2022-08-26

As normas de execução do Orçamento do Estado para 2022 foram aprovadas recentemente. Neste artigo, analisamos as medidas de carácter laboral.

Eis as principais:

Valorizações remuneratórias dos trabalhadores das empresas do setor público empresarial e demais entidades

  • Estas entidades devem dispor de instrumentos (v.g. IRCT, instrumentos legais ou contratuais, ou regulamento interno aprovado nos termos do Regime Jurídico do Setor Empresarial do Estado) que consagrem mecanismos de: (i) valorização dos trabalhadores, (ii) avaliação de desempenho com diferenciação do mérito e (iii) eventual atribuição de prémios de desempenho, sob pena de nulidade dos actos praticados;
  • Os processos de promoções que não se encontrem abrangidos pelas alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível de escalão, bem como os procedimentos internos de seleção para mudança de nível ou escalão ou outros de que possa resultar uma valorização remuneratória, não expressamente previstos em norma específica da Lei do Orçamento de Estado (LOE 2022), dependem de: (i) despacho prévio favorável do membro do Governo responsável pela área em que se integra o órgão ou serviço em causa; (ii) autorização dos membros do Governo responsáveis pela Administração Pública e Finanças, com exceção dos órgãos e serviços pertencentes às administrações regionais e locais, em que a emissão do despacho compete ao presidente do órgão e das autarquias locais ou empresas locais.
  • Os dirigentes máximo dos órgãos e serviços podem, cumpridos os requisitos legais e as verbas orçamentais, autorizar dentro da dotação inicialmente aprovada: (i) alterações do posicionamento remuneratório por opção gestionária com o limite de 5% dos trabalhadores, até ao limite de uma posição remuneratória; (ii) atribuir prémios de desempenho, até ao montante legalmente estabelecido e equivalente e até uma remuneração base mensal do trabalhador, sem prejuízo do disposto em IRCT.

 

Novas contratações

  • Os membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública e das Finanças podem, desde que verificadas situações excecionais, devidamente fundamentadas, autorizar a abertura de procedimentos concursais para constituição e vínculos de emprego público por tempo indeterminado ou a termo, para carreiras geral ou especial ou que tenha sido objeto de extinção, revisão, destinados a candidatos que não possuam vínculo de emprego público por tempo indeterminado, ou que, caso o possuam, o novo concurso permita um aumento da remuneração base, desde que cumpridos um conjunto de requisitos cumulativos, nomeadamente: (i) relevante interesse público no recrutamento; (ii) declaração de cabimento orçamental emitida pelo órgão, serviço ou entidade requerente; e (iii) parecer prévio favorável do membro do Governo de que depende o serviço ou organismo que pretende efetuar o recrutamento.
  • As pessoas coletivas de direito público e as empresas do setor público empresarial podem recrutar trabalhadores para constituição de vínculos de emprego por tempo indeterminado, ou a termo, desde que expressamente autorizados no acto de aprovação do PAO.

 

Gastos operacionais das empresas do setor empresarial do Estado

  • O rácio dos gastos operacionais deve ser igual ou inferior ao verificado em 2019 ou em 2021, consoante o que registar volume superior, sob pena de situações excecionais devidamente consagradas na lei.
  • Devem, em qualquer caso, ser iguais ou inferiores ao valor registado em 2021 os gastos operacionais: (i) com pessoal; e (ii) com deslocações, ajudas de custo e alojamento, bem como os associados à frota automóvel e com encargos referentes a contratação de estudos, pareceres, projetos e consultoria. 
2022-08-04
Introdução

Os trabalhadores de uma organização (pública ou privada) e as pessoas que com a organização estão em contacto no exercício das suas atividades profissionais são, em regra, os primeiros a ter conhecimento de ameaças ou de situações lesivas do interesse público em contexto profissional.

Contudo, a denúncia dessas ameaças ou situações lesivas assume (ainda) uma conotação negativa, associada, nomeadamente, a questões culturais e de educação que diferem de país para país. Na maior parte das vezes, os potenciais denunciantes, temendo retaliação, acabam por ser desencorajados a comunicar as suas suspeitas. A existência de um reduzido número de denúncias numa organização não significa, por isso, que não ocorram violações do direito que possam lesar gravemente o interesse público, antes pelo contrário.

Com o objetivo de mudar este paradigma e reconhecendo o papel essencial do denunciante (whistleblower) na descoberta e prevenção de violações, assim como na salvaguarda do bem comum, a União Europeia aprovou a Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União («Diretiva de Whistleblowing»).

Na União Europeia, a proteção conferida aos denunciantes encontra-se fragmentada pelos Estados-Membros e difere consoante o domínio de intervenção. A Diretiva de Whistleblowing visa estabelecer normas mínimas comuns que, uma vez transpostas para a legislação nacional, assegurem uma proteção harmonizada e eficaz dos denunciantes através da obrigatoriedade de adoção de canais de denúncia eficazes, confidenciais e seguros, e de medidas de proteção contra actos de retaliação.

A Diretiva prevê a adoção de canais de denúncia de forma faseada: (i) até 17 de dezembro de 2021 por entidades com 250 ou mais trabalhadores, e (ii) até 17 de dezembro de 2023 por entidades com 50 a 249 trabalhadores.

O Estado português foi um dos primeiros Estados-Membros da União Europeia a transpor a Diretiva de Whistleblowing com a publicação da Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, a qual estabelece o regime geral de proteção dos denunciantes de infrações.

A entrada em vigor desta lei foi, todavia, diferida e o regime português impõe que todas as entidades públicas e privadas com 50 ou mais trabalhadores (e municípios com 10.000 ou mais habitantes) adotem canais de denúncia a partir de 18 de junho de 2022, sob pena de coimas que podem atingir os € 250.000,00.

Este regime, que, como o próprio nome indica é um “regime geral”, não prejudica a aplicação de regimes setoriais específicos de proteção de denunciantes e que, inclusive, já preexistiam no ordenamento jurídico português, nomeadamente, a adoção de canais de denúncia no âmbito do regime de prevenção do branqueamento de capitais, do regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras, do Código de Valores Mobiliários, e ao nível dos programas de clemência do regime de concorrência português. 

Os canais de denúncias constituem uma importante ferramenta no domínio dos programas de cumprimento normativo (compliance) para as organizações, pois contribuem para a deteção, investigação e penalização em caso de infrações contrárias ao interesse público, aumentando a transparência e a responsabilização das próprias organizações. 
 
 
Regime jurídico Português

Âmbito de aplicação da Lei n.º 93/2021

Como referido, a Lei n.º 93/2021, de 20 de dezembro, que estabelece o regime geral de proteção de denunciantes de infrações, transpôs para o ordenamento jurídico nacional a referida Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019 (doravante “Regime Geral de Proteção dos Denunciantes” ou “Lei n.º 93/2021”).

A Lei n.º 93/2021 entrou em vigor no passado dia 18 de junho de 2022 e impõe a adoção de canais para a receção de denúncia interna e/ou denúncia externa, consoante os casos, que a seguir se detalham.

Por denúncia interna entende-se a comunicação verbal ou escrita de informações sobre infrações no interior de uma entidade jurídica no setor privado ou público, a saber: (i) Estado e entidades públicas e privadas com ≥ 50 trabalhadores; (ii) autarquias locais com ≥ 10 000 habitantes; (iii) pessoas coletivas que, independentemente do número de trabalhadores, estejam contempladas pela aplicação de determinados actos da União, nomeadamente, relativos a serviços, produtos e mercados financeiros, prevenção do branqueamento de capitais, segurança dos transportes e proteção do ambiente – as designadas “entidades obrigadas”.

Por seu turno, a denúncia externa consiste na comunicação verbal ou escrita de informações sobre violações às seguintes autoridades: (i) Ministério Público e órgãos de polícia criminal; (ii) Banco de Portugal; (iii) autoridades administrativas independentes; (iv) institutos públicos e associações públicas; (v) inspeções-gerais e entidades equiparadas a outros serviços centrais da administração direta do Estado e (vi) autarquias locais – as designadas “autoridades competentes”. Para que o denunciante possa beneficiar da proteção conferida pela Lei n.º 93/2021, tem de se verificar um conjunto de condições de aplicação objetiva e subjetiva.

Quanto às condições de aplicação subjetiva, têm de estar preenchidos o conceito de denunciante e as condições de proteção previstos na Lei n.º 93/2021.

O Regime Geral de Proteção dos Denunciantes consagra um conceito amplo de denunciante, identificando-o com o indivíduo que denuncie ou divulgue publicamente uma infração com fundamento em informações obtidas no âmbito da sua atividade profissional, independentemente da natureza da atividade e do setor em que é exercida. A título meramente exemplificativo, podem ser considerados denunciantes: (i) trabalhadores; (ii) prestadores de serviços; (iii) fornecedores; (iv) titulares de participações sociais; (v) pessoas pertencentes a órgãos de administração ou de gestão ou a órgãos fiscais ou de supervisão.

Por outro lado, devem estar preenchidas as seguintes condições adicionais: (i) o denunciante deve estar  de boa-fé; (ii) o denunciante deve ter  fundamento sério para crer que as informações são verdadeiras aquando da denúncia ou da divulgação pública; (iii) a informação deve dizer  respeito a uma violação abrangida, i.e., suscetível de denúncia (infração); e (iv) a denúncia deve ser  efetuada através do meio de denúncia adequado, ou seja, o denunciante não pode recorrer previamente a canais de denúncia externa ou divulgação pública de uma infração, sem antes ter apresentado uma denúncia pelo canal de denúncia interna, salvo determinadas exceções.  

No que diz respeito às condições de aplicação objetiva, o objeto da denúncia tem de corresponder a actos e omissões, dolosos ou negligentes, imputados à conduta dos membros dos órgãos sociais e demais colaboradores da entidade obrigada, bem como de terceiros desde que afetem uma pessoa da entidade obrigada, relacionadas com as seguintes matérias: (i) corrupção e infrações conexas; (ii) contratação pública; (iii) serviços, produtos e mercados financeiros e prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo; (iv) segurança e conformidade dos produtos; (v) segurança dos transportes; (vi) proteção do ambiente;  (vii) proteção contra radiações e segurança nuclear; (viii) segurança dos alimentos para consumo humano e animal, saúde animal e bem-estar animal; (iv) saúde pública; (x) defesa do consumidor; (xi) proteção da privacidade e dos dados pessoais e segurança da rede e dos sistemas de informação; (xii) acto ou omissão contrário e lesivo dos interesses financeiros da União Europeia;  (xiii) acto ou omissão contrário às regras de mercado interno da União Europeia; (xiv) criminalidade violenta, especialmente violenta e altamente organizada.

Do elenco das matérias acima não fazem parte matérias relativas à aplicação da legislação laboral como seja, por exemplo, situações de discriminação entre trabalhadores, assédio, entre outras. Estas matérias estão, à partida, excluídas do âmbito do regime de proteção do denunciante, uma vez que beneficiam de um regime e procedimento próprios previstos na legislação laboral. Isto não significa, no entanto, que o empregador não possa fazer uso dos canais de denúncia interna para a comunicação de infrações laborais. Poderá eventualmente fazê-lo, mas com as necessárias ressalvas, devendo ser feita referência ao facto de estas matérias serem objeto de um tratamento próprio em sede de legislação laboral. 

 

Meios de denúncia disponíveis

As denúncias podem ser apresentadas através de um de três meios: (i) canal de denúncia interna, (ii) canal de denúncia externa ou (iii) divulgação pública.

Existe uma ordem específica de precedência quanto ao seu uso para que o denunciante possa beneficiar do regime de proteção já referido. O uso do canal de denúncia interna tem precedência em relação aos demais meios de denúncia e o canal de denúncia externa em relação à divulgação pública.

Cada entidade obrigada é livre de escolher o meio pelo qual disponibiliza o seu canal de denúncia.

Contudo, independentemente da escolha efetuada, o canal de denúncia tem de salvaguardar que a denúncia possa ser feita: (i) por escrito (v.g. correio ou plataforma online); (ii) verbalmente (v.g. linha telefónica ou outro sistema de mensagens de voz).

O canal de denúncia tem de cumprir um conjunto de salvaguardas, designadamente: (i) exaustividade, integridade e conservação da denúncia; (ii) independência e imparcialidade; (iii) confidencialidade da identidade do denunciante ou de terceiros ou anonimato, quando seja solicitado pelo denunciante; (iv) proteção de dados; (v) sigilo; e (vi) ausência de conflitos de interesses.

As entidades devem adotar procedimentos específicos de informação, resposta, tratamento de denúncias e formação a trabalhadores, os quais devem prever, a título de boas práticas, diversas fases: (i) preliminar; (ii) abertura de investigação; (iii) realização de investigação; e (v) comunicação do resultado e apuramento das consequências.

A adoção de um procedimento é essencial para garantir que as entidades cumprem com os prazos (máximos) previstos na lei para o seguimento de denúncias, designadamente: (i) 7 dias  para acusar a receção da denúncia e prestar ao denunciante informações sobre os requisitos, forma e admissibilidade da denúncia; (ii)  3 meses para informar o denunciante sobre as medidas previstas ou adotadas para dar seguimento à denúncia; (iii) 15 dias após a conclusão do caso para dar resposta à solicitação do denunciante referente à informação sobre o resultado da análise efetuada à comunicação. 

 

Proteção de dados pessoais nos canais de denúncia

O tratamento de dados pessoais, incluindo o intercâmbio ou a transmissão de dados pessoais pelas autoridades competentes, têm de observar o disposto no Regulamento (UE) n.º 2016/679 relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, que aprovou o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), e na Lei n.º 59/2019 de 8 de agosto, que estabelece determinados aspetos de execução do RGPD na ordem jurídica portuguesa.

Os dados pessoais que manifestamente não forem relevantes para o tratamento da denúncia não devem ser conservados, pelo que, se forem recolhidos, têm de ser imediatamente apagados, em conformidade com o princípio da minimização dos dados. Tal situação não prejudica o dever de conservação de denúncias apresentadas verbalmente, quando essa conservação se faça mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável.

Os dados devem ser conservados de uma forma que permita a identificação dos respetivos titulares apenas durante o período necessário para as finalidades para as quais são tratados, ou seja, para efeitos do tratamento da denúncia, em conformidade com princípio da limitação da conservação previsto no RGPD.

As entidades obrigadas e as autoridades competentes responsáveis por receber e tratar as denúncias devem manter um registo das denúncias recebidas e conservá-las, pelo menos, durante o período de cinco anos e, independentemente desse prazo, durante a pendência de processos judiciais ou administrativos referentes à denúncia.  Os dados pessoais podem ser conservados por períodos mais longos, desde que sejam tratados exclusivamente para fins estatísticos e sujeitos à aplicação das medidas técnicas e organizativas adequadas.

As denúncias apresentadas verbalmente, através de linha telefónica com gravação ou outro sistema de mensagem de voz gravada, são registadas, obtido o consentimento do denunciante, mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável ou mediante transcrição completa e exata da comunicação.

Caso o canal de denúncia verbal não permita a gravação, as entidades obrigadas e as autoridades competentes lavram uma acta fidedigna da comunicação. 

Por último, caso a denúncia seja apresentada em reunião presencial, as entidades obrigadas e as autoridades competentes, obtido o consentimento do denunciante, procedem ao registo da reunião mediante gravação da comunicação em suporte duradouro e recuperável ou através de acta fidedigna.

 

Proibição de retaliação

A Lei n.º 93/2021 estabelece no seu artigo 21.º a proibição da prática de actos de retaliação contra o denunciante, definindo-os como qualquer acto ou omissão que, direta ou indiretamente, ocorrendo em contexto profissional, motivado por uma denúncia interna, externa ou divulgação pública, cause ou possa causar ao denunciante, de modo injustificado, danos patrimoniais ou não patrimoniais.

Entre outros, a lei presume os seguintes actos motivados pela denúncia, quando praticados até dois anos após a apresentação da denúncia ou da divulgação pública da infração: (i) alterações das condições de trabalho; (ii) suspensão do contrato de trabalho; (iii) avaliação negativa de desempenho; (iv) despedimento; (v) não conversão do contrato de trabalho a termo em contrato sem termo; e (v) resolução do contrato de prestação de serviços.

A eventual sanção disciplinar aplicada ao denunciante até dois anos após a denúncia ou divulgação pública presume-se abusiva.

Isto significa que há uma inversão do ónus da prova a favor do denunciante, cabendo ao empregador ilidir essa presunção, fazendo prova de que a prática de alguns dos atos anteriores não terá sido motivada por denúncia apresentada pelo denunciante.

É, portanto, expetável que a litigiosidade, opondo trabalhadores a empregadores possa vir a aumentar, restando-nos aguardar pelas futuras decisões dos tribunais portugueses quanto ao tratamento das questões laborais associadas aos canais de denúncia. 

 

Regime jurídico Brasileiro

É recente o aparecimento da figura do denunciante de boa-fé (whistleblower) no panorama legislativo brasileiroPode considerar-se que a sua primeira aparição se deu aquando da redação do artigo 33.º da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, ratificada pelo Brasil no ano de 2003, em que é prevista a obrigatoriedade de os Estados incorporarem medidas de proteção aos denunciantes de boa-fé.

Esta obrigação visa que tanto membros de organizações, do setor público ou privado, bem como membros da sociedade civil, procurem denunciar práticas ilegais, imorais ou ilegítimas, através de mecanismos pré-estabelecidos. É inegável que os números associados às práticas de corrupção no Brasil são alarmantes em diversos setores. O objetivo é essencialmente o de prevenir a prática de actos de corrupção, principalmente em entidades públicas, na medida em que não existem leis que estabeleçam a obrigação de canais de denúncias em entidades privadas – o que não impede, todavia, a imposição analógica da obrigação às empresas privadas.

No ano de 2013, o Poder Legislativo editou a Lei n.º 12.846, que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de actos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira. No seu Capítulo III, a Lei prevê a responsabilidade administrativa das pessoas jurídicas que pratiquem actos lesivos, estabelecendo no seu artigo 7.º, VIII, que a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e aplicação de códigos de ética e de conduta são fatores a serem considerados quando forem aplicadas sanções respeitantes à responsabilização administrativa. Em razão da referida previsão, entende-se a intenção legislativa de fazer com que os canais de denúncias dentro da estrutura empresarial sejam considerados requisitos para um completo e efetivo programa de integridade.

No que diz respeito à proteção dos denunciantes, em 2018, a Lei n.º 13.608, que dispõe sobre os serviços telefónicos de receção de denúncias e recompensas pela prestação de informações que possam servir de auxílio em investigações policiais, passou a estabelecer que o denunciante, ainda que se identifique, terá assegurada a preservação da sua identidade e o o sigilo dos seus dados, e poderá inclusivamente receber um prémio, em dinheiro, pelas informações que levem à resolução de investigações criminais. A identidade do denunciante apenas será revelada quando seja de interesse público ou de interesse concreto para a apuração dos factos. Esta Lei visa fundamentalmente incentivar a população a contribuir para implementação de uma cultura anticorrupção.

O artigo 4.º-C da Lei n.º 13.608/2018 prevê que ao denunciante seja assegurada a proteção contra retaliações, tais como demissão arbitrária, alteração injustificada de funções ou atribuições, imposição de sanções, de prejuízos remuneratórios ou materiais de qualquer espécie, retirada de benefícios, diretos ou indiretos, ou recusa de providência de referências profissionais positivas. Além da garantia de proteção, o referido artigo prevê que ações ou omissões de retaliação ao informante configurarão infração disciplinar grave, sujeitarão o agente a demissão tendo em vista a proteção do serviço público, e, no caso de eventuais danos materiais causados por omissões ou ações praticadas em retaliação, sem prejuízo de danos morais, o denunciante poderá ser ressarcido em dobro por eventuais danos materiais que lhe sejam causados.

Não existem no ordenamento jurídico brasileiro previsões legais relativas à obrigatoriedade de canais de denúncias ou proteção aos denunciantes no âmbito privado. Todavia, no âmbito laboral, em razão de diversos princípios que protegem as relações de trabalho e os trabalhadores, caso existam canais de denúncia internos, é possível a aplicação análoga das disposições legais acima referidas, como a proteção do informante, a impossibilidade de que este sofra retaliações, seja despedido ou seja submetido a situações que provoquem danos de natureza moral ou extrapatrimonial. Todos estes aspetos dependerão da forma como estipulados o referido canal de denúncia, as regras de compliance internas da empresa e a observação pela empresa das regras estabelecidas no âmbito do Direito do Trabalho brasileiro.

 

Síntese comparativa

No cenário brasileiro, pode observar-se que os whistleblowers são geralmente trabalhadores do setor privado, funcionários públicos ou prestadores de serviços, os quais podem: (i) denunciar casos de corrupção às autoridades policiais; (ii) relatar à receita federal casos de sonegação; (iii.) denunciar violações de âmbito laboral ao Ministério do Trabalho.

No setor privado, foi editada a Lei Anticorrupção, que fomentou a política de whistleblowing, ao prever a criação de canais de denúncia e uma política de proteção dos denunciantes. Por outro lado, no setor público, a edição da Lei n.º 13.608/2018, facilitou o reconhecimento de alguns institutos importantes, que fazem parte da política de whistleblowing para a prevenção, repressão ou apuração de crimes ou ilícitos administrativos. Ainda na esfera pública, houve a edição da Lei n.º 13.964/2019, proveniente do “Pacote Anticrime”. No âmbito administrativo, a política de proteção ao denunciante tem se materializado por meio de regulamentos editados ao longo dos anos de 2019 a 2021.

O Decreto n.º 8.420/2015 (Art. 42.º, X) determina que o canal de denúncia seja um dos parâmetros a ser considerado aquando da avaliação do programa de integridade e estabelece que este deve ser aberto e amplamente divulgado a funcionários e terceiros. Nos termos do art. 7.º, VIII, da Lei n.º 12.846/2013, possuir um canal de denúncias pode reduzir a pena de multa em caso de condenação. Portanto, vislumbra-se que, no Brasil, há mais um cumprimento de boas práticas por parte das empresas privadas que adotam esses canais do que uma obrigação legal passível de sanções.

No cenário português, os whistleblowers, são também trabalhadores do setor privado, funcionários públicos ou prestadores de serviços. As normas gerais do ordenamento jurídico português, já reconheciam a possibilidade de realizar denúncias internas que dissessem respeito a infrações penais e administrativas, além da sua divulgação pública. Era já previsto no artigo 244.º do Código de Processo Penal Português, por exemplo, que qualquer pessoa com conhecimento de um delito poderia denunciá-lo ao Ministério Público, o que inclui denúncias externas de funcionários de empresas sobre crimes nelas praticados.

As áreas sobre as quais incidiram normas de incentivo ao whistleblowing e de proteção aos whistleblowers foram os setores bancário, de mercado de capitais, de prevenção ao branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, da saúde e de combate à corrupção. A proteção já abrangia consequências no plano laboral, civil e, também, penal.

Por fim, quanto aos canais de denúncia em Portugal, as denúncias devem primariamente ser feitas através dos canais de denúncia internos. Podem igualmente ser realizadas através de canais de denúncia externa ou divulgadas publicamente. Porém, o denunciante só poderá recorrer a canais de denúncia externa quando: (i) não exista um canal de denúncia interna; (ii) o canal de denúncia interna admita apenas a apresentação de denúncias por trabalhadores, não o sendo o denunciante; (iii) tenha motivos razoáveis para crer que a infração não pode ser eficazmente conhecida ou resolvida a nível interno ou que existe risco de retaliação; (iv) tenha inicialmente apresentado uma denúncia interna sem que lhe tenham sido comunicadas as medidas previstas ou adotadas na sequência da denúncia no prazo máximo de três meses a contar da receção ou sem que seja comunicado ao denunciante o resultado da análise efetuada, no prazo de 15 dias após a respetiva conclusão; ou (iv) a infração constitua crime.

Da nossa parte, acreditamos poder concluir que as divergências de soluções quanto aos problemas que o tema levanta são justificadas pelas diferenças culturais e pelos próprios princípios inerentes a cada ordenamento jurídico.

 

2022-07-22

Já se encontra publicado no Boletim do Trabalho e Emprego o novo Acordo de Empresa da CP e respetivo Regulamento de Carreira aplicável aos maquinistas de comboios, representados pelo Sindicato Nacional dos Maquinistas dos Caminhos de Ferro Portugueses (SMAQ).

Sinteticamente, o novo Acordo de Empresa e respetivo Regulamento de Carreiras consagram as seguintes alterações:

  • Aumento salarial, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2022;
  • Eliminação de um índice na base para todas as categorias da carreira de condução;
  • Acréscimo de um índice no topo para todas as categorias da carreira de condução;
  • Criação de tempos mínimos de permanência, para mudança de índice, com o máximo de quatro anos;
  • Eliminação de sobreposições de índices entre categorias profissionais e respetivas chefias;
  • Integração do Abono de Agente Único na retribuição;
  • Aumento do subsídio de refeição para €7,74;
  • Criação de uma tabela indiciária autónoma para os trabalhadores abrangidos pela carreira de condução;
  • Consagração do regime de teletrabalho, nos termos previstos no Código do Trabalho, quando as funções assim o permitam; e
  • Consagração de acesso automático à categoria de Assistente de Tração. 

O novo AE contém um regime globalmente mais favorável para os trabalhadores, e também abrange os trabalhadores filiados no SMAQ, bem como os trabalhadores não filiados em sindicato outorgante que a ele adiram, no prazo de três meses, nos termos das regras previstas no Acordo de Empresa.

A celebração deste novo Acordo de Empresa enquadra-se no princípio da autonomia coletiva e no direito à contratação coletiva, consagrados entre os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, no artigo 56.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.

2022-06-27

Foi aprovada a Proposta de Lei n.º 79/XXIII/2022, que visa alterar o Código do Trabalho.

A Proposta contém diversas medidas, que vão agora ser discutidas e votadas na Assembleia da República.

Eis as principais alterações:

 

Definição de “dependência económica”

Considera-se que há “dependência económica” sempre que o prestador de trabalho seja uma pessoa singular que presta, diretamente e sem intervenção de terceiros, uma atividade para o mesmo beneficiário, e dele obtém mais de 50% do produto da sua atividade, num ano civil (10.º/2).

 

Direitos coletivos para os economicamente dependentes

As pessoas em situação de dependência económica passam a ter direito: (i) à representação dos seus interesses socioprofissionais por associação sindical e por comissão de trabalhadores, ainda que delas não possam ser membros; (ii) à negociação de instrumentos de regulamentação coletivas de trabalho negociais, específicos para trabalhadores independentes, através de associações sindicais; (iii) à aplicação dos instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho negociais já existentes e aplicáveis a trabalhadores, nos termos neles previstos (10.º-A).

 

Plataformas digitais – presunção de laboralidade

Cria-se uma nova presunção de laboralidade para o trabalho prestado nas plataformas digitais, presumindo-se a existência de contrato de trabalho quando se verifiquem determinados requisitos: a retribuição é fixada pelo operador da plataforma; o operador dirige a forma de atuação e apresentação do prestador; o operador controla a atividade prestada, nomeadamente através de meios eletrónicos; o operador restringe a autonomia do prestador de atividade quanto à organização do trabalho, especialmente quanto à escolha do horário de trabalho ou dos períodos de ausência, à possibilidade de aceitar ou recusar tarefas, à utilização de subcontratados ou substitutos ou através da aplicação de sanções beneficiária que nela opere; restringe a possibilidade de escolha dos clientes ou de prestar atividade a terceiros via plataforma; os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem ao operador de plataforma digital. A presunção pode ser ilidida pelo operador de plataforma (artigo 12.º-A).

 

“Falsos recibos verdes” – novas sanções acessórias

Reforço da sanção acessória para as situações de “falsos” contratos de prestação de serviços, determinando, em caso de reincidência: (i) a privação do direito a apoio, subsídio ou benefício outorgado por entidade ou serviço público, ou proveniente de fundos europeus; e (ii) a privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos (12.º/3).

 

Algoritmos e Inteligência Artificial

Em matéria de uso de algoritmos, inteligência artificial e matérias conexas, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho apenas podem afastar as normas legais em sentido mais favorável para os trabalhadores (3.º/3).
Igualdade e não discriminação também se aplica no caso de tomada de decisões baseadas em algoritmos ou outros sistemas de inteligência artificial (24.º/3).

 

Alargamento de “práticas discriminatórias”

São consideradas práticas discriminatórias as discriminações remuneratórias relacionadas com a atribuição de prémios de assiduidade e produtividade, bem como afetações desfavoráveis em termos de avaliação e progressão na carreira (25.º/6 e 7).

 

Faltas por adoção e acolhimento familiar

Processos de adoção e de acolhimento famílias são considerados ausências justificadas ao trabalho que não determinam a perda de quaisquer direitos e que são consideradas como prestação efetiva de trabalho, exceto quanto à retribuição (65.º/1, k).


Dever de informação ao trabalhador

Empregador passa a ter de informar o trabalhador sobre novos aspetos, nomeadamente: (i) a identificação do utilizador, no caso de trabalhador temporário; (ii) o direito individual a formação continua; (iii) no caso de trabalho intermitente, a informação prevista no regime legalmente estabelecido; (iv) os parâmetros, as regras e as instruções em que se baseiam os algoritmos ou outros sistemas de inteligência artificial (106.º/3).

 

Período experimental

O período experimental de 180 dias aplicável aos trabalhadores com contrato por tempo indeterminado que estejam à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração é reduzido e ou excluído consoante a duração de anterior contrato de trabalho a termo, celebrado com empregador diferente, tenha sido igual ou superior a 90 dias (112.º/5).

Consagração da possibilidade de redução do período experimental consoante a duração do estágio profissional com avaliação positiva, para a mesma atividade e empregador diferente, tenha sido igual ou superior a 90 dias, nos últimos 12 meses (112.º/6).

O prazo de aviso prévio para denúncia do contrato durante o período experimental, depois de decorridos mais de 120 dias, passa a ser 30 dias (114.º/3).

Obrigação de comunicação à CITE da denúncia do contrato durante o período experimental estende-se ao trabalhador cuidador (114.º/5).

Obrigação de comunicação à ACT, no prazo de 15 dias, da denúncia do contrato durante o período experimental aplicável a contratos sem termo de pessoas à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração (114.º/6).

As novas regras passam a prever que apesar de a denúncia não depender de justa causa, não pode ser abusiva, nos termos do artigo 334.º do Código Civil (114.º/7).

 

Contratação a termo

Reforço das regras relativas à sucessão de contratos a termo evitando o recurso abusivo a esta forma de contratação, designadamente impedindo nova admissão ou afetação de trabalhador através de contrato (a termo, temporário ou prestação de serviços) cuja execução se concretize, no mesmo posto de trabalho, para o mesmo objeto ou na mesma atividade profissional (143.º/1).

Obrigação de comunicação obrigatória à CITE, com a antecedência mínima de cinco dias úteis a contar da data do aviso prévio, do motivo da não renovação de contrato de trabalho a termo, estende-se ao trabalhador cuidador (144.º/3).

Alargamento da compensação para 24 dias por ano em caso de cessação de contrato de trabalho a termo (certo ou incerto) (344.º/2).

 

Trabalho temporário

No caso de se ter completado a duração máxima de contrato de utilização de trabalho temporário, é proibida a sucessão no mesmo posto de trabalho de trabalhador temporário ou de trabalhador contratado a termo, celebrado com o mesmo empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, antes de decorrer um período de tempo igual a um terço da duração do referido contrato, incluindo renovações (179.º/1).

Em caso de celebração ou renovação de contrato de utilização com empresa de trabalho temporário (ETT) não licenciada, a integração é feita com contrato sem termo na empresa utilizadora (180.º/5).

A duração de contratos de trabalho temporário sucessivos em diferentes utilizadores, celebrados com o mesmo empregador ou sociedade que com este se encontre em relação de domínio ou de grupo, ou mantenha estruturas organizativas comuns, não pode ser superior a quatro anos. Ultrapassado tal limite, o contrato converte-se em contrato de trabalho por tempo indeterminado para cedência temporária (180.º/4 e 5).

 

Relações coletivas de trabalho e da negociação coletiva

Admite-se o exercício da atividade sindical na empresa ainda que não existam trabalhadores sindicalizados, mediante condições específicas aplicáveis e desde que não se afete o normal funcionamento da atividade produtiva (460.º/2).

A escolha da convenção coletiva não ser possível se o trabalhador já se encontrar abrangido por portaria de extensão (497.º/5) e a emissão da portaria de extensão afasta a aplicação de convenção que tenha, eventualmente, sido escolhida (515.º/5).

Em caso de denúncia de convenção coletiva a parte destinatária pode requerer ao Presidente do Conselho Económico e Social arbitragem para apreciação da fundamentação da denúncia, a qual suspende os seus efeitos, impedindo a convenção de entrar em regime de sobrevigência (500.º-A).

2022-05-30

Introdução

Com o avanço das tecnologias e a adoção de modelos económicos globalizados e compartilhados, surgiram novas formas de prestação de trabalho, que trazem novos desafios quanto à regulação e enquadramento dessas relações.

O trabalho prestado em plataformas digitais é uma dessas novas realidades. Caracteriza-se pela descentralização de atividades e de atores, pela gestão algorítmica do trabalho e pela flexibilidade nas relações laborais. Em regra, envolve três partes: o provedor de plataforma, o fornecedor e o demandante.

Perante estes novos modelos de trabalho, assentes nas tecnologias de informação e comunicação e no recurso a plataformas digitais, o Direito procura dar novas respostas, de forma a regular esta nova forma de trabalhar.

O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que foi elaborado pelo Governo português e publicado em março de 2022, é um exemplo de como essas inquietações estão a merecer a atenção dos decisores políticos.

Nesta newsletter, os especialistas dos escritórios MACEDO VITORINO (Lisboa, Portugal) e DENISE FINCATO (Porto Alegre, Brasil) apresentam, de forma sintética, as recentes iniciativas legislativas e decisões judiciais relativos à regulação e ao enquadramento dado ao trabalho prestado em plataformas digitais, sob uma ótica comparada, envolvendo os sistemas jurídicos de Portugal, Brasil e Itália.

 

Proposta de Diretiva da União Europeia

Há muito que era aguardada uma Proposta de Diretiva que regulasse as condições de trabalho dos trabalhadores das plataformas digitais e que clarificasse o estatuto destes trabalhadores. Essa Proposta chegou em 9 de dezembro de 2021, devendo agora ser negociada entre Conselho (Estados-membros) e Parlamento Europeu. Se aprovada, deverá ser transposta no prazo máximo de 2 anos.

A Diretiva cria uma lista de critérios de controlo para determinar se a plataforma é (ou não) um empregador, sendo que caso se verifique a existência de pelo menos 2 critérios, presume-se juridicamente que a plataforma é uma entidade empregadora. Os critérios a ter em conta são, designadamente, os seguintes: (i) supervisão da execução do trabalho pela plataforma; (ii) restrição da liberdade de escolha do horário de trabalho e/ou dos períodos de ausência; (iii) impedimentos à realização de trabalhos para terceiros; (iv) imposição de regras de conduta e aparência aos funcionários que trabalham nas plataformas; e (v) fixação dos níveis de remuneração (artigo 4.º). Nos termos do artigo 5.º da Proposta, a plataforma pode afastar a presunção legal de vínculo laboral, cabendo-lhe fazer prova de que não existe uma relação de trabalho.

A Proposta pretende ainda aumentar a transparência na utilização de algoritmos pelas plataformas, assegurando a monitorização humana e o direito de contestar decisões automatizadas (artigo 6.º).

A par do mencionado, a Proposta reforça os poderes das autoridades inspetivas e obriga as plataformas a cumprirem um conjunto de deveres de informação sobre a forma como o trabalho é prestado, o número de trabalhadores e as condições contratuais aplicáveis (artigos 11.º e 12.º).

Por fim, no artigo 18.º, estabelece-se a proteção dos trabalhadores das plataformas contra despedimentos ilícitos. Com este passo, podemos afirmar que em breve teremos uma Europa totalmente preparada para a Era Digital.

 

Portugal 

Recentemente o Governo Português, no âmbito da “Agenda do Trabalho Digno", aprovou uma proposta de lei que altera o Código do Trabalho e que vai de encontro ao previsto na Proposta de Diretiva acima referida, isto é, cria uma presunção de vínculo laboral para o trabalho desenvolvido nas plataformas digitais (artigo 12.º-A).

A presunção assenta na existência de um conjunto de indícios, que passam, nomeadamente, pelos seguintes: (i) o operador de plataforma digital fixa a retribuição para o trabalho efetuado na mesma ou estabelece limites máximos e mínimos para aquela; (ii) o operador de plataforma digital processa o pagamento entre os utilizadores e o prestador da atividade das plataformas; (iii) o prestador da atividade não atua em nome próprio, antes presta a sua atividade inserido na organização do operador de plataforma digital; (iv) a comunicação entre os utilizadores e prestador da atividade é realizada e gerida pelo operador de plataforma digital; (v) o operador de plataforma digital controla a qualidade dos resultados atingidos pelo prestador da atividade fornecendo aos seus utilizadores a avaliação ou o rating dos mesmos; (vi) o operador de plataforma digital controla em tempo real a atividade realizada pelo prestador da atividade, nomeadamente através de um sistema de geolocalização contínuo e de uma gestão algorítmica; (vii) o operador de plataformas digitais exerce poderes sobre o prestador da atividade, nomeadamente o disciplinar, podendo excluí-lo de futuras atividades através da desativação da conta quando têm uma avaliação considerada como insuficiente. A presunção pode ser ilidida pelo operador da plataforma.

A proposta de lei, que ainda não foi aprovada, salvaguarda regimes especiais que já têm regras próprias, como é o caso dos TVDE, mantendo-se, neste caso, a figura do operador, que limita o reconhecimento do vínculo laboral entre motoristas e plataformas.

Em Portugal, a Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto, prevê o regime jurídico da atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaraterizados a partir de plataforma eletrónica. De forma inovadora, a lei portuguesa introduziu um quarto interveniente no processo. Para além da plataforma eletrónica, do motorista e do passageiro, surge o operador TVDE, que é quem presta o serviço remunerado de passageiros e que, por sua vez, celebra o contrato com os motoristas.

Esta lei acabou com o “vazio regulatório” existente no ordenamento português, estabelecendo um conjunto de requisitos para o exercício das atividades económicas em causa. O início da atividade, quer do operador de TVDE, quer do operador de plataformas, está sujeito ao licenciamento do IMT. No que diz respeito aos motoristas, a lei define um sistema de pré-qualificação obrigatória, a qual inclui um contrato escrito que titula a sua relação e o operador de TVDE, ao qual se aplica a presunção de contrato de trabalho consagrada no artigo 12.º do Código do Trabalho.

 

Brasil 

No Brasil, não há nenhuma norma específica que regule as relações de trabalho mediadas por plataformas digitais. Existem diversos projetos de lei em andamento, alguns estabelecendo e outros excluindo a presunção do vínculo laboral (conforme os artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT), que possui como elementos essenciais à sua caracterização: a subordinação, a pessoalidade, a habitualidade e a onerosidade.

O reconhecimento do vínculo de emprego envolvendo os recentes modelos de contratação acordados entre motoristas das aplicações e empresas provedoras de plataformas de tecnologia é ainda um tema novo no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho (TST) brasileiro. Embora algumas “Turmas” do TST já tenham proferido decisões que reconhecem o vínculo laboral entre o motorista e a Uber, outras proferiram decisões em sentido diverso, demonstrando que não há entendimento consolidado acerca do tema na Justiça Laboral Brasileira.

Durante a pandemia causada pela COVID-19, em 2020, os prestadores de serviço de plataformas digitais no país organizaram o “Breque dos Apps”, uma espécie de greve nacional dos prestadores de serviço, que contou com grupos organizados em várias cidades do Brasil. As manifestações tiveram a participação dos prestadores de serviço que desligaram as suas aplicações durante algumas horas como forma de protesto. De entre as reivindicações que pautaram essa mobilização, destacava-se o aumento do valor mínimo por viagem, a solicitação de benefícios como vale-refeição e seguros (de vida, contra acidentes e roubos), o fim dos bloqueios nas aplicações e o fornecimento de equipamentos de proteção contra o vírus, tais como máscaras e álcool-gel.

