No nosso artigo do mês passado que pode ainda ser visitado aqui no site do Dinheiro Vivo em https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/networking-iv-pontos-de-partida-vs-pontos-de-chegada/, defendemos a ideia que a possibilidade de criação de uma rede de relacionamentos profissional está ao alcance de todos, na medida em que tudo aquilo que nós fomos ou somos, assim como o que representámos ou representamos enquanto membros de uma comunidade familiar, social, académica e/ou profissional são a base de partida para o desenho de uma estratégia pessoal com vista alcançarmos os nossos objectivos no futuro mais ou menos imediatos.

A geometria enquanto ramo das ciências matemáticas sempre foi de extrema utilidade para o Homem, desde que dos seus primórdios alguns dos seus princípios foram identificados e trabalhados em prol das comunidades e do seu desenvolvimento.

De igual forma, a geometria é vulgarmente descrita de forma simplista como “um ramo da matemática preocupado com questões de forma, tamanho e posição relativa de figuras e com as propriedades dos espaços” (sendo o sublinhado nosso).

Com efeito é nas expressões “posição relativa de figuras” e “propriedades dos espaços” que teremos de nos inspirar para de alguma forma conseguirmos esquematizar o conceito de uma rede de relacionamentos.

Nos dias de hoje, mais do que nunca, tudo (e todos) aquilo que nos rodeia acaba e alguma forma por estar interligado ou conectado.
Torna-se óbvio que a busca do sucesso profissional que ambicionamos torna-se uma tarefa mais árdua se porventura nos abstrairmos e/ou retirarmo-nos desses “circuitos”.                                          

Ou seja, penso que será fácil induzir da leitura da figura acima, dois grupos de simples conclusões, na medida em que tudo à nossa volta acaba de uma forma ou de outra estar interligado entre si (representados pelos círculos e segmentos de recta) e que se nos isolarmos dessas redes de contacto e relacionamento, acabamos, no fundo, por nos “desligar” do mundo e das possibilidades que ele nos possa trazer (representado pelo rectângulo central).

Complementarmente e pela interpretação da mesma imagem gráfica é ainda possível concluir que por muito periférica seja a minha posição relativa num determinado espaço/universo é mais fácil chegar ao seu outro extremo, se estiver devidamente conectado ou relacionado com todos os demais. 

Pensamos ainda que apesar de fácil percepção, o raciocínio que quisemos demonstrar ao leitor pela conjugação do diagrama e subsequentes sentenças supra referenciadas deve ser complementado no presente artigo com uma outra imagem não menos importante para preencher esta conceptualização geométrica de rede de que falamos.

Assim, gostaríamos de deixar ao cuidado de quem nos dedica alguns minutos do seu tempo, uma segunda linha de pensamento complementar, representada por um outro diagrama composto por um conjunto de pontos (tentando assim representar todos e cada um de nós), partindo de um elemento central (o “eu” desejado), unidos por vários segmentos de recta (representativos dos canais de relacionamento, ligação e/ou conexão entre sujeitos), em órbitas distintas, em que o primeiro anel/órbita representa os meus “contactos directos” (quem eu conheço e me relaciono) e o segundo os meus “contactos indirectos” (aqueles que se relacionam não comigo mas sim com quem eu conheço/relaciono).
                                           
No fundo, haverá sempre um objectivo infindável ao longo da implementação da nossa estratégia pessoal para criação e desenvolvimento de uma (boa) rede de relacionamentos a que nos referimos no nosso artigo de Março (https://www.dinheirovivo.pt/outras/opiniao-estrategia-pessoal-para-a-criacao-de-uma-boa-rede-de-networking/)...

Transformar cada um dos “contactos indirectos” de segundo grau orbital em “contactos directos” de primeiro nível na minha primeira linha de relacionamento. Ou seja tornar-me cada mais auto-suficiente e independente na gestão da minha rede de networking.

À medida que o sucesso de implementação destes conceitos se tornem eficazes, cada vez mais todos os outros sujeitos que me rodeiam irão socorrer-se da minha rede, ao ponto de poder tornar-me aquilo que alguns académicos já apelidaram de “Super conexão”, mas sobre isso falaremos no nosso próximo artigo aqui no Dinheiro Vivo durante o mês de Junho.

