O Decreto-Lei n.º 185/2007, de 10 de Maio, introduziu alterações ao regime que criou o Fundo de Acidentes de Trabalho, no sentido de clarificar algumas questões que têm surgido no relacionamento com as empresas de seguros e com os tribunais.
Assim, a lei prevê agora o reembolso das actualizações das pensões às empresas de seguros que aceitem contratos de seguro para cobertura de acidentes em serviço. Neste sentido, as competências do Fundo vão ser ampliadas, com vista a assegurar às empresas de seguros o reembolso dos montantes relativos às actualizações de pensões devidas por incapacidade permanente igual ou superior a 30% ou por morte também derivadas de acidente em serviço.
Por sua vez, passa a constituir receita do Fundo de Acidentes de Trabalho a incidência das taxas previstas nas alíneas a) e b) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril, sobre os salários seguros e os capitais de remição das pensões em pagamento relativos a contratos de seguro de acidentes em serviço.
Reverte igualmente para o Fundo de Acidentes de Trabalho uma indemnização igual a três vezes o salário anual do sinistrado, no caso da morte deste por acidente em serviço, quando não tenha deixado beneficiários com direito a pensão.
Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 185/2007 consagrou expressamente a personalidade judiciária do Fundo de Acidentes de Trabalho e estabeleceu a sua sub-rogação nos direitos e privilégios creditórios dos sinistrados e/ou beneficiários.
Já em relação às atribuições do Fundo de Acidentes de Trabalho, as suas responsabilidades estão agora circunscritas às previstas no artigo 296.º do Código do Trabalho, afastando a responsabilidade do Fundo pelo pagamento de indemnizações por danos não patrimoniais imputados à entidade empregadora, em termos equivalentes à responsabilidade das seguradoras, e pelo pagamento da parte correspondente ao agravamento das pensões resultante de actuação culposa por parte da entidade empregadora. O pagamento de juros de mora imputados à entidade empregadora também é excluído.
Quanto à prestação suplementar por assistência de terceira pessoa, é consagrado o reembolso das actualizações respectivas às empresas de seguros, mas, em contrapartida, é estabelecida uma percentagem a pagar ao Fundo de Acidentes de Trabalho pelas empresas de seguros.
Por fim, é fixado um regime próprio de actualização anual das pensões de acidentes de trabalho, o qual considera os referenciais de actualização (índice de preços no consumidor – IPC e crescimento real do PIB) previstos no novo regime de actualização das pensões da Segurança Social, eliminado a actualização por escalões.
© 2007 Macedo Vitorino & Associados
Sónia Ribeiro e Tiago Bessa, colaboradores do grupo de Direito do Trabalho da MV, participaram como oradores num seminário prático organizado pela International Faculty for Executives (“IFE”) subordinado ao tema “O processamento salarial e as implicações das novas regras da segurança social”, o qual teve lugar nos passados dias 11 e 12 de Abril.
Ao longo dos dois dias em que decorreu o seminário, foi feita a análise da legislação específica da retribuição e do processamento salarial nos vários aspectos em que esta se decompõe. Foram apresentados e debatidos os efeitos neste domínio dos incidentes da cessação do contrato de trabalho e da redução da actividade ou da suspensão do contrato por facto respeitante ao empregador e foi feita uma exposição sobre o modo de tratamento dos descontos oficiais perante a Administração e a Segurança Social. Por último, foi caracterizado o regime jurídico das várias prestações sociais.
Para mais informações contacte um dos nossos advogados ou consulte o site da IFE em www.ife.pt.
Numa recente decisão de 17 de dezembro de 2019 o United States Court of Appeals for the Seventh Circuit, no caso University of Chicago vs. National Labor Relations Board, confirmou a legitimidade de trabalhadores estudantes em regime de part-time e com contratos não permanentes negociarem uma convenção coletiva de trabalho com a respetiva Universidade.
No essencial, os estudantes que trabalhavam na Biblioteca da Universidade de Chicago criaram uma comissão representativa – “International Brotherhood of Teamsters Union Local n.º 743” - e tentaram negociar com a Universidade uma convenção coletiva de trabalho, para obterem melhores condições de trabalho.
Esta, em resposta, alegou que nos termos da lei aplicável - National Labor Relations Act - aquele grupo de estudantes não tinha legitimidade para negociar uma convenção coletiva de trabalho, por serem apenas trabalhadores-estudantes em regime de part-time, não tendo consequentemente um interesse sério e razoável em negociar uma convenção. Basicamente, o argumento usado pela Universidade centrava-se na precariedade da relação laboral – por natureza, o trabalho desenvolvido pelos estudantes da Universidade era necessariamente temporário, já que cessaria assim que os mesmos terminassem os seus cursos ou saíssem da Universidade por qualquer outra razão. Em regra, os estudantes não exerciam tais funções por mais do que um ano e só o poderiam fazer enquanto fossem estudantes. Mais do que serem trabalhadores, eram estudantes. Logo, segundo a Universidade, não teriam razão suficiente para negociar uma convenção coletiva de trabalho.
Contrariamente, a agência federal administrativa encarregue de garantir a aplicação da lei laboral – a National Labor Relations Board (NLRB) – defendeu que o facto de se tratar de estudantes e a circunstância de serem trabalhadores ocasionais não lhes retirava a legitimidade para negociarem uma convenção coletiva de trabalho com a Universidade.
De há muito que o tema é amplamente debatido na comunidade jurídica e a NLRB vinha oscilando nas decisões que tomava sobre esta matéria.
Na década de 70 do século XX, a tendência que prevalecia na NLRB era a de que os trabalhadores-estudantes não podiam negociar convenções coletivas de trabalho com as suas universidades, pela simples razão de que, mais do que trabalhadores, eram acima de tudo estudantes. Esta tendência foi alterada nos anos 90, passando-se a considerar que o facto de os trabalhadores serem primariamente estudantes não lhes retirava o direito à negociação coletiva. Mais recentemente, depois de em 2004 a NLRB ter retomado a tradição dos anos 70 e negado o direito à negociação coletiva no caso Brown University, já em 2016, num caso que envolveu a Columbia University, a NLRB retomou a tese mais expansionista e reconheceu o direito dos trabalhadores-estudantes de celebrarem convenções coletivas de trabalho.
Neste caso, a NLRB voltou defender que uma estrutura representativa de trabalhadores-estudantes tem legitimidade para negociar uma convenção coletiva de trabalho, apesar da natureza precária dos contratos de trabalho dos seus representados.
Por essa razão, a Universidade de Chicago reclamou perante os tribunais da decisão da NLRB.
A recente decisão do US Court of Appeals clarificou a polémica – o tribunal decidiu, finalmente, que mesmo os trabalhadores-estudantes com contratos de trabalho precários podem, através de uma estrutura representativa, negociar convenções coletivas de trabalho. Segundo o Tribunal, o facto de serem estudantes e de terem relações laborais que por natureza são ocasionais não lhes retira o direito à negociação coletiva previsto na lei.
A Universidade foi, consequentemente, condenada pela prática de uma unfair labor practice, por se ter recusado a negociar uma convenção coletiva de trabalho com aquela estrutura representativa de trabalhadores.
A decisão é elucidativa do que se tem em vista: lá como cá, a negociação coletiva é incentivada e promovida – garante paz social, promove a melhoria das condições de trabalho e permite a adaptação da lei às especificidades setoriais. Lá como cá, existe uma obrigatoriedade legal de negociação coletiva. Lá como cá, a negociação coletiva é vista como um fator de progresso económico e social.
O caso University of Chicago vs. National Labor Relations Board é mais um contributo nesse sentido.