As empresas dispõem de mais um instrumento para contratar jovens.
Embora já existam outras medidas para promover a empregabilidade dos jovens, como as medidas “Estágios +Talento” e “Emprego +Talento” (ambas criadas pela Portaria n.º 221/2024/1, de 23 de setembro), foi criado mais um incentivo à empregabilidade jovem, com a aprovação da “Medida Excecional de Incentivo ao Regresso ao Trabalho para Jovens Desempregados” (“IRT Jovem”), que consta da Portaria n.º 336/2025/1, de 7 de outubro.
Em traços gerais, a Portaria em referência visa “estimular a procura ativa de emprego e compensar financeiramente os jovens que celebrem contrato de trabalho antes do termo do período de concessão do subsídio de desemprego”. Ou seja, a medida procura promover uma reintegração profissional mais célere, reduzir a duração média do desemprego, melhorar as taxas de colocação e contribuir para a racionalização da despesa pública com prestações sociais.
A medida IRT Jovem vigorará somente até 30 de junho de 2026, podendo ser cumulada com os apoios à contratação expressamente previstos na Portaria.
Os principais aspetos a salientar são:
I. Âmbito de aplicação:
A medida tem como destinatários jovens com idade inferior a 30 anos, beneficiários de subsídio de desemprego que, à data da celebração do contrato de trabalho, estejam inscritos como desempregados no Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I. P. (IEFP, I. P.), em data anterior à publicação Portaria em apreço.
O referido contrato de trabalho a celebrar pelos jovens deve ter as características específicas previstas na Portaria, nomeadamente:
- Ser celebrado com entidade que possua atividade registada em Portugal continental e que cumpra a legislação laboral portuguesa;
- Ser celebrado a tempo completo e após a data da entrada em vigor da aludida Portaria;
- Ter duração igual ou superior a seis meses; e
- Ser relativo a posto de trabalho localizado no território de Portugal continental.
Não são elegíveis os contratos de trabalho celebrados com a última entidade empregadora do trabalhador ou se o jovem for sócio da entidade empregadora. Também não são elegíveis no caso de o jovem ser membro de órgãos estatutários (“MOE”) ou cônjuge de MOE, ou, ainda, se o contrato for celebrado entre cônjuges ou pessoas que vivem em união de facto.
Para acesso ao apoio financeiro previsto na referida Portaria, os destinatários devem reunir os requisitos previstos na mesma, nomeadamente:
- Estarem registados no portal iefponline, em https://iefponline.iefp.pt/, e terem subscrito o serviço de notificações eletrónicas do IEFP, I. P., no mesmo portal;
- Terem conta bancária em nome próprio;
- Não se encontrarem em situação de incumprimento no que respeita à situação tributária e contributiva junto da administração fiscal e a segurança social; e
- Não se encontrarem em situação de incumprimento no que respeita a apoios financeiros concedidos pelo IEFP, I.
Os destinatários só podem beneficiar uma vez do apoio financeiro da presente medida.
II. Apoio Financeiro e respetivo pagamento:
A medida consiste na atribuição de um apoio financeiro a conceder pelo IEFP, I. P. aos beneficiários de subsídio de desemprego que concluam com sucesso a sua procura ativa de emprego, através da atribuição de um valor monetário mensal igual a:
- 35 % do valor mensal do subsídio de desemprego, em caso de celebração de contrato de trabalho sem termo;
- 25 % do valor mensal do subsídio de desemprego, em caso de celebração de contrato de trabalho a termo ou de contrato de trabalho a termo incerto.
O apoio financeiro tem o seguinte limite temporal:
- Durante o período remanescente de concessão do subsídio de desemprego que deixa de auferir;
- Durante o prazo de duração do contrato de trabalho celebrado, no caso de este ser inferior ao período previsto no ponto anterior.
No cálculo do referido apoio deve considerar-se o montante diário do subsídio de desemprego deferido à data de início da vigência do contrato de trabalho.
Saliente-se que as situações de suspensão do contrato de trabalho não relevam para efeitos de pagamento do apoio financeiro, na medida em que o vínculo contratual se mantém.
O pagamento do apoio financeiro não é efetuado de uma só vez, mas sim em diferentes tranches devidamente discriminadas na Portaria. Em regra, não será devido qualquer apoio financeiro se cessar o contrato de trabalho apoiado antes de decorrido um mês completo de vigência.
O desempenho de atividade profissional ao abrigo do contrato de trabalho apoiado suspende o pagamento do subsídio de desemprego, sem prejuízo do seu reinício, nos termos previstos no regime jurídico de proteção no desemprego.
III. Candidatura e Termo de Aceitação
O período de candidatura à medida é definido por deliberação do conselho diretivo do IEFP, I. P. e divulgado no seu portal eletrónico (existindo, inclusivamente, um guia de candidatura para auxiliar na realização da mesma), devendo a candidatura ser efetuada nesse mesmo portal no prazo máximo de 30 dias consecutivos a contar da data de início do contrato de trabalho.
A Portaria elenca de forma discriminada as diferentes fases e procedimentos de candidatura.
As candidaturas são aprovadas por ordem de entrada, até ao limite da dotação orçamental atribuída à medida, pelo que a atribuição da medida nem sempre é garantida.
A Portaria prevê, ainda, a obrigatoriedade de entrega de “Termo de Aceitação” pelo destinatário, através do qual os destinatários declaram aceitar as condições de atribuição do apoio, assumindo as obrigações decorrentes da candidatura aprovada e comprometendo-se a cumpri-las integralmente perante o IEFP, I. P., obrigando-se, nomeadamente, a:
- Manter o contrato de trabalho sem termo durante o período mínimo de 12 meses;
- Manter o contrato de trabalho a termo certo ou incerto durante, pelo menos, 6 meses; e
- Comunicar, por escrito, ao IEFP, I. P., a mudança de domicílio ou de qualquer alteração à candidatura inicialmente aprovada, nomeadamente a cessação do contrato de trabalho e respetiva causa, no prazo de 10 dias úteis, a contar da data de ocorrência.
A verificação da manutenção do contrato de trabalho supra referida pode ser efetuada através da consulta de informação disponibilizada pela segurança social.
IV. Incumprimento
O incumprimento do disposto na referida Portaria determina a cessação imediata do apoio e a obrigação de restituição dos montantes já recebidos (total ou proporcionalmente), sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal.
O destinatário da medida deve ainda restituir a totalidade do apoio financeiro recebido quando, antes de decorrido o prazo de concessão do apoio, se verifique alguma das seguintes situações devidamente elencadas na Portaria, designadamente:
- Denúncia do contrato de trabalho promovida pelo trabalhador;
- Cessação do contrato de trabalho por acordo; e
- Despedimento por facto imputável ao trabalhador (neste caso, sempre que o destinatário intente ação judicial contra a entidade empregadora com fundamento na ilicitude do despedimento, os prazos para a restituição dos apoios são suspensos até ao trânsito em julgado da respetiva decisão judicial).
Cessando o contrato de trabalho por iniciativa da entidade empregadora, ou nas duas primeiras situações acima identificadas, não haverá lugar à restituição do apoio, mantendo-se as obrigações decorrentes deste até ao final do prazo inicialmente previsto, desde que o destinatário apresente ao IEFP, I. P., no prazo de 30 dias úteis a contar da data de cessação do contrato de trabalho, novo contrato de trabalho que cumpra os requisitos identificados na Portaria.
Por fim, a Portaria prevê que os destinatários devem, ainda, restituir a totalidade do apoio financeiro recebido quando se verifique qualquer forma de simulação para acesso ao apoio estipulado na Portaria, sem prejuízo do exercício do direito de queixa por eventuais indícios da prática de crime.