O Networking pode ser (mesmo) para todos.

Um dos pontos de conversa mais habituais com os meus interlocutores sobre este tema, acaba sempre por incidir na questão de que nem todos os indivíduos têm a capacidade/possibilidade/oportunidade de criar uma rede de networking.

O termo aplicado vai-se alterando conforme o sujeito da conversa, mas acaba sempre no fundo por se basear em algo que mais do que uma sentença fatalista, pois refugia-se sempre no mesmo (falso) pressuposto dogmático - O networking não é para todos…

Contudo, considero que tal não corresponde minimamente à verdade.

Para sermos precisos, não podemos ignorar que, decorrente de um conjunto de factores endógenos ou exógenos, como a nossa personalidade, profissão ou a empresa onde trabalhamos, a criação de uma rede de networking acaba sempre por ser influenciada por esses e tantos outros elementos.

Ora, no nosso artigo do mês de Março sobre o tema do Networking sobre o qual temos vindo a escrever ao longo deste ano de 2017 e o qual pode ser lido em https://www.dinheirovivo.pt/outras/opiniao-estrategia-pessoal-para-a-criacao-de-uma-boa-rede-de-networking/, referíamos que a estratégia pessoal que cada um de nós tem de desenvolver e implementar para a criação de uma (boa) rede de relacionamentos, deve ser levada a cabo não só de forma intelectualmente honesta e altruísta, mas também de forma “personalizada” a qual dependerá de uma correcta e honesta análise critica ao(s) ecossistema(s) onde cada um de nós está inserido e da sua própria personalidade.

Ou seja, a correcta, fria, humilde e objectiva análise supra referida permitir-nos-á chegar aquilo a que habitualmente designo como os nossos “pontos de partida” por contraponto aos “pontos de chegada”, sendo estes últimos os objectivos a que nos propomos com o desenvolvimento da estratégia de que falamos.

Então, o que será isso dos “Pontos de Partida”? Simples…

Basta começar a responder a perguntas tão acessíveis como “Quem sou?”,  “Como sou?”, “O que faço?”, “Quem conheço?”, “Onde estudei?”, “Com quem estudei?”, “Onde trabalho?”, “O que gosto de fazer?”, “Onde gosto de ir/estar?”, etc, etc.

No fundo, quando afirmamos que o networking pode (e deve) ser para todos, partimos do pressuposto que cada um de nós tem um passado e um presente e seja ele qual for dar-nos-á as referências mínimas para podermos desenvolver a tal estratégia pessoal de que falávamos no nosso artigo de Março acima referenciado.

Contudo, estes “Pontos de Partida” não vivem sozinhos na elaboração do nosso plano de criação de uma rede de relacionamentos na medida em que precisam da definição ambiciosa mas realista dos objectivos que pretendemos alcançar. Ou seja, os “Pontos de Chegada”:

“Quem quero ser?”, “Quem quero conhecer?”, “O que quero fazer?”, “Onde quero trabalhar?”, são algumas das perguntas que poderemos fazer a nós próprios para definir e identificar os nossos objectivos pessoais e profissionais.

Por isso, tenho por hábito e sempre de forma amplamente convicta que todos os “pontos de partida” de cada um de nós são potenciais “pontos de chegada”, sendo a definição destes últimos, um processo dinâmico e como tal não estanque ao longo da nossa vida.

Se dúvidas ainda existirem tomemos como exemplos básicos e referências simples tais como a nossa naturalidade e/ou nacionalidade, profissão que desempenhamos, a escola ou universidade que frequentámos, as próprias relações familiares e/ou sociais, os hobbies de que gostamos, os desportos que praticamos, ou até mesmo o local onde habitualmente passamos férias.

Quase todos nós conhecemos histórias de alguém que fez um negócio ou arranjou um (primeiro ou novo) emprego através de uma qualquer situação decorrente do parágrafo anterior.

Contudo, penso que não será necessário ser dotado de grandes conhecimentos de Física para perceber que não é possível mover-nos de um ponto para um outro predefinido sem a dinâmica e análise correcta.

