em princípio, ser divulgados a outros trabalhadores, salvo em circunstâncias excecionais e na medida em que tal se revele necessário para evitar a propagação da COVID-19 no local de trabalho.

Ao abrigo do dever de cuidado, a entidade empregadora deve assegurar a proteção da saúde de todos os seus trabalhadores, o que inclui igualmente uma resposta adequada à divulgação da COVID-19, para efeitos de prevenção e rastreabilidade (isto é, subsequente prevenção relativamente a pessoas que estiveram em contacto com os trabalhadores infetados ou potencialmente infetados).

Note-se ainda que o RGPD inclui derrogações à proibição do tratamento de determinadas categorias especiais de dados pessoais, tais como os dados de saúde, sempre que seja necessário por motivos de interesse público no domínio da saúde pública, tais como a proteção contra ameaças transfronteiriças graves para a saúde (artigo 9.º/2(i) RGPD), ou quando for necessário proteger os interesses vitais das pessoas (artigo 9.º/2(e) RGPD), quando o tratamento não se puder basear manifestamente noutro fundamento jurídico. Como refere considerando 46 do RGPD, alguns tipos de tratamento podem servir tanto importantes interesses públicos como interesses vitais do titular dos dados, por exemplo, se o tratamento for necessário para fins humanitários, incluindo a monitorização de epidemias e da sua propagação.

Por sua vez, o consentimento dos trabalhadores não pode ser considerado como um fundamento jurídico lícito, uma vez que, numa relação laboral, existe um claro desequilíbrio entre os trabalhadores (titulares de dados) e a entidade empregadora (responsável pelo tratamento). É pouco provável que o consentimento dos trabalhadores seja livremente dado no contexto de uma relação laboral.

4. As entidades empregadoras podem proceder ao tratamento de dados pessoais de visitantes do local de trabalho para fins relacionados com a COVID-19?

Sim, as entidades empregadoras podem proceder ao tratamento de dados pessoais dos visitantes do local de trabalho para fins relacionados com a COVID-19 para determinar se (i) estão infetados ou estiveram em contacto com uma pessoa infetada, ou (ii) estiveram numa zona de risco elevado durante determinado período, e desde que as medidas a adotar sejam proporcionais.

As medidas relativas a terceiros que exijam o tratamento de dados de saúde podem ser justificadas ao abrigo do RGPD se o tratamento for necessário por motivos de interesse público no domínio da saúde pública, tais como a proteção contra ameaças transfronteiriças graves para a saúde, prevendo-se a adoção de medidas adequadas e específicas que salvaguardem os direitos e liberdades do titular dos dados, em particular o sigilo profissional (artigo 9/2(i) do RGPD).

O consentimento dos visitantes (titulares de dados) só pode ser considerado como um fundamento jurídico lícito em matéria de medidas de combate à COVID-19 se cumprir todos os requisitos do consentimento previstos no RGPD, incluindo se os visitantes forem informados sobre o tratamento de dados e puderem dar o seu consentimento de forma voluntária. Isto significa que os visitantes devem estar cientes, pelo menos, da identidade do responsável pelo tratamento de dados (a organização) e das finalidades de tratamento a que os dados pessoais se destinam no contexto da COVID-19.

5. A entidade empregadora pode recolher números de telemóvel e endereços de correio eletrónico privados dos seus trabalhadores?

Durante a pandemia, o recurso ao teletrabalho surge, quando seja possível, como uma alternativa viável para evitar deslocações ao local de trabalho e contacto físico com outros trabalhadores ou terceiros. Por isso, tornou-se uma realidade trabalhar a partir de casa com recurso aos dispositivos ou equipamentos de comunicações dos próprios trabalhadores.

Além do mais, neste contexto, pode revelar-se necessário proceder à recolha de números de telemóvel e endereços de correio eletrónico privados dos trabalhadores, o que é lícito, se esses dados pessoais forem utilizados para assegurar a "disponibilidade contínua" (mas não ininterrupta) dos trabalhadores durante a atual crise da COVID-19, nomeadamente quando estejam no referido regime de teletrabalho.

Pode também ser necessário recorrer à utilização desses dados se, por exemplo, a infraestrutura de tecnologias de informação da própria organização ficar sobrecarregada ou caso se verifique um problema técnico que cause uma interrupção nas comunicações, revelando-se necessário recorrer ao telemóvel ou ao endereço de correio eletrónico privados dos colaboradores para efeitos de comunicação para fins laborais. Nesta situação, deve ser assegurado, na medida do possível, que não são partilhados dados sensíveis através de meios de comunicação que não sejam considerados seguros, nomeadamente através do correio eletrónico, por forma a salvaguardar o risco de acesso não autorizado aos dados por terceiros.

Na verdade, deve ser adotado o mesmo tipo de medidas de segurança em regime de teletrabalho do que aquelas que são adotadas em circunstâncias normais, por exemplo, encriptação de hardware e software, um sistema de autenticação de password em dois/três níveis, manter ficheiros de registo de acessos (log in).

Além do mais, os dados só podem ser utilizados para a finalidade pretendida e devem ser imediatamente eliminados após cessar a finalidade de tratamento.

6. As entidades empregadoras podem utilizar soluções tecnológicas para controlo remoto do desempenho dos seus trabalhadores em regime de trabalho à distância? Por exemplo, podem ser gravadas chamadas de videoconferência entre trabalhadores?

De acordo com as recentes orientações emitidas pela CNPD, a regra geral de proibição de utilização de meios de vigilância à distância, com a finalidade de controlar o desempenho profissional do trabalhador, é plenamente aplicável à realidade de teletrabalho. Aliás, à mesma conclusão sempre se chegaria pela aplicação dos princípios da proporcionalidade e da minimização dos dados pessoais, uma vez que a utilização de tais meios implica uma restrição desnecessária e seguramente excessiva da vida privada do trabalhador.

Por esta razão, soluções tecnológicas para controlo à distância do desempenho do trabalhador não são admitidas ao abrigo do RGPD e demais legislação aplicável. Refere a CNPD que são disso exemplo os softwares que, para além do rastreamento do tempo de trabalho e de inatividade, registam as páginas de Internet visitadas, a localização do terminal em tempo real, as utilizações dos dispositivos periféricos (ratos e teclados), fazem captura de imagem do ambiente de trabalho, observam e registam quando se inicia o acesso a uma aplicação, controlam o documento em que se está a trabalhar e registam o respetivo tempo gasto em cada tarefa (por exemplo, “TimeDoctor”, “Hubstaff”, “Timing”, “Manic Time”, “TimeCamp”, “Toggl”, “Harvest”).

Ferramentas deste tipo recolhem manifestamente em excesso dados pessoais dos trabalhadores, promovendo o controlo do trabalho num grau muito mais detalhado do que aquele que pode ser legitimamente realizado no contexto da sua prestação nas instalações da entidade empregadora. E a circunstância de o trabalho estar a ser prestado a partir do domicílio não justifica uma maior restrição da esfera jurídica dos trabalhadores. Nessa medida, a recolha e o subsequente tratamento daqueles dados violam o princípio da minimização dos dados pessoais e são, portanto, proibidos. 

Do mesmo modo, não é admissível impor ao trabalhador que mantenha a sua câmara de vídeo permanentemente ligada, nem será, em princípio, de admitir a possibilidade de gravação de videochamadas entre a entidade empregadora e os trabalhadores.

Apesar da inadmissibilidade da utilização de tais ferramentas, a CNPD salienta, todavia, a entidade empregadora mantém o poder de controlar a atividade do trabalhador, o que poderá fazer, designadamente, fixando objetivos, criando obrigações de reporte com a periodicidade que entenda, marcando reuniões em teleconferência.

7. Os ficheiros de trabalhadores podem ser objeto de tratamento no domicílio de um trabalhador (por exemplo, pelo pessoal de Recursos Humanos)?

O tratamento dos ficheiros de trabalhadores só pode ocorrer no domicílio de um outro trabalhador, que faça, por exemplo, parte do Departamento de Recursos Humanos, em circunstâncias excecionais, ou seja, se esse tratamento for estritamente necessário e na medida em que sejam tomadas medidas técnicas e organizativas adequadas para proteger os dados pessoais contra a sua perda, destruição ou danificação acidental, incluindo, por exemplo, encriptação de hardware e software, um sistema de autenticação de senha em dois/três níveis, ficheiros de registo de acesso, não impressão de documentos no domicílio.

 

Se precisar de mais esclarecimentos ou assistência em quaisquer questões relacionadas com questões de proteção de dados pessoais, não hesite em contactar-nos.