No dia 26 de setembro de 2024, o Tribunal da Relação de Évora (“TRE”), proferiu um novo acórdão, no âmbito de uma ação de impugnação da licitude do despedimento. O TRE concluiu que é admissível a utilização de imagens de videovigilância como meio de prova para fundamentar a justa causa de despedimento de um trabalhador, sem ser necessário aguardar pela conclusão do processo criminal, estando em causa a prática de um crime de furto pelos trabalhadores.
A decisão destaca-se pelo facto de admitir a utilização das referidas imagens sem necessidade de conclusão do processo criminal, o que não tinha ainda sucedido, na medida em que “o artigo 28.º n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto estipula que as imagens gravadas e outros dados pessoais registados através da utilização de sistemas de vídeo ou outros meios tecnológicos de vigilância à distância, nos termos previstos no artigo 20.º do Código do Trabalho, só podem ser utilizados no âmbito do processo penal; e que neste caso, as imagens gravadas e outros dados pessoais podem também ser utilizados para efeitos de apuramento de responsabilidade disciplinar, na medida em que o sejam no âmbito do processo penal”.
Fundamentando a sua decisão, o TRE citou:
- O disposto no artigo 329.º, n.º 2, do Código do Trabalho, o qual obriga o empregador a iniciar o procedimento disciplinar nos 60 dias subsequentes àquele em que teve conhecimento da infração, sob pena de caducidade; e
- O mencionado num outro Acórdão da Relação de Lisboa de 26 de setembro de 20218: "a dupla natureza disciplinar e criminal, ainda que alargue o referido prazo prescricional do n.º 1 do art.º 329.º do CT/2009, não implica ou acarreta, necessariamente, idênticas consequências no que concerne aos demais prazos daquela disposição, pois a circunstância de as condutas do trabalhador estarem ou poderem vir a ser investigadas criminalmente não obsta, em regra, a que a entidade empregadora possa fazer a sua investigação e prova interna e completa desses mesmos factos no âmbito do procedimento disciplinar (…) e, nessa medida e sequência, proceder, objectiva e plenamente, de consciência absolutamente tranquila, ao despedimento com justa causa daquele ou ao seu sancionamento com outra pena, conservatória do vínculo laboral."
O TRE salientou ainda que, desde a entrada em vigor do Regulamento Geral de Proteção de Dados ("RGPD"), a Comissão Nacional de Proteção de Dados ("CNPD") já não tem competência para autorizar previamente a instalação de sistemas de videovigilância no local de trabalho (exceto se também envolverem a captação de áudio), cabendo-lhe apenas funções de fiscalização e controlo do cumprimento das regras de proteção de dados, nos termos do artigo 6.º da Lei 58/2019, de 8 de agosto.
O TRE esclarece ainda ser responsabilidade exclusiva do empregador assegurar que a instalação e utilização de sistemas de videovigilância respeita a legislação aplicável, em conformidade com o RGPD.
Este entendimento tem como consequência a revogação tácita do artigo 21.º, n.º 1, do Código do Trabalho, que ainda previa a necessidade de autorização prévia da CNPD, autorização essa que a lei já não permite conceder.
O Supremo Tribunal de Justiça (“STJ”) confirmou, em acórdão de 25 de junho de 2025, que uma reestruturação interna da empresa pode, por si só, justificar o despedimento por extinção do posto de trabalho ou o despedimento coletivo, mesmo que o mesmo não implique a superação de desequilíbrios económico-financeiros.
O caso teve origem no despedimento de uma trabalhadora em 2021, ao abrigo do regime de extinção do posto de trabalho. O empregador alegou dificuldades financeiras resultantes da pandemia de COVID-19, designadamente a redução de receitas e o aumento de despesas. Essa situação levou a empresa a implementar uma reestruturação interna com o objetivo de recuperar o equilíbrio económico-financeiro.
A decisão do despedimento foi confirmada pelo tribunal de primeira instância e pelo Tribunal da Relação. No recurso para o STJ, a trabalhadora alegou que os motivos apresentados não eram verdadeiros ou adequados e que a decisão tinha como alvo a sua pessoa e não o posto de trabalho em si.
No acórdão, o STJ afirma que a reorganização da estrutura interna da empresa, quando assente em critérios de gestão, é suficiente para justificar o despedimento. Sublinhou ainda que não compete aos tribunais avaliar a bondade da decisão do ponto de vista da gestão empresarial, mas apenas verificar se:
- Os motivos apresentados são verdadeiros e consistentes;
- Existe um nexo direto entre esses motivos e o despedimento; e
- Foram cumpridos os procedimentos legais exigidos.
Assim, o tribunal esclarece que uma reestruturação interna (mesmo assente em fatores conjunturais e não estruturais) pode servir de fundamento legítimo para despedimento, desde que cumpridos os requisitos legais. Como refere o acórdão “o Tribunal deve respeitar os critérios de gestão da empresa, na medida em que sejam razoáveis e consequentes. Não compete ao Tribunal apreciar se o despedimento era a única medida possível ou se se revelou eficaz para o fim pretendido”.
O entendimento do STJ reforça que, perante uma reestruturação devidamente fundamentada e realizada nos termos da lei, o papel dos tribunais resume-se ao controlo da legalidade e da efetividade dos motivos alegados, sem entrar no mérito da decisão de gestão. Esta orientação oferece maior clareza sobre os limites da intervenção judicial e orienta tanto empregadores como trabalhadores quanto às exigências formais e materiais do despedimento por extinção de posto de trabalho ou coletivo.
Fica assim mais clara a delimitação entre a autonomia de gestão das empresas e o controlo jurisdicional, elemento essencial para a estabilidade das relações laborais.
Os novos planos para a igualdade de género devem ser entregues até 15 de setembro do presente ano. Convém, por isso, iniciar a sua preparação.
A Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego “(CITE”) publicou recentemente, no seu sítio da internet, as “Recomendações aos Planos para a Igualdade – 2025”.
Compete agora às empresas consultar, analisar e começar a preparar os novos planos para a igualdade de género, tendo por base as referidas recomendações.
As empresas deverão ainda, para além das recomendações específicas, consultar o regime legal aplicável, bem como o Guião da CITE disponibilizado para o efeito, a mais recente ferramenta tecnológica (portal) que permite auxiliar na sua elaboração.
Conforme recorda a CITE, no seu sítio da internet, os planos para a igualdade constituem um importante instrumento de gestão que permite a “implementação e operacionalização, de forma transversal, da igualdade de género em contexto empresarial”.
A sua elaboração é obrigatória para as empresas cotadas e para entidades do setor empresarial do Estado e do setor empresarial local. Sendo voluntária para as demais, é um importante instrumento de responsabilidade social corporativa.
A elaboração anual dos planos para a igualdade de género tem como principal objetivo alcançar uma efetiva igualdade de tratamento e de oportunidades entre mulheres e homens, promovendo a igualdade no acesso ao emprego, a igualdade nas condições de trabalho, a igualdade remuneratória, a proteção na parentalidade e a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal.
Está em causa, no limite, a promoção da igualdade de oportunidades.
As obrigações das empresas não terminam, todavia, com a entrega do plano, pois, como previsto na quarta fase do guião da CITE, é necessário que haja uma monitorização contínua da implementação do plano.
O plano deve ser elaborado em conformidade com a lei e segundo recomendações e regras específicas de Compliance que importa acautelar.
Recorda-se que a violação de regras em matéria de igualdade faz as empresas incorrer em contraordenações graves e muito graves.
Numa era de globalização, o destacamento de trabalhadores tem vindo a assumir cada vez maior relevância. O objetivo principal do regime legal aplicável ao destacamento de trabalhadores é permitir a livre circulação de trabalhadores garantindo, ao mesmo tempo, a proteção dos seus direitos laborais, bem como a proteção da concorrência de empresas a operar no mesmo mercado.