O conceito da proactividade enquanto acção para resolução ou antecipação de uma consequência futura, é imperativo em todo este processo.

Sem ela e sem uma boa dose de voluntarismo, resiliência, honestidade intelectual e capacidade de análise correctamente dimensionada tudo fica mais difícil e complicado.

Em suma, a todos é possível construir uma rede de networking se para isso levarmos em conta que tal implica a criação de relacionamentos (Artigo Networking I), de forma verdadeiramente interessada (Artigo Networking II), com base numa estratégia pessoal e personalizada (Artigo Networking III), ainda que para tal, tenhamos cada um de nós de levar em linha de conta os nossos “Pontos de partida” de forma a alcançar os “Pontos de Chegada” que de forma ambiciosa mas exequível traçamos a cada momento das nossas vidas.

 

O que as empresas devem fazer para cumprir as obrigações do Regulamento Europeu sobre a Proteção de Dados Pessoais?

O Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados Pessoais ("RGPD"), que entrará em vigor em 25 de maio do próximo ano, irá trazer significativas alterações – as maiores dos últimos vinte anos – no âmbito da proteção de dados e com impacto relevante no dia-a-dia das empresas. Poderá pensar que estará a salvo das novas regras ou que tão pouco se aplicarão à sua organização, mas não é verdade.

A sua empresa não tem colaboradores? E clientes a quem vende produtos e/ou presta serviços? Quando um dos seus colaboradores se desloca ao estrangeiro não levará consigo um telemóvel, tablet ou computador portátil com, entre outros, dados de contato?

Se respondeu que sim às perguntas anteriores, deverá ficar agora alerta para as novas regras e começar já a pensar no que terá de fazer. Neste momento, já deveria ter um plano definido, mas, se não for o caso, as próximas linhas poderão ajudá-lo.

Em primeiro lugar, crie um sistema de registo de dados ou, se já tiver um, reveja-o para identificar que dados são recolhidos, onde, como e porquê. Para isso poderá ser necessário realizar uma auditoria.

Em segundo lugar, reveja a sua política de privacidade, que terá de ser acessível, clara e simples e incluir informação mais detalhada sobre o responsável pelo tratamento, os fins do tratamento e os meios para o exercício dos direitos pelos titulares dos dados.

Deverá ainda rever o meio pelo qual obtém o consentimento do titular dos dados, uma vez que poderá ter de obter novos consentimentos. O consentimento deverá traduzir-se numa manifestação de vontade livre, específica, informada e inequívoca. Não salte esta etapa, pois poderá ter de demonstrar que o consentimento foi dado junto da Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Se a sua empresa recorre a um subcontratante para, por sua conta, proceder ao tratamento dos dados, poderá ainda ser necessário rever os contratos existentes.

Em terceiro lugar, verifique se possui os meios necessários para permitir o exercício dos “renovados” direitos dos titulares dos dados, em particular, do "direito à portabilidade " (do direito de o titular receber os dados que lhe digam respeito e de os transmitir a outras empresas) e do "direito a ser esquecido" (do direito ao apagamento dos dados) e se a sua empresa estará apta a responder, num curto prazo, a esses pedidos.

Em quarto lugar, procure assegurar formação adequada aos seus colaboradores e confirme se terá de designar um Encarregado da Proteção de Dados ou, ainda assim, pondere designar um para melhor assegurar o cumprimento do RGPD.

Em quinto lugar, procure avaliar o tipo de tratamento de dados que projeta realizar num futuro próximo, por forma a adotar, desde o início, medidas de proteção integralmente incorporadas no seu sistema (proteção “desde a conceção”) e, por isso, mais eficazes, simples e difíceis de contornar.

Em sexto lugar, reveja as suas medidas de segurança e pondere adotar, em caso de violação de dados, um procedimento de notificação à Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Em último lugar, analise se o RGPD terá impacto na transferência de dados para fora da União Europeia no âmbito da sua organização e pense em adotar uma solução-chave que justifique essas transferências, por exemplo, cláusulas contratuais tipo, acordos intragrupo, códigos de conduta.