Em janeiro de 2022 foi aprovada a Lei n.º 14.297, que trata especificamente da proteção de prestadores que prestam seus serviços por intermédio das plataformas digitais, durante período pré-fixado e qualificado como “estado de emergência em saúde pública”. Entre as medidas, a lei prevê que as plataformas devem ter seguro contra acidentes com previsão de indemnização ao trabalhador, assim como a obrigação de os prestadores de serviço diagnosticados com Covid-19 receberem auxílio financeiro da plataforma por um período inicial de 15 dias. O incumprimento das regras de proteção pelas empresas pode resultar em sanções que vão desde advertências até o pagamento de multas.

Contudo, no dia 22 de abril de 2022, o Ministério da Saúde brasileiro publicou uma portaria em que declarou o fim do estado de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin). A entrada em vigor da referida portaria afetará diretamente algumas regras laborais, modificadas temporariamente em razão da situação excecional enfrentada nos últimos dois anos. Entre elas estão obrigações impostas a empresas e direitos de trabalhadores que foram flexibilizados e, nesse mesmo sentido, a cessação da referida Lei n.º 14.297/22.

O desafio da regulação do trabalho mediado por plataformas passa por encontrar um equilíbrio: por um lado, importa proteger quem exerce sua atividade laboral através de meios telemáticos; por outro, importa estimular as empresas que, alicerçadas na livre iniciativa e no avanço tecnológico, procuram desenvolver a sua atividade com base na digitalização.

Em suma, o cenário brasileiro ainda se apresenta juridicamente inseguro face ao desenvolvimento de relações de trabalho em plataformas, quer por inexistência de legislação específica, quer por divergência jurisprudencial, facto que gera insegurança jurídica aos trabalhadores da nova economia.

 

Itália

Em 2015, o Tribunale di Milano pronunciou-se relativamente a um litígio entre várias entidades representativas da categoria de taxistas e a UBER POP (procedimento cautelare n.º 16612). Tendo em conta que o serviço disponibilizado por meio da plataforma digital da Uber concede a possibilidade, a quem não tem carteira de motorista de táxi, de realizar um serviço de transporte pago, usando a aplicação da empresa (que funciona como intermediário entre motoristas e clientes), o Tribunal de Milão considerou que a atividade da UBER POP era um caso de concorrência desleal, nos termos do art. 2598 n. 3 do Código Civil italiano.

Recorde-se que o Codice Civile, no parágrafo terceiro do art. 2598.º, estabelece que quem fizer uso, direta ou indiretamente, de qualquer outro meio que não cumpra os princípios da idoneidade profissional e que possa causar prejuízo a empresa alheia, pratica actos de concorrência desleal.

Por outro lado, o artigo 82.º do Código da Estrada Italiano define os limites da utilização do veículo a favor de terceiros, sancionando a proibição de utilização do veículo para fins diversos dos indicados nos documentos de matrícula.

Recentemente, o Decreto-Legge n.º 143, de 29 de dezembro de 2018, que regula, para além do setor dos táxis, o do noleggio con conducente (NCC), criou novas regras para o sistema de transporte público não regular, como por exemplo, o facto de os NCC serem obrigados a regressar à sua sede após cada viagem. Ao contrário dos táxis, que param em zonas públicas especialmente marcadas, o NCC pode operar em todo o território nacional, sem dispor de zonas de estacionamento assinaladas.

O diploma, todavia, nada previu sobre o fenómeno Uber e, em geral, sobre o trabalho desenvolvido nas plataformas digitais.

Essa previsão caberá agora ao legislador que terá de tomar em consideração a muito recente diretiva da UE.

2022-04-22

Na sequência da diminuição de casos de Covid-19, foram publicados dois novos diplomas (Resolução de Conselho de Ministros e Decreto-Lei) que estabelecem uma diminuição das medidas excecionais e temporárias, para contenção da pandemia.

Eis as principais medidas com impacto laboral:

Uso de máscara

Foi eliminada a possibilidade de, nos locais de trabalho, o empregador implementar medidas que obriguem ao uso de equipamento de proteção individual adequado, como máscaras ou viseiras.

Foi também eliminada a obrigatoriedade de uso de máscara existente em: (i) espaços, equipamentos e estabelecimentos comerciais e prestação de serviços; (ii) edifícios públicos ou de uso público onde se prestem serviços ou corram actos que envolvam público; (iii) estabelecimentos de ensino e educação.

A obrigatoriedade de uso de máscara ainda se irá manter em alguns locais de trabalho, tais como, em estabelecimentos e serviços de saúde, estruturas residenciais ou de apoio domiciliário, bem como em locais em que tal seja determinado pela Direção Geral da Saúde.

A obrigatoriedade de uso de máscara para os trabalhadores permanecerá também nos transportes colativos de passageiros, bem como táxi ou TVDE.

Excecionalmente prevê-se a possibilidade de não utilização de máscara nas seguintes situações:

  • Atestado Médico de Incapacidade Multiusos ou declaração médica, no caso de se tratar de pessoas com deficiência cognitiva, do desenvolvimento e perturbações psíquicas;
  • Declaração médica que ateste que a condição clínica da pessoa não se coaduna com o uso de máscaras ou viseiras.

Testes de diagnóstico

A realização de testes de diagnostico pode ser determinada pela DGS.

O empregador encontra-se proibido de registar ou conservar resultados de testes, incluindo comprovativos da sua realização, associados à identidade da pessoa, salvo com expressa autorização da mesma.

Nas situações em que o resultado dos testes impossibilite o acesso ao local de trabalho, a falta é considerada justificada.

Estas medidas representam mais um “passo” no regresso à normalidade, na sequência do fim da obrigatoriedade do teletrabalho.

 
2022-04-08

O Governo português prorrogou o prazo para a apresentação do Relatório Único pelas empresas até ao dia 15 de maio.

O Relatório Único é um documento, de periodicidade anual, que concentra um conjunto de informações sobre a atividade social da empresa a prestar pelos empregadores à Administração do Trabalho.

De entre essas informações contam-se informações relativas ao quadro de pessoal, à comunicação trimestral de celebração e cessação de contratos de trabalho a termo, à relação semestral dos trabalhadores que prestaram trabalho suplementar, ao relatório da formação profissional contínua, ao relatório da atividade anual dos serviços de segurança e saúde no trabalho e ao balanço social.

Antes de entregar o Relatório Único, o empregador deve promover o visto da relação nominal dos trabalhadores que prestaram trabalho suplementar durante o ano civil, com discriminação do número de horas prestadas, visada pela comissão de trabalhadores ou, na sua falta, em caso de trabalhador filiado, pelo sindicato.

A informação anual inclui também aspetos relativos a greves e sobre os prestadores de serviço.

As empresas com trabalhadores por conta de outrem ficam obrigadas a apresentar, por meio informático, este relatório, preenchendo o modelo próprio, cujo conteúdo se encontra regulado pela Portaria n.º 55/2010, de 21 de janeiro.

Esta portaria estabelece como prazo de entrega do Relatório Único o período compreendido entre 16 de março a 15 de abril do ano seguinte àquele a que o relatório disser respeito.

À semelhança de anos anteriores, este prazo foi, todavia, prorrogado, sendo possível às empresas procederem à entrega daquela informação até ao próximo dia 15 de maio, o que lhes conferirá mais tempo para coligirem e organizarem a informação a prestar à Administração do Trabalho.

As empresas devem ainda ter em conta que esta obrigação de reporte poderá não se extinguir com a entrega do Relatório Único. Por decisão do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral (conjuntamente com o organismo competente do ministério responsável pela área da saúde, quando a informação disser respeito à atividade do serviço de segurança e saúde no trabalho), poderá ser-lhes solicitado que desenvolvam o conteúdo do Relatório Único. Quando tal aconteça, o conteúdo desenvolvido deverá ser entregue dois anos após a disponibilização da sua versão simplificada.

2022-03-07

Seis anos depois de iniciada uma longa batalha judicial, a Federação Americana de Futebol aceitou o pagamento de cerca de 24 milhões de dólares à seleção feminina, atribuindo-lhes o mesmo montante que é pago à seleção masculina. A U.S. Soccer Federation prometeu às jogadoras americanas que, daqui para a frente, passaria a adotar uma política de igualdade salarial entre as seleções masculina e feminina, em todas as competições.

O acordo, que foi assinalado através de um Memorandum de Entendimento, depende agora da celebração de um novo acordo coletivo de trabalho entre a Federação e o Sindicato representativo das trabalhadoras. Assim que for celebrado, seguir-se-á a sua validação pelo Tribunal Distrital.

O processo teve início em 2016, quando cinco jogadoras apresentaram queixa às autoridades locais, acusando a federação de discriminação salarial entre sexos. O caso foi analisado pela Equal Employment Opportunity Commision e, perante a falta de resposta da Federação, 28 jogadoras, sob a liderança da icónica capitã Megan Rapinoe, processaram a U.S. Soccer Federation.
A ambição da seleção feminina chegou agora, com a conquista da igualdade salarial entre géneros.

Com esta decisão histórica foi dado um passo de gigante no sentido da igualdade salarial, a juntar a tantos outras que têm sido adotadas em diversos países.

No nosso país, o artigo 270.º do Código do Trabalho concretiza o princípio constitucional “a trabalho igual, salário igual”, estabelecendo que “Na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio ed que, para trabalho igual ou ed valor igual, salário igual”.

A igualdade retributiva implica a eliminação de qualquer discriminação fundada no sexo no que diz respeito à determinação (quantitativa) da retribuição.

Em Portugal existem algumas medidas de promoção da igualdade remuneratória entre homens e mulheres que pretendem evitar situações como esta. Por exemplo, as empresas portuguesas, independentemente da sua dimensão, têm a obrigação de assegurar uma política remuneratória transparente assente em critérios objetivos e não discriminatórios. Até 15 de abril de cada ano, as empresas estarão obrigadas a incluir no seu relatório único informação sobre a sua atividade social, designadamente remunerações e tempo de trabalho, dividida por géneros. Para além disso, o empregador deve disponibilizar essa informação aos trabalhadores da empresa e a diversas entidades, nomeadamente sindicatos que a solicitem e comissão de trabalhadores.

Estamos no bom caminho. Mas ainda há um longo caminho a percorrer.

2022-01-19

O Governo publicou o diploma que regulamenta o Estatuto do Cuidador Informal, aprovado em Anexo à Lei n.º 100/2019, de 6 de setembro.

O novo diploma estabelece os termos e as condições do reconhecimento do Estatuto do Cuidador Informal, bem como as medidas de apoio aos cuidadores informais e às pessoas cuidadas.

Eis os principais termos e condições consagrados no diploma:

Condições de reconhecimento do estatuto de cuidador informal

  • Preenchimento de um conjunto de requisitos gerais previstos na lei (v.g. residência legal em território nacional; idade igual ou superior a 18 anos);
  • Preenchimento de requisitos específicos (apenas no caso do cuidador informal principal);
  • Cumprimento de requisitos legais (v.g. situação de dependência de terceiros e a necessitar de cuidados permanentes);
  • Prestação do consentimento, nos termos definidos no diploma (v.g. manifestação de vontade inequívoca junto dos serviços do ISS, IP, mediante declaração assinada, acompanhada de declaração médica que ateste o pleno uso das faculdades intelectuais pela pessoa cuidada).

Procedimento de reconhecimento

  • Apresentação de requerimento nos serviços do ISS, I.P., preferencialmente, através da segurança social direta;
  • Junção de documentos comprovativos de requisitos genéricos relativos ao cuidado informal, bem como dos elementos de prova relativos à pessoa cuidada;
  • Decisão sobre o procedimento emitida em 20 dias, contados após a data da apresentação do requerimento para reconhecimento do estatuto;
  • Emissão do cartão de identificação do cuidador informal.

Cessação do reconhecimento do estatuto de cuidador informal

O reconhecimento do estatuto de cuidador informal cessa nos seguintes casos:

  • Cessação de residência habitual ou legal em território nacional do cuidador e ou da pessoa cuidada;
  • Invalidez permanente e definitiva, ou dependência, do cuidador;
  • Incumprimento dos deveres do cuidador informal, mediante informação fundamentada por profissionais da área da segurança social ou da área da saúde;
  • Incumprimento do dever de entrega da declaração do consentimento em nome da pessoa cuidada pelo seu acompanhante no prazo previsto na lei; e
  • Desistência ou morte do cuidador e ou da pessoa cuidada.

Medidas de apoio ao cuidador informal

  • Designação de profissional de referência para acompanhamento da pessoa cuidada;
  • Mobilização de recursos disponíveis para prestação de apoio e serviços ao nível de cuidados de saúde e de apoio social;
  • Criação de grupos de autoajuda nos quais o cuidador informal tem o direito de participar;
  • Disponibilização de programas de formação ao cuidador informal;
  • Possibilidade de atribuição de um subsídio de apoio ao cuidador informal, desde que preenchidos cumulativamente determinados requisitos.

As novas condições aplicam-se aos pedidos de reconhecimento do estatuto de cuidador informal pendentes de decisão à data da sua entrada em vigor.

2022-01-06

O Governo alterou as regras de acesso ao apoio à retoma progressiva da atividade, através da Portaria n.º 22/2022, de 6 de janeiro.

Previamente à referida alteração, não era possível, no final do período de concessão do novo incentivo à normalização da atividade empresarial ou do apoio simplificado para microempresas, que as empresas que tivessem beneficiado de um desses apoios recorressem ao apoio à retoma progressiva da atividade. O acesso à retoma progressiva da atividade apenas era possível com a desistência dos outros referidos apoios.

Com a nova alteração, após beneficiarem de um dos dois apoios (incentivo à normalização a atividade ou apoio simplificado) as empresas podem beneficiar sequencialmente do apoio à retoma progressiva da atividade.

As novas alterações entram em vigor a partir do dia 7 de janeiro, produzindo efeitos desde 1 de janeiro de 2022.