1. Destacamento para Portugal
a) Situações abrangidas
O Código do Trabalho português define o destacamento de trabalhadores prevendo a possibilidade de um trabalhador contratado por uma empresa estabelecida noutro Estado prestar a sua atividade em território português, bem como a situação inversa de um trabalhador português, contratado por uma empresa estabelecida em Portugal, ser destacado para prestar a sua atividade noutro Estado.
No que diz respeito ao destacamento em território português, o mesmo apenas é admissível numa das seguintes situações::
i. Em execução de contrato entre o empregador e o beneficiário que exerce a atividade, desde que o trabalhador permaneça sob a autoridade e direção daquele;
ii. Em estabelecimento do mesmo empregador, ou empresa de outro empregador com o qual exista uma relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo (por exemplo, no caso de cedência ocasional);
iii. Ao serviço de um utilizador, à disposição do qual foi colocado por empresa de trabalho temporário ou outra empresa; ou
iv. Nas situações referidas em (i) e (ii) por um utilizador estabelecido noutro Estado ao abrigo da respetiva legislação nacional, desde que o contrato de trabalho subsista durante o destacamento.
O destacamento em território português não é aplicável ao pessoal navegante da marinha marcante.
b) Normas a aplicar
Em caso de destacamento, o Código do Trabalho determina a aplicação de normas de aplicação necessária, ou seja, sem prejuízo de regime mais favorável constante de lei ou contrato de trabalho, o trabalhador destacado tem direito às condições de trabalho previstas na lei portuguesa e em regulamentação coletiva de trabalho de eficácia geral aplicável que respeitem a:
i. Segurança no emprego;
ii. Duração máxima do tempo de trabalho (não abrangendo o destacamento em atividades de construção que visem a realização, reparação, manutenção, alteração ou eliminação de construções, nomeadamente escavações, aterros, construção, montagem e desmontagem de elementos prefabricados, arranjo ou instalação de equipamentos, transformação, renovação, reparação, conservação ou manutenção, designadamente pintura e limpeza, desmantelamento, demolição e saneamento);
iii. Períodos mínimos de descanso;
iv. Férias;
v. Retribuição mínima (a retribuição mínima integra os subsídios ou abonos atribuídos ao trabalhador por causa do destacamento que não constituam reembolso de despesas efetuadas, nomeadamente com viagens, alojamento e alimentação);
vi. Pagamento de trabalho suplementar;
vii. Cedência de trabalhadores por parte de empresa de trabalho temporário;
viii. Cedência ocasional de trabalhadores;
ix. Segurança e saúde no trabalho;
x. Medidas de proteção na parentalidade e aos menores; e
xi. Igualdade de tratamento e não discriminação.
A Lei expressamente prevê que a referida regra no que respeita às férias, à retribuição mínima e ao pagamento de trabalho suplementar não é aplicável ao destacamento de trabalhador qualificado por parte de empresa fornecedora de um bem, para efetuar a montagem ou a instalação inicial indispensável ao seu funcionamento, desde que a mesma esteja integrada no contrato de fornecimento e a sua duração não seja superior a oito dias no período de um ano.
c) Deveres de comunicação à autoridade laboral
O empregador deve comunicar o destacamento à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), até ao início do destacamento, através do preenchimento do formulário indicando:
i. Identidade do prestador de serviços;
ii. O número e a identificação dos trabalhadores a destacar;
iii. A identificação da pessoa de ligação (o empregador deve nomear esta pessoa com a ACT, bem como para articular com os parceiros sociais, caso necessário);
iv. A duração prevista e as datas previstas para o início e o fim do destacamento;
v. O(s) endereço(s) do local de trabalho; e
vi. A natureza dos serviços que justificam o destacamento.
Durante todo o período de destacamento, o empregador deve conservar cópias em papel ou em formato eletrónico do contrato de trabalho, os recibos de retribuição e comprovativo do pagamento, bem como o registo dos tempos de trabalho em local acessível e claramente identificado no território português.
Os referidos documentos devem ser apresentados à ACT, quando solicitados, até ao limite de um ano após a cessação do destacamento, em língua portuguesa ou acompanhados de uma tradução certificada.
2. Destacamento para fora de Portugal
a) Situações abrangidas
O destacamento para outro Estado ocorre quando um trabalhador português, contratado por uma empresa estabelecida em Portugal, presta a sua atividade noutro Estado em qualquer uma das situações indicadas nos pontos (i) a (iv) supra.
b) Normas a aplicar
O trabalhador destacado para outro Estado, fora de Portugal tem direito às condições de trabalho previstas na alínea b. do parágrafo anterior (“Normas a aplicar” no caso de destacamento para território português), sem prejuízo de regime mais favorável constante da lei aplicável ou do contrato de trabalho.
Neste caso, para além das obrigações habituais de informação a prestar pelo empregador ao trabalhador, existem obrigações de comunicações adicionais, ou seja, se o trabalhador cujo contrato de trabalho seja regulado pela lei portuguesa exercer a sua atividade no território de outro Estado por período superior a um mês, o empregador deve prestar-lhe, por escrito e até à sua partida, as seguintes informações complementares:
i. Identificação do Estado ou Estados onde o trabalho deve ser prestado e a duração previsível do período de trabalho a prestar;
ii. Moeda e lugar do pagamento das prestações pecuniárias e, se aplicável, das prestações em espécie;
iii. Possibilidade de repatriamento e respetivas condições;
iv. Acesso a cuidados de saúde;
v. Retribuição a que tem direito nos termos da lei aplicável no Estado de acolhimento, em situações de destacamento;
vi. Subsídios inerentes ao destacamento e reembolso de despesas de viagem, de alojamento e de alimentação, quando aplicável; e
vii. Sítio oficial na Internet do Estado de acolhimento, criado nos termos da legislação específica aplicável ao destacamento .
Atentas as várias regras aplicáveis ao destacamento e aos diferentes regimes jurídicos nos diversos países, antes de qualquer destacamento, os empregadores e trabalhadores devem-se informar das respetivas obrigações e direitos legais, inclusivamente, junto das autoridades laborais (em Portugal, a
Autoridade para as Condições do Trabalho – ACT) e Segurança Social do país de destino e do país de origem. Os aspetos fiscais também não deverão ser descurados. Note-se, inclusive, que existem regras especiais, por exemplo, para o destacamento de motoristas.
c) Deveres de comunicação à Autoridade Laboral
No caso de trabalhador destacado para outro Estado, fora de Portugal, o empregador deve comunicar, com cinco dias de antecedência, à ACT a identidade dos trabalhadores a destacar para o estrangeiro, o utilizador, o local de trabalho, o início e o termo previsíveis da deslocação.
Recomenda-se também, neste caso, a manutenção dos documentos referidos na alínea c. supra (“Deveres de comunicação à Autoridade Laboral” no caso de destacamento para território português), nos termos ali aludidos, para serem apresentados à autoridade sempre que solicitados.
3. Segurança Social
Ao nível da Segurança Social, a regra geral é a de que que um trabalhador está sujeito à legislação de Segurança Social do país em que exerce atividade, constituindo o destacamento a principal exceção a esta regra, possibilitando que o trabalhador continue sujeito à legislação de Segurança Social do país de origem desde que cumpridos os requisitos impostos, para o efeito, pela Segurança Social dos países em causa.
Os referidos requisitos variam consoante o destacamento seja de ou para Portugal, países da União Europeia, do Espaço Económico Europeu, da Suíça, do Reino Unido, de países com acordos/convenções bilaterais/multilaterais ao nível da Segurança Social ou de países terceiros sem quaisquer acordos/convenções. O local do estabelecimento, quadro de pessoal, volume de negócios e faturação das empresas em causa também pode constituir um requisito essencial, entre outros a avaliar pela Segurança Social caso a caso.
O destacamento tem de ser temporário e tem uma duração limitada, estando o limite da sua duração máxima dependente das regras de Segurança Social dos países em causa, por exemplo, o destacamento de trabalhador de Portugal para outro Estado-Membro da União Europeia poderá ser no máximo de 24 meses (apenas em situações excecionais e devidamente autorizadas poderá, eventualmente, prorrogar-se até um período máximo de 5 anos).
Não obstante o exposto, a duração do destacamento também poderá ficar condicionada a durações mais restritas previstas no Código do Trabalho como é o caso do destacamento através de cedência ocasional (a duração da cedência não pode exceder um ano, sendo renovável por iguais períodos até ao máximo de cinco anos e estando sujeita a diversos requisitos e formalidades).
A Entidade Empregadora deve antecipadamente pedir à Segurança Social que emita a documentação legalmente obrigatória para o destacamento, designadamente no referido caso de destacamento de Portugal para Estado-Membro por período até 24 meses deve ser requerida a emissão do Documento Portátil A1 atestando que o trabalhador está sujeito a um sistema obrigatório de Segurança Social (no caso fica abrangido pela legislação de Segurança Social portuguesa).
Por fim, destaque-se a propósito do regime do destacamento que a Segurança Social já veio esclarecer que as situações de teletrabalho não são consideradas destacamento, visto que se aplica a legislação do Estado-Membro onde o trabalhador se encontra fisicamente a exercer a atividade.
4. Conclusão
Perante a multiplicidade de regras potencialmente aplicáveis, é essencial aferir-se com a devida antecedência quais as normas legais que se aplicam a cada caso concreto, antes de ser dado início a qualquer destacamento.
A violação de regras legais sobre o destacamento pode constituir contraordenação grave e fazer o empregador incorrer em coimas significativas.
O Decreto-Lei de Execução Orçamental 2025 (“DLEO”) contém novas regras com impacto laboral. Eis as principais:
Valorizações remuneratórias dos trabalhadores das empresas do setor público empresarial e entidades independentes
As empresas do setor público empresarial e as entidades administrativas independentes devem dispor de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho ou outros instrumentos legais ou contratuais que prevejam mecanismos:
- De valorização dos seus trabalhadores;
- De desenvolvimento de carreiras com base em critérios objetivos de avaliação de desempenho com diferenciação de mérito;
- De eventual atribuição de prémios de desempenho.
A atribuição de valorizações remuneratórias fora dos casos previstos no DLEO é nula e faz incorrer os seus autores em responsabilidade financeira.
Outras valorizações remuneratórias
- As alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível ou escalão e os processos de promoções, independentemente da respetiva modalidade, ficam condicionadas a despacho prévio favorável do membro do Governo responsável pela área em que se integra o órgão, serviço ou entidade em causa, sendo posteriormente submetidos a autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da Administração Pública;
- Relativamente às situações de mobilidade prevê-se que, caso se encontrem reunidas razões fundadas de interesse público, a remuneração do trabalho seja acrescida, nos termos legalmente previstos, mediante despacho do membro do Governo responsável pela respetiva área setorial. No entanto, tal situação depende do cumprimento de um conjunto de requisitos cumulativos: enquadramento orçamental no âmbito da dotação inicial orçamentada para despesas com pessoal; manifesta necessidade urgente de preenchimento de posto de trabalho; impossibilidade de recurso a recrutamento externo e existência de evidência clara de diminuição de recursos humanos.
- Uma vez cumpridos os requisitos legalmente previstos e as verbas orçamentais previstas para o efeito, dentro da dotação inicial aprovada, podem ocorrer: alterações do posicionamento remuneratório por opção gestionária com o limite de 5 % do total de trabalhadores, até ao limite de uma posição remuneratória; e atribuição de prémios de desempenho, até ao montante equivalente à remuneração base mensal do trabalhador, ou até esse montante caso o montante máximo dos encargos fixados para esse universo não for suficiente, sem prejuízo de legislação específica, ou em instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.
Contratação de trabalhadores por pessoas coletivas de direito público e empresas do setor público empresarial
- As pessoas coletivas de direito público, ainda que dotadas de autonomia administrativa ou de independência estatutária, e as empresas do setor público empresarial podem proceder, no âmbito da respetiva autonomia de gestão, ao recrutamento de trabalhadores para a constituição de vínculos de emprego por tempo indeterminado, ou a termo, à conversão de contratos a termo em contratos por tempo indeterminado, bem como à celebração de acordos de cedência de interesse público com trabalhadores de entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação da LTFP. No entanto, para tal têm de obter uma autorização expressa no ato de aprovação do plano de atividades e orçamento.
- As autorizações de recrutamento de 2024 mantêm-se válidas pelo prazo adicional de um ano, caso se encontrem a decorrer os procedimentos de seleção.
Substituição de trabalhadores em empresas do setor público empresarial
- As empresas do setor empresarial do Estado podem celebrar contratos de trabalho sem termo ou acordos de cedência de interesse público com trabalhadores de entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação da LTFP, para substituição, para a mesma função, ou função distinta, identificada como prioritária, de trabalhadores que cessem o vínculo de emprego e que desempenhem tarefas correspondentes a necessidades permanentes, devidamente justificadas. A remuneração do trabalhador a contratar deve corresponder à base da respetiva carreira e categoria profissional prevista em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou em regulamento interno ou, quando não exista um regulamento de carreiras aplicável, corresponder à menor remuneração base que vinha sendo paga na empresa para o exercício da mesma categoria profissional.
- As empresas do setor empresarial do Estado podem ainda celebrar contratos de trabalho a termo para substituição de trabalhadores detentores de contrato sem termo, para a mesma função, que se encontrem ausentes (v.g. doença ou parentalidade), desde que a remuneração a pagar cumpra com os requisitos referidos em (i).
- Em situações excecionais devidamente fundamentadas, a empresa pode substituir um trabalhador por um número igual ou superior, desde que correspondentes a necessidades permanentes, e desde que o custo anualizado das novas contratações seja igual ou inferior ao custo anualizado com o trabalhador ou trabalhadores substituídos.
- As empresas do setor público empresarial podem proceder, no âmbito da respetiva autonomia de gestão e financeira ao recrutamento antecipado para substituição de trabalhadores que cessem funções no ano a que respeita o Plano de Atividade e Orçamento, até ao limite de 5 % do número de trabalhadores na categoria, arredondado por excesso, desde que previsto no planeamento de recursos humanos que integra o PAO.
Gastos operacionais das Empresas do Setor Empresarial do Estado
Os gastos operacionais das empresas do Setor Empresarial do Estado devem ser iguais ou inferiores ao valor registado em 2024, sendo que para o efeito dos gastos com pessoal devem ser excluídos os relativos aos órgãos sociais, corrigidos dos impactos do cumprimento de disposições legais, de orientações expressas do acionista Estado, em matéria de concretização do acordo tripartido 2025-2028 sobre a valorização salarial e o crescimento económico, celebrado a 1 de outubro de 2024, das valorizações remuneratórias que sejam obrigatórias, nos termos do disposto na Lei do Orçamento do Estado, bem como do efeito do absentismo e de indemnizações por rescisão contratual, salvo quando se tratar de rescisões por mútuo acordo.
As novas medidas encontram-se em vigor desde o dia 11 de março.
As normas de execução do Orçamento do Estado para 2022 foram aprovadas recentemente. Neste artigo, analisamos as medidas de carácter laboral.
Eis as principais:
Valorizações remuneratórias dos trabalhadores das empresas do setor público empresarial e demais entidades
- Estas entidades devem dispor de instrumentos (v.g. IRCT, instrumentos legais ou contratuais, ou regulamento interno aprovado nos termos do Regime Jurídico do Setor Empresarial do Estado) que consagrem mecanismos de: (i) valorização dos trabalhadores, (ii) avaliação de desempenho com diferenciação do mérito e (iii) eventual atribuição de prémios de desempenho, sob pena de nulidade dos actos praticados;
- Os processos de promoções que não se encontrem abrangidos pelas alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível de escalão, bem como os procedimentos internos de seleção para mudança de nível ou escalão ou outros de que possa resultar uma valorização remuneratória, não expressamente previstos em norma específica da Lei do Orçamento de Estado (LOE 2022), dependem de: (i) despacho prévio favorável do membro do Governo responsável pela área em que se integra o órgão ou serviço em causa; (ii) autorização dos membros do Governo responsáveis pela Administração Pública e Finanças, com exceção dos órgãos e serviços pertencentes às administrações regionais e locais, em que a emissão do despacho compete ao presidente do órgão e das autarquias locais ou empresas locais.
- Os dirigentes máximo dos órgãos e serviços podem, cumpridos os requisitos legais e as verbas orçamentais, autorizar dentro da dotação inicialmente aprovada: (i) alterações do posicionamento remuneratório por opção gestionária com o limite de 5% dos trabalhadores, até ao limite de uma posição remuneratória; (ii) atribuir prémios de desempenho, até ao montante legalmente estabelecido e equivalente e até uma remuneração base mensal do trabalhador, sem prejuízo do disposto em IRCT.
Novas contratações
- Os membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública e das Finanças podem, desde que verificadas situações excecionais, devidamente fundamentadas, autorizar a abertura de procedimentos concursais para constituição e vínculos de emprego público por tempo indeterminado ou a termo, para carreiras geral ou especial ou que tenha sido objeto de extinção, revisão, destinados a candidatos que não possuam vínculo de emprego público por tempo indeterminado, ou que, caso o possuam, o novo concurso permita um aumento da remuneração base, desde que cumpridos um conjunto de requisitos cumulativos, nomeadamente: (i) relevante interesse público no recrutamento; (ii) declaração de cabimento orçamental emitida pelo órgão, serviço ou entidade requerente; e (iii) parecer prévio favorável do membro do Governo de que depende o serviço ou organismo que pretende efetuar o recrutamento.
- As pessoas coletivas de direito público e as empresas do setor público empresarial podem recrutar trabalhadores para constituição de vínculos de emprego por tempo indeterminado, ou a termo, desde que expressamente autorizados no acto de aprovação do PAO.
Gastos operacionais das empresas do setor empresarial do Estado
- O rácio dos gastos operacionais deve ser igual ou inferior ao verificado em 2019 ou em 2021, consoante o que registar volume superior, sob pena de situações excecionais devidamente consagradas na lei.
- Devem, em qualquer caso, ser iguais ou inferiores ao valor registado em 2021 os gastos operacionais: (i) com pessoal; e (ii) com deslocações, ajudas de custo e alojamento, bem como os associados à frota automóvel e com encargos referentes a contratação de estudos, pareceres, projetos e consultoria.
Introdução
Os trabalhadores de uma organização (pública ou privada) e as pessoas que com a organização estão em contacto no exercício das suas atividades profissionais são, em regra, os primeiros a ter conhecimento de ameaças ou de situações lesivas do interesse público em contexto profissional.
Contudo, a denúncia dessas ameaças ou situações lesivas assume (ainda) uma conotação negativa, associada, nomeadamente, a questões culturais e de educação que diferem de país para país. Na maior parte das vezes, os potenciais denunciantes, temendo retaliação, acabam por ser desencorajados a comunicar as suas suspeitas. A existência de um reduzido número de denúncias numa organização não significa, por isso, que não ocorram violações do direito que possam lesar gravemente o interesse público, antes pelo contrário.
Com o objetivo de mudar este paradigma e reconhecendo o papel essencial do denunciante (whistleblower) na descoberta e prevenção de violações, assim como na salvaguarda do bem comum, a União Europeia aprovou a Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União («Diretiva de Whistleblowing»).
Na União Europeia, a proteção conferida aos denunciantes encontra-se fragmentada pelos Estados-Membros e difere consoante o domínio de intervenção. A Diretiva de Whistleblowing visa estabelecer normas mínimas comuns que, uma vez transpostas para a legislação nacional, assegurem uma proteção harmonizada e eficaz dos denunciantes através da obrigatoriedade de adoção de canais de denúncia eficazes, confidenciais e seguros, e de medidas de proteção contra actos de retaliação.
A Diretiva prevê a adoção de canais de denúncia de forma faseada: (i) até 17 de dezembro de 2021 por entidades com 250 ou mais trabalhadores, e (ii) até 17 de dezembro de 2023 por entidades com 50 a 249 trabalhadores.
O Estado português foi um dos primeiros Estados-Membros da União Europeia a transpor a Diretiva de Whistleblowing com a publicação da Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, a qual estabelece o regime geral de proteção dos denunciantes de infrações.
A entrada em vigor desta lei foi, todavia, diferida e o regime português impõe que todas as entidades públicas e privadas com 50 ou mais trabalhadores (e municípios com 10.000 ou mais habitantes) adotem canais de denúncia a partir de 18 de junho de 2022, sob pena de coimas que podem atingir os € 250.000,00.
Este regime, que, como o próprio nome indica é um “regime geral”, não prejudica a aplicação de regimes setoriais específicos de proteção de denunciantes e que, inclusive, já preexistiam no ordenamento jurídico português, nomeadamente, a adoção de canais de denúncia no âmbito do regime de prevenção do branqueamento de capitais, do regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras, do Código de Valores Mobiliários, e ao nível dos programas de clemência do regime de concorrência português.
Regime jurídico Português
Âmbito de aplicação da Lei n.º 93/2021
Como referido, a Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, que estabelece o regime geral de proteção de denunciantes de infrações, transpôs para o ordenamento jurídico nacional a referida Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019 (doravante “Regime Geral de Proteção dos Denunciantes” ou “Lei n.º 93/2021”).
A Lei n.º 93/2021 entrou em vigor no passado dia 18 de junho de 2022 e impõe a adoção de canais para a receção de denúncia interna e/ou denúncia externa, consoante os casos, que a seguir se detalham.
Por denúncia interna entende-se a comunicação verbal ou escrita de informações sobre infrações no interior de uma entidade jurídica no setor privado ou público, a saber: (i) Estado e entidades públicas e privadas com ≥ 50 trabalhadores; (ii) autarquias locais com ≥ 10 000 habitantes; (iii) pessoas coletivas que, independentemente do número de trabalhadores, estejam contempladas pela aplicação de determinados actos da União, nomeadamente, relativos a serviços, produtos e mercados financeiros, prevenção do branqueamento de capitais, segurança dos transportes e proteção do ambiente – as designadas “entidades obrigadas”.
Por seu turno, a denúncia externa consiste na comunicação verbal ou escrita de informações sobre violações às seguintes autoridades: (i) Ministério Público e órgãos de polícia criminal; (ii) Banco de Portugal; (iii) autoridades administrativas independentes; (iv) institutos públicos e associações públicas; (v) inspeções-gerais e entidades equiparadas a outros serviços centrais da administração direta do Estado e (vi) autarquias locais – as designadas “autoridades competentes”. Para que o denunciante possa beneficiar da proteção conferida pela Lei n.º 93/2021, tem de se verificar um conjunto de condições de aplicação objetiva e subjetiva.
Quanto às condições de aplicação subjetiva, têm de estar preenchidos o conceito de denunciante e as condições de proteção previstos na Lei n.º 93/2021.
O Regime Geral de Proteção dos Denunciantes consagra um conceito amplo de denunciante, identificando-o com o indivíduo que denuncie ou divulgue publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito da sua atividade profissional, independentemente da natureza da atividade e do setor em que é exercida. A título meramente exemplificativo, podem ser considerados denunciantes: (i) trabalhadores; (ii) prestadores de serviços; (iii) fornecedores; (iv) titulares de participações sociais; (v) pessoas pertencentes a órgãos de administração ou de gestão ou a órgãos fiscais ou de supervisão.
Por outro lado, devem estar preenchidas as seguintes condições adicionais: (i) o denunciante deve estar de boa-fé; (ii) o denunciante deve ter fundamento sério para crer que as informações são verdadeiras aquando da denúncia ou da divulgação pública; (iii) a informação deve dizer respeito a uma violação abrangida, i.e., suscetível de denúncia (infração); e (iv) a denúncia deve ser efetuada através do meio de denúncia adequado, ou seja, o denunciante não pode recorrer previamente a canais de denúncia externa ou divulgação pública de uma infração, sem antes ter apresentado uma denúncia pelo canal de denúncia interna, salvo determinadas exceções.
No que diz respeito às condições de aplicação objetiva, o objeto da denúncia tem de corresponder a actos e omissões, dolosos ou negligentes, imputados à conduta dos membros dos órgãos sociais e demais colaboradores da entidade obrigada, bem como de terceiros desde que afetem uma pessoa da entidade obrigada, relacionadas com as seguintes matérias: (i) corrupção e infrações conexas; (ii) contratação pública; (iii) serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo; (iv) segurança e conformidade dos produtos; (v) segurança dos transportes; (vi) proteção do ambiente; (vii) proteção contra radiações e segurança nuclear; (viii) segurança dos alimentos para consumo humano e animal, saúde animal e bem-estar animal; (iv) saúde pública; (x) defesa do consumidor; (xi) proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação; (xii) acto ou omissão contrário e lesivo dos interesses financeiros da União Europeia; (xiii) acto ou omissão contrário às regras de mercado interno da União Europeia; (xiv) criminalidade violenta, especialmente violenta e altamente organizada.
Do elenco das matérias acima não fazem parte matérias relativas à aplicação da legislação laboral como seja, por exemplo, situações de discriminação entre trabalhadores, assédio, entre outras. Estas matérias estão, à partida, excluídas do âmbito do regime de proteção do denunciante, uma vez que beneficiam de um regime e procedimento próprios previstos na legislação laboral. Isto não significa, no entanto, que o empregador não possa fazer uso dos canais de denúncia interna para a comunicação de infrações laborais. Poderá eventualmente fazê-lo, mas com as necessárias ressalvas, devendo ser feita referência ao facto de estas matérias serem objeto de um tratamento próprio em sede de legislação laboral.
Meios de denúncia disponíveis
As denúncias podem ser apresentadas através de um de três meios: (i) canal de denúncia interna, (ii) canal de denúncia externa ou (iii) divulgação pública.
Existe uma ordem específica de precedência quanto ao seu uso para que o denunciante possa beneficiar do regime de proteção já referido. O uso do canal de denúncia interna tem precedência em relação aos demais meios de denúncia e o canal de denúncia externa em relação à divulgação pública.
Cada entidade obrigada é livre de escolher o meio pelo qual disponibiliza o seu canal de denúncia.
Contudo, independentemente da escolha efetuada, o canal de denúncia tem de salvaguardar que a denúncia possa ser feita: (i) por escrito (v.g. correio ou plataforma online); (ii) verbalmente (v.g. linha telefónica ou outro sistema de mensagens de voz).
O canal de denúncia tem de cumprir um conjunto de salvaguardas, designadamente: (i) exaustividade, integridade e conservação da denúncia; (ii) independência e imparcialidade; (iii) confidencialidade da identidade do denunciante ou de terceiros ou anonimato, quando seja solicitado pelo denunciante; (iv) proteção de dados; (v) sigilo; e (vi) ausência de conflitos de interesses.
As entidades devem adotar procedimentos específicos de informação, resposta, tratamento de denúncias e formação a trabalhadores, os quais devem prever, a título de boas práticas, diversas fases: (i) preliminar; (ii) abertura de investigação; (iii) realização de investigação; e (v) comunicação do resultado e apuramento das consequências.
A adoção de um procedimento é essencial para garantir que as entidades cumprem com os prazos (máximos) previstos na lei para o seguimento de denúncias, designadamente: (i) 7 dias para acusar a receção da denúncia e prestar ao denunciante informações sobre os requisitos, forma e admissibilidade da denúncia; (ii) 3 meses para informar o denunciante sobre as medidas previstas ou adotadas para dar seguimento à denúncia; (iii) 15 dias após a conclusão do caso para dar resposta à solicitação do denunciante referente à informação sobre o resultado da análise efetuada à comunicação.
Proteção de dados pessoais nos canais de denúncia
O tratamento de dados pessoais, incluindo o intercâmbio ou a transmissão de dados pessoais pelas autoridades competentes, têm de observar o disposto no Regulamento (UE) n.º 2016/679 relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, que aprovou o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), e na Lei n.º 59/2019 de 8 de agosto, que estabelece determinados aspetos de execução do RGPD na ordem jurídica portuguesa.
Os dados pessoais que manifestamente não forem relevantes para o tratamento da denúncia não devem ser conservados, pelo que, se forem recolhidos, têm de ser imediatamente apagados, em conformidade com o princípio da minimização dos dados. Tal situação não prejudica o dever de conservação de denúncias apresentadas verbalmente, quando essa conservação se faça mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável.
Os dados devem ser conservados de uma forma que permita a identificação dos respetivos titulares apenas durante o período necessário para as finalidades para as quais são tratados, ou seja, para efeitos do tratamento da denúncia, em conformidade com princípio da limitação da conservação previsto no RGPD.
As entidades obrigadas e as autoridades competentes responsáveis por receber e tratar as denúncias devem manter um registo das denúncias recebidas e conservá-las, pelo menos, durante o período de cinco anos e, independentemente desse prazo, durante a pendência de processos judiciais ou administrativos referentes à denúncia. Os dados pessoais podem ser conservados por períodos mais longos, desde que sejam tratados exclusivamente para fins estatísticos e sujeitos à aplicação das medidas técnicas e organizativas adequadas.
As denúncias apresentadas verbalmente, através de linha telefónica com gravação ou outro sistema de mensagem de voz gravada, são registadas, obtido o consentimento do denunciante, mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável ou mediante transcrição completa e exata da comunicação.
Caso o canal de denúncia verbal não permita a gravação, as entidades obrigadas e as autoridades competentes lavram uma acta fidedigna da comunicação.
Por último, caso a denúncia seja apresentada em reunião presencial, as entidades obrigadas e as autoridades competentes, obtido o consentimento do denunciante, procedem ao registo da reunião mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável ou através de acta fidedigna.
Proibição de retaliação
A Lei n.º 93/2021 estabelece no seu artigo 21.º a proibição da prática de actos de retaliação contra o denunciante, definindo-os como qualquer acto ou omissão que, direta ou indiretamente, ocorrendo em contexto profissional, motivado por uma denúncia interna, externa ou divulgação pública, cause ou possa causar ao denunciante, de modo injustificado, danos patrimoniais ou não patrimoniais.
Entre outros, a lei presume os seguintes actos motivados pela denúncia, quando praticados até dois anos após a apresentação da denúncia ou da divulgação pública da infração: (i) alterações das condições de trabalho; (ii) suspensão do contrato de trabalho; (iii) avaliação negativa de desempenho; (iv) despedimento; (v) não conversão do contrato de trabalho a termo em contrato sem termo; e (v) resolução do contrato de prestação de serviços.
A eventual sanção disciplinar aplicada ao denunciante até dois anos após a denúncia ou divulgação pública presume-se abusiva.
Isto significa que há uma inversão do ónus da prova a favor do denunciante, cabendo ao empregador ilidir essa presunção, fazendo prova de que a prática de alguns dos atos anteriores não terá sido motivada por denúncia apresentada pelo denunciante.
É, portanto, expetável que a litigiosidade, opondo trabalhadores a empregadores possa vir a aumentar, restando-nos aguardar pelas futuras decisões dos tribunais portugueses quanto ao tratamento das questões laborais associadas aos canais de denúncia.
Regime jurídico Brasileiro
É recente o aparecimento da figura do denunciante de boa-fé (whistleblower) no panorama legislativo brasileiro. Pode considerar-se que a sua primeira aparição se deu aquando da redação do artigo 33.º da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, ratificada pelo Brasil no ano de 2003, em que é prevista a obrigatoriedade de os Estados incorporarem medidas de proteção aos denunciantes de boa-fé.
Esta obrigação visa que tanto membros de organizações, do setor público ou privado, bem como membros da sociedade civil, procurem denunciar práticas ilegais, imorais ou ilegítimas, através de mecanismos pré-estabelecidos. É inegável que os números associados às práticas de corrupção no Brasil são alarmantes em diversos setores. O objetivo é essencialmente o de prevenir a prática de actos de corrupção, principalmente em entidades públicas, na medida em que não existem leis que estabeleçam a obrigação de canais de denúncias em entidades privadas – o que não impede, todavia, a imposição analógica da obrigação às empresas privadas.
No ano de 2013, o Poder Legislativo editou a Lei n.º 12.846, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de actos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira. No seu Capítulo III, a Lei prevê a responsabilidade administrativa das pessoas jurídicas que pratiquem actos lesivos, estabelecendo no seu artigo 7.º, VIII, que a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e aplicação de códigos de ética e de conduta são fatores a serem considerados quando forem aplicadas sanções respeitantes à responsabilização administrativa. Em razão da referida previsão, entende-se a intenção legislativa de fazer com que os canais de denúncias dentro da estrutura empresarial sejam considerados requisitos para um completo e efetivo programa de integridade.
No que diz respeito à proteção dos denunciantes, em 2018, a Lei n.º 13.608, que dispõe sobre os serviços telefónicos de receção de denúncias e recompensas pela prestação de informações que possam servir de auxílio em investigações policiais, passou a estabelecer que o denunciante, ainda que se identifique, terá assegurada a preservação da sua identidade e o o sigilo dos seus dados, e poderá inclusivamente receber um prémio, em dinheiro, pelas informações que levem à resolução de investigações criminais. A identidade do denunciante apenas será revelada quando seja de interesse público ou de interesse concreto para a apuração dos factos. Esta Lei visa fundamentalmente incentivar a população a contribuir para implementação de uma cultura anticorrupção.
O artigo 4.º-C da Lei n.º 13.608/2018 prevê que ao denunciante seja assegurada a proteção contra retaliações, tais como demissão arbitrária, alteração injustificada de funções ou atribuições, imposição de sanções, de prejuízos remuneratórios ou materiais de qualquer espécie, retirada de benefícios, diretos ou indiretos, ou recusa de providência de referências profissionais positivas. Além da garantia de proteção, o referido artigo prevê que ações ou omissões de retaliação ao informante configurarão infração disciplinar grave, sujeitarão o agente a demissão tendo em vista a proteção do serviço público, e, no caso de eventuais danos materiais causados por omissões ou ações praticadas em retaliação, sem prejuízo de danos morais, o denunciante poderá ser ressarcido em dobro por eventuais danos materiais que lhe sejam causados.
Não existem no ordenamento jurídico brasileiro previsões legais relativas à obrigatoriedade de canais de denúncias ou proteção aos denunciantes no âmbito privado. Todavia, no âmbito laboral, em razão de diversos princípios que protegem as relações de trabalho e os trabalhadores, caso existam canais de denúncia internos, é possível a aplicação análoga das disposições legais acima referidas, como a proteção do informante, a impossibilidade de que este sofra retaliações, seja despedido ou seja submetido a situações que provoquem danos de natureza moral ou extrapatrimonial. Todos estes aspetos dependerão da forma como estipulados o referido canal de denúncia, as regras de compliance internas da empresa e a observação pela empresa das regras estabelecidas no âmbito do Direito do Trabalho brasileiro.
Síntese comparativa
No cenário brasileiro, pode observar-se que os whistleblowers são geralmente trabalhadores do setor privado, funcionários públicos ou prestadores de serviços, os quais podem: (i) denunciar casos de corrupção às autoridades policiais; (ii) relatar à receita federal casos de sonegação; (iii.) denunciar violações de âmbito laboral ao Ministério do Trabalho.
No setor privado, foi editada a Lei Anticorrupção, que fomentou a política de whistleblowing, ao prever a criação de canais de denúncia e uma política de proteção dos denunciantes. Por outro lado, no setor público, a edição da Lei n.º 13.608/2018, facilitou o reconhecimento de alguns institutos importantes, que fazem parte da política de whistleblowing para a prevenção, repressão ou apuração de crimes ou ilícitos administrativos. Ainda na esfera pública, houve a edição da Lei n.º 13.964/2019, proveniente do “Pacote Anticrime”. No âmbito administrativo, a política de proteção ao denunciante tem se materializado por meio de regulamentos editados ao longo dos anos de 2019 a 2021.
O Decreto n.º 8.420/2015 (Art. 42.º, X) determina que o canal de denúncia seja um dos parâmetros a ser considerado aquando da avaliação do programa de integridade e estabelece que este deve ser aberto e amplamente divulgado a funcionários e terceiros. Nos termos do art. 7.º, VIII, da Lei n.º 12.846/2013, possuir um canal de denúncias pode reduzir a pena de multa em caso de condenação. Portanto, vislumbra-se que, no Brasil, há mais um cumprimento de boas práticas por parte das empresas privadas que adotam esses canais do que uma obrigação legal passível de sanções.
No cenário português, os whistleblowers, são também trabalhadores do setor privado, funcionários públicos ou prestadores de serviços. As normas gerais do ordenamento jurídico português, já reconheciam a possibilidade de realizar denúncias internas que dissessem respeito a infrações penais e administrativas, além da sua divulgação pública. Era já previsto no artigo 244.º do Código de Processo Penal Português, por exemplo, que qualquer pessoa com conhecimento de um delito poderia denunciá-lo ao Ministério Público, o que inclui denúncias externas de funcionários de empresas sobre crimes nelas praticados.
As áreas sobre as quais incidiram normas de incentivo ao whistleblowing e de proteção aos whistleblowers foram os setores bancário, de mercado de capitais, de prevenção ao branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, da saúde e de combate à corrupção. A proteção já abrangia consequências no plano laboral, civil e, também, penal.
Por fim, quanto aos canais de denúncia em Portugal, as denúncias devem primariamente ser feitas através dos canais de denúncia internos. Podem igualmente ser realizadas através de canais de denúncia externa ou divulgadas publicamente. Porém, o denunciante só poderá recorrer a canais de denúncia externa quando: (i) não exista um canal de denúncia interna; (ii) o canal de denúncia interna admita apenas a apresentação de denúncias por trabalhadores, não o sendo o denunciante; (iii) tenha motivos razoáveis para crer que a infração não pode ser eficazmente conhecida ou resolvida a nível interno ou que existe risco de retaliação; (iv) tenha inicialmente apresentado uma denúncia interna sem que lhe tenham sido comunicadas as medidas previstas ou adotadas na sequência da denúncia no prazo máximo de três meses a contar da receção ou sem que seja comunicado ao denunciante o resultado da análise efetuada, no prazo de 15 dias após a respetiva conclusão; ou (iv) a infração constitua crime.
Da nossa parte, acreditamos poder concluir que as divergências de soluções quanto aos problemas que o tema levanta são justificadas pelas diferenças culturais e pelos próprios princípios inerentes a cada ordenamento jurídico.
Já se encontra publicado no Boletim do Trabalho e Emprego o novo Acordo de Empresa da CP e respetivo Regulamento de Carreira aplicável aos maquinistas de comboios, representados pelo Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses (SMAQ).
Sinteticamente, o novo Acordo de Empresa e respetivo Regulamento de Carreiras consagram as seguintes alterações:
- Aumento salarial, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2022;
- Eliminação de um índice na base para todas as categorias da carreira de condução;
- Acréscimo de um índice no topo para todas as categorias da carreira de condução;
- Criação de tempos mínimos de permanência, para mudança de índice, com o máximo de quatro anos;
- Eliminação de sobreposições de índices entre categorias profissionais e respetivas chefias;
- Integração do Abono de Agente Único na retribuição;
- Aumento do subsídio de refeição para €7,74;
- Criação de uma tabela indiciária autónoma para os trabalhadores abrangidos pela carreira de condução;
- Consagração do regime de teletrabalho, nos termos previstos no Código do Trabalho, quando as funções assim o permitam; e
- Consagração de acesso automático à categoria de Assistente de Tração.
O novo AE contém um regime globalmente mais favorável para os trabalhadores, e também abrange os trabalhadores filiados no SMAQ, bem como os trabalhadores não filiados em sindicato outorgante que a ele adiram, no prazo de três meses, nos termos das regras previstas no Acordo de Empresa.
A celebração deste novo Acordo de Empresa enquadra-se no princípio da autonomia coletiva e no direito à contratação coletiva, consagrados entre os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, no artigo 56.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.
Foi aprovada a Proposta de Lei n.º 79/XXIII/2022, que visa alterar o Código do Trabalho.
A Proposta contém diversas medidas, que vão agora ser discutidas e votadas na Assembleia da República.
Eis as principais alterações:
Definição de “dependência económica”
Considera-se que há “dependência económica” sempre que o prestador de trabalho seja uma pessoa singular que presta, diretamente e sem intervenção de terceiros, uma atividade para o mesmo beneficiário, e dele obtém mais de 50% do produto da sua atividade, num ano civil (10.º/2).
Direitos coletivos para os economicamente dependentes
As pessoas em situação de dependência económica passam a ter direito: (i) à representação dos seus interesses socioprofissionais por associação sindical e por comissão de trabalhadores, ainda que delas não possam ser membros; (ii) à negociação de instrumentos de regulamentação coletivas de trabalho negociais, específicos para trabalhadores independentes, através de associações sindicais; (iii) à aplicação dos instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho negociais já existentes e aplicáveis a trabalhadores, nos termos neles previstos (10.º-A).
Plataformas digitais – presunção de laboralidade
Cria-se uma nova presunção de laboralidade para o trabalho prestado nas plataformas digitais, presumindo-se a existência de contrato de trabalho quando se verifiquem determinados requisitos: a retribuição é fixada pelo operador da plataforma; o operador dirige a forma de atuação e apresentação do prestador; o operador controla a atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos; o operador restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos ou através da aplicação de sanções beneficiária que nela opere; restringe a possibilidade de escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma; os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem ao operador de plataforma digital. A presunção pode ser ilidida pelo operador de plataforma (artigo 12.º-A).
“Falsos recibos verdes” – novas sanções acessórias
Reforço da sanção acessória para as situações de “falsos” contratos de prestação de serviços, determinando, em caso de reincidência: (i) a privação do direito a apoio, subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, ou proveniente de fundos europeus; e (ii) a privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos (12.º/3).
Algoritmos e Inteligência Artificial
Em matéria de uso de algoritmos, inteligência artificial e matérias conexas, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho apenas podem afastar as normas legais em sentido mais favorável para os trabalhadores (3.º/3).
Igualdade e não discriminação também se aplica no caso de tomada de decisões baseadas em algoritmos ou outros sistemas de inteligência artificial (24.º/3).
Alargamento de “práticas discriminatórias”
São consideradas práticas discriminatórias as discriminações remuneratórias relacionadas com a atribuição de prémios de assiduidade e produtividade, bem como afetações desfavoráveis em termos de avaliação e progressão na carreira (25.º/6 e 7).
Faltas por adoção e acolhimento familiar
Processos de adoção e de acolhimento famílias são considerados ausências justificadas ao trabalho que não determinam a perda de quaisquer direitos e que são consideradas como prestação efetiva de trabalho, exceto quanto à retribuição (65.º/1, k).
Dever de informação ao trabalhador
Empregador passa a ter de informar o trabalhador sobre novos aspetos, nomeadamente: (i) a identificação do utilizador, no caso de trabalhador temporário; (ii) o direito individual a formação continua; (iii) no caso de trabalho intermitente, a informação prevista no regime legalmente estabelecido; (iv) os parâmetros, as regras e as instruções em que se baseiam os algoritmos ou outros sistemas de inteligência artificial (106.º/3).
Período experimental
O período experimental de 180 dias aplicável aos trabalhadores com contrato por tempo indeterminado que estejam à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração é reduzido e ou excluído consoante a duração de anterior contrato de trabalho a termo, celebrado com empregador diferente, tenha sido igual ou superior a 90 dias (112.º/5).
Consagração da possibilidade de redução do período experimental consoante a duração do estágio profissional com avaliação positiva, para a mesma atividade e empregador diferente, tenha sido igual ou superior a 90 dias, nos últimos 12 meses (112.º/6).
O prazo de aviso prévio para denúncia do contrato durante o período experimental, depois de decorridos mais de 120 dias, passa a ser 30 dias (114.º/3).
Obrigação de comunicação à CITE da denúncia do contrato durante o período experimental estende-se ao trabalhador cuidador (114.º/5).
Obrigação de comunicação à ACT, no prazo de 15 dias, da denúncia do contrato durante o período experimental aplicável a contratos sem termo de pessoas à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração (114.º/6).
As novas regras passam a prever que apesar de a denúncia não depender de justa causa, não pode ser abusiva, nos termos do artigo 334.º do Código Civil (114.º/7).
Contratação a termo
Reforço das regras relativas à sucessão de contratos a termo evitando o recurso abusivo a esta forma de contratação, designadamente impedindo nova admissão ou afetação de trabalhador através de contrato (a termo, temporário ou prestação de serviços) cuja execução se concretize, no mesmo posto de trabalho, para o mesmo objeto ou na mesma atividade profissional (143.º/1).
Obrigação de comunicação obrigatória à CITE, com a antecedência mínima de cinco dias úteis a contar da data do aviso prévio, do motivo da não renovação de contrato de trabalho a termo, estende-se ao trabalhador cuidador (144.º/3).
Alargamento da compensação para 24 dias por ano em caso de cessação de contrato de trabalho a termo (certo ou incerto) (344.º/2).
Trabalho temporário
No caso de se ter completado a duração máxima de contrato de utilização de trabalho temporário, é proibida a sucessão no mesmo posto de trabalho de trabalhador temporário ou de trabalhador contratado a termo, celebrado com o mesmo empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, antes de decorrer um período de tempo igual a um terço da duração do referido contrato, incluindo renovações (179.º/1).
Em caso de celebração ou renovação de contrato de utilização com empresa de trabalho temporário (ETT) não licenciada, a integração é feita com contrato sem termo na empresa utilizadora (180.º/5).
A duração de contratos de trabalho temporário sucessivos em diferentes utilizadores, celebrados com o mesmo empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, não pode ser superior a quatro anos. Ultrapassado tal limite, o contrato converte-se em contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária (180.º/4 e 5).
Relações coletivas de trabalho e da negociação coletiva
Admite-se o exercício da atividade sindical na empresa ainda que não existam trabalhadores sindicalizados, mediante condições específicas aplicáveis e desde que não se afete o normal funcionamento da atividade produtiva (460.º/2).
A escolha da convenção coletiva não ser possível se o trabalhador já se encontrar abrangido por portaria de extensão (497.º/5) e a emissão da portaria de extensão afasta a aplicação de convenção que tenha, eventualmente, sido escolhida (515.º/5).
Em caso de denúncia de convenção coletiva a parte destinatária pode requerer ao Presidente do Conselho Económico e Social arbitragem para apreciação da fundamentação da denúncia, a qual suspende os seus efeitos, impedindo a convenção de entrar em regime de sobrevigência (500.º-A).