Se o plano anterior não o encorajou, o risco de multas de 20 milhões de euros ou até 4% do volume de negócios anual do seu grupo empresarial será, sem dúvida, um incentivo mais do que suficiente. Não deixe passar esta oportunidade, a contagem decrescente para maio de 2018 já começou.

Aos leitores do Dinheiro Vivo que porventura não nos acompanharam nos primeiros artigos sobre o tema em epígrafe, convém alertar (ou simplesmente recordar aqueles que desde Janeiro último o têm vindo a fazer) que o plano subjacente ao presente projecto, será o de ao longo destes meses e em cada um dos artigos, tentar tratar de forma ainda que “resumida e compactada”, um tema, área, capítulo ou vector sobre o Networking. Desta forma, ainda que os artigos estejam pensados para viverem de forma individual, acabam por estar obviamente ligados entre si.

Por isso, nos dois primeiro artigos que podem ser (re)vistos nos links  (https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/networking-i-um-pensamento-out-of-the-box/ e https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/opiniao-networking-ii/) o objectivo principal dos mesmos foi transmitir duas ideias simples, genéricas e abstractas mas transversais a todos nós que desejamos e/ou  necessitamos de desenvolver uma boa rede de networking.

Ou seja, mais do que uma boa rede de contactos, uma boa rede de networking pressupõe uma boa rede de relacionamentos e que, entre outras coisas, tal só é possível com investimento de tempo, atenção e sincero altruísmo. 

Ora, o artigo de hoje pretende sair do campo da abstracção e generalidade inerentes aos primeiros artigos, para tentar focar um pouco mais no individual, na especificidade de cada um de nós.

Isto porque é comum por vezes ouvir dizer que o “networking não é para mim”, ou por exemplo que “não tenho feitio para isso”, entre outros argumentos que vou escutando por aí (na realidade, por vezes são mais desculpas que outra coisa).

Na verdade, entendo que o networking pode e deve ser desenvolvido por todos.

É óbvio que as características pessoais de cada sujeito, tais como a sua personalidade, profissão, habilitação académica, sexo, religião, raça, nacionalidade, entre outros factores, são com certeza definidores de uma maior ou menor propensão para a interacção em determinadas situações.

Contudo, até hoje, de todos aqueles que de mim se aproximaram revelando as suas dificuldades em criar uma rede de networking, em nenhum verifiquei uma total impossibilidade inata ou natural de tal poder acontecer.

O principal erro, quando não decorrem de um dos dois factores genéricos mas transversais tratados nos primeiros dois artigos de que fizemos referência no inicio do presente artigo, acaba quase sempre por cair na deficiente abordagem que cada um de nós deve ter ao tema.

Isto porque, acredito como sendo indispensável à concretização de tal desígnio a definição de uma verdadeira, honesta e correcta estratégia pessoal se temos como fim a criação de uma boa rede de relacionamentos.

Mas o desenvolvimento efectivo e funcional de uma boa estratégia pessoal para a criação de uma boa rede de networking tem de partir de uma correcta e honesta análise da situação pessoal, profissional, social e até familiar de cada um de nós, assim como dos objectivos ambiciosos mas realistas que desejamos alcançar.

As acções específicas em si (no fundo aquilo que seria um “plano operacional” de um qualquer projecto ou empreitada) acabarão sempre por decorrer desta primeira análise e abordagem estratégica pessoal.

Com toda a certeza e como supra aludido, cada um de nós está envolvido num ecossistema familiar, profissional, familiar e social e todos eles distintos de sujeito para sujeito. O que não acontece é algum de nós não ter nenhum…

E essa é com certeza a base de análise e desenvolvimento da estratégia e plano para todos aqueles que pretendem levar a cabo a tarefa de criar uma rede de networking.

Por isso, até como reforço do que acima referencio, mais do que a necessidade de criar uma estratégia “pessoal” (porque deverá ser a minha estratégia) há que concebê-la e implementá-la de forma “personalizada” (porque deverá ser adaptada à minha pessoa).

Isto porque, na medida em que aquilo que de forma especifica se aplicará a mim, com toda a certeza não poderá ser decalcado por completo para nenhum outro individuo. Pode-me inspirar, servir de modelo, de referência e/ou de guia…mas não deve servir outro propósito que não esse.

A análise feita ao(s) ecossistema(s) supra referido em que cada um de nós está envolto, permitir-nos-á chegar aquilo a que habitualmente designo como os nossos “pontos de partida” por contraponto aos “pontos de chegada”, sendo estes últimos os objectivos a que nos propomos com o desenvolvimento da estratégia de que falamos… mas disto falaremos mais especificamente no nosso próximo artigo de Abril.

O tema da reindustrialização portuguesa não pode realmente ser visto separadamente do quadro bem mais vasto da reindustrialização da Europa ocidental. Dito isto, deve dizer-se que Portugal tem condições para poder afirmar-se como um espaço de inovação e de desenvolvimento de excelência nestes tempos desafiantes da 4.ª revolução industrial: tem infraestruturas; tem instituições de investigação e estabelecimentos de ensino de referência; é um espaço aberto ao mundo, de emigração e imigração cada vez mais qualificadas; é uma zona de segurança e acolhimento, de lazer e bem-estar; oferece força de trabalho e competências diversificadas e de qualidade, com notável capacidade de adaptação, resiliência e criatividade; tem acesso a uma plataforma continental vastíssima; oferece condições naturais belíssimas, tornando-o um destino de exceção para turismo e residência.

Portugal apresenta-se, pois, a priori, como um destino privilegiado quer de investimento direto, quer de estabelecimento de quadros qualificados quer, por fim, de quadros em fim de vida profissional ativa. Os dirigentes e centros de reflexão portugueses estão naturalmente cientes destas realidades e desafios.

Mais especificamente no referente a 2017, é justo dizer que o documento das Grandes Opções do Plano para 2017 não deixa de os abordar. Então, que razões impedem Portugal de crescer substancialmente mais, afirmando-se como o centro de reindustrialização que poderia e deveria ser? A meu ver, e para além quer da situação geográfica do país, quer dos fatores externos, devem destacar-se os seguintes fatores internos, alguns deles com raízes já muito profundas no tempo e que carecem de ser revertidos: (a) carga tributária incomportável; (b) incerteza jurídica; (c) sobrepeso do Estado, dos poderes públicos e do funcionalismo público na economia; (d) nível excessivo da dívida externa e situação delicada da banca nacional, ademais avessa a apoiar projetos verdadeiramente inovadores e disruptivos; (e) tradição do Estado e dos poderes públicos de intervir e pretender escolher sectores e atores privilegiados da atividade económica, em detrimento do mercado. E se é verdade que em anos recentes os portugueses conseguiram a proeza de uma saída limpa da situação de resgate financeiro e de absoluta dependência das instituições internacionais, em grande medida por via de um esforço de contração do Estado e dos poderes públicos e por efeito de um acelerado e eficaz redireccionamento do sector privado para a produção de bens transacionáveis, a verdade é que hoje, em 2017, por via da ação de um Governo refém de partidos políticos de assumida orientação estatista e socializante, os sinais positivos começam infelizmente a perder-se, com a dívida externa a aumentar por contrapartida do aumento da despesa corrente do Estado e do consumo privado e com os juros da dívida pública a regressarem a níveis preocupantes.

 

Mais de dois anos volvidos sobre a resolução do BES, continuamos sem saber qual será o futuro do Novo Banco. Anunciada por três vezes a venda, primeiro para agosto de 2015, depois para agosto de 2016 e por fim para dezembro de 2016, nada aconteceu.

Pior, os potenciais candidatos à compra foram descendo o valor oferecido. Primeiro os chineses da Fosun, diz-se, terão oferecido 2.000 milhões de euros, oferta rejeitada pelo governo anterior por implicar uma perda de parte do montante investido em 2014, 4.900 milhões, o que não convinha com as eleições à porta.

Depois disso o Banco de Portugal imporia uma segunda medida de resolução, libertando o banco de pagar cerca de 2.000 milhões à custa de um pequeno grupo de obrigacionistas “sénior”.

Em novembro de 2016 noticiava-se o interesse de uma firma chinesa que não lograria avançar com as garantias exigidas pelo Banco de Portugal. Em fevereiro de 2017, está na mesa uma oferta da Lone Star no valor que consta ser de 750 milhões de euros ou mesmo inferior. Entretanto, as partes teriam negociado a redução do preço para um valor meramente simbólico, abdicando o comprador da exigência de garantia do Estado contra o risco associado ao chamado “side bank” do Novo Banco, ou seja os ativos não rentáveis que estão registados no seu balanço. Este risco resultaria de estes ativos – nomeadamente imóveis – poderem valer menos do que o valor que lhes é atribuído no balanço, não obstante entretanto terem sido registadas imparidades significativas.

“Nacionalize-se o Novo Banco” clamam os partidos da extrema esquerda. 30 anos depois do 11 de março de 75, ainda há quem queira nacionalizar a banca. O partido no governo sugeriu uma nacionalização “temporária”. O uso da palavra “temporária” não é despiciendo porque permite dizer aos democratas que a economia de mercado não acabou e que o Estado apenas intervém porque tem de o fazer e não porque concorde com a ideologia dos seus parceiros da coligação. A outra razão está na lei. O Governo sabe que a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu não permitirão a nacionalização de um banco, em particular de um país pequeno como Portugal, triste cobaia na implementação da mais avançada legislação bancária europeia. Afinal, Portugal não é a Itália. Apenas a nacionalização “temporária” é permitida pelas leis de resolução bancária europeias. Daí o uso dessa palavra.

A verdade, porém, é que a lei apenas permite a “nacionalização temporária” como medida de “resolução” bancária, ou seja, se o Novo Banco estiver insolvente ou perto disso e o sistema bancário estiver em risco. Ora não é isso que sucede ou, pelo menos, não é isso que nos dizem.

Quais são, então, as opções possíveis?

Primeiro, o Fundo de Resolução poderia vender o banco a um dos fundos privados que se ofereceram para o comprar, dando as garantias sobre aquilo que for razoável dar, ou seja, faz sentido dar garantias sobre a legalidade e validade do processo de resolução e que o comprador e o banco não correrão riscos relativos aos lesados e aos obrigacionistas sénior, mas não faz sentido dar garantias relativas ao negócio do banco, a sua carteira de crédito, imparidades passadas ou futuras, reconhecidas ou não nas contas do banco. O verdadeiro problema desta solução está no preço que é oferecido, manifestamente abaixo do valor real e potencial do banco. O valor de mercado é baixo porque, em geral, os bancos são, nos dias que correm, um mau negócio, tal o nível de regulação imposto e os requisitos de capital. Os bancos terão valor no futuro quando se adaptarem às novas regras e à nova realidade de um mercado com menos crédito bancário. Para já não é assim, pelo que poucos são os que se aventuram a ter de esperar o tempo necessário para que a banca volte à mó de cima. Tudo isto faz com que Lone Star procure fazer descer o preço tanto quanto o vendedor deixar. O comprador do Novo Banco fará um grande negócio e o Estado um péssimo negócio.

Segundo, o Fundo de Resolução poderia liquidar o Novo Banco. O valor dos ativos do banco é suficiente para pagar a todos os credores e ainda sobra um valor significativo para reembolsar parte do capital investido em 2014. Contudo, esta solução não é politicamente aceitável e, em Portugal, o Estado faz maus negócios quando se trata de gerir ativos bancários como o caso BPN demonstra sobejamente.

Terceiro, o Estado poderia optar por enfrentar as autoridades europeias e nacionalizar o Novo Banco, temporária ou definitivamente, como pretendem as esquerdas e, claro, os outros banqueiros, pois não há melhor maneira de assim libertar os outros bancos dos prejuízos da venda ou liquidação. Como quase sempre, a nossa extrema esquerda e os interesses dominantes (mesmo os dos banqueiros) estão de mão dada. Esta é, sem dúvida a pior solução para o contribuinte que se arriscaria a ficar com um novo BPN. O bom da resolução do BES foi fazer impender a responsabilidade sobre os bancos e não sobre os contribuintes. É verdade que os bancos nos farão pagar a fatura em comissões e outras coisas, mas eu cá prefiro isso a que o Estado vá ao bolso do contribuinte.

Posto isto, parece que estamos entre a espada e a parede, vender ao desbarato ou liquidar serão sempre más soluções.

Existem alternativas? Sim. O Estado poderia negociar com a União Europeia e adiar a venda total, fazendo uma venda parcial a um parceiro estratégico, que poderia ser a Lone Star, e dispersar o capital em bolsa depois de reestruturar o Novo Banco quando o negócio bancário for mais atrativo, o que mais tarde ou mais cedo há de acontecer.

O Estado poderia ainda negociar a conversão em capital da divida sénior de grandes investidores, cedendo-lhes assim uma parte significativa do banco. Dessa forma, garantir-se-ia a capitalização do banco, a redução da dívida e a entrada de parceiros privados. Certamente, os grandes credores não aceitariam de bom grado essa solução, mas face às perdas já incorridas e à perspetiva de uma nova resolução ou mesmo da liquidação, essa solução ser-lhes-ia certamente menos penosa.

Em suma, o processo de resolução do BES, ainda que muito imperfeito, foi a solução menos custosa para o erário público e sê-lo-á sempre se não se cair nas derivas da esquerda, mas não se pode gerir a venda de um banco da forma amadora e voluntarista. O interesse público será sempre melhor defendido se os governos compreenderem bem como funcionam os mercados, seja o mercado da Ribeira, o mercado do Bulhão ou Wall Street.

2017-02-20

A abrir o ano, parece ter-se gerado consenso político no Parlamento para baixar as custas judiciais, ou seja, as taxas que é necessário pagar para ir a Tribunal.

As comparações internacionais sugerem que Portugal tem custas judiciais bastante baixas. O estudo ‘Doing Business 2017’ do Banco Mundial, que mede a facilidade das empresas em fazer negócios, classifica Portugal como o terceiro país da União Europeia, atrás do Luxemburgo e da Eslovénia, com os custos de litigância (incluindo custas judiciais) mais baixos. Ao mesmo tempo, as estatísticas demonstram que o atual sistema de custas judiciais, vigente desde 2008, não implicou uma diminuição acentuada do recurso aos Tribunais por parte de cidadãos e empresas.

Por essas razões, uma descida generalizada das custas judiciais pode, em muitos casos, não ser necessária e até ter efeitos perversos, resultando num congestionamento maior dos Tribunais e num tempo decisão acrescido. O que poderá ser desastroso: em 2015 o tempo médio de decisão em processos cíveis foi de uns assustadores 32 meses.

Qualquer alteração no valor das custas judiciais afeta a procura do serviço dos Tribunais. Como indicou o Professor Nuno Garoupa em artigo recente (DN, 31/1/2017), o que é necessário é determinar que modelo de Tribunais e que tempos de resposta queremos ter. Só é possível fazê-lo através de análise séria e cuidada e debate informado. Por agora, contribuindo para esse debate, é mais útil destacar alguns pontos que devem ser revistos.

Em primeiro lugar, deveria existir um limite às custas judiciais. Atualmente, não há. Quanto mais elevado o valor do litígio, mais elevado o montante de custas. Para um litígio de € 10 M, os custos totais para quem perde serão de cerca de € 300.000,00, (incluindo pagamento das custas pagas pela parte vencedora e compensação da parte vencedora por despesas com advogado). E este montante não inclui honorários de advogado da parte perdedora. O Juiz do processo pode determinar um desconto nestas situações. Mas essa possibilidade não atenua este problema: o desconto nem sempre é concedido e depende do entendimento de cada Juiz. Custas judiciais sem limite acabam por ser naturalmente desproporcionadas face ao serviço de justiça prestado pelo Tribunal e completamente desajustadas da realidade portuguesa.

Em segundo lugar, nos litígios que envolvam a vida das pessoas, como, por exemplo, divórcios ou regulação de responsabilidades parentais, as custas judiciais poderão ser, no mínimo, de cerca de € 600,00 para cada parte, não contando com honorários de advogados. Trata-se de valores incomportáveis para uma camada significativa da população. E que impressionam quando comparados com a inexistência de custas judiciais para cidadãos que vigora em Espanha. Não significa que estas custas judiciais devam ser eliminadas. Mas sim que deverão ser analisadas cuidadosamente, questionando a existência de custas iguais para cidadãos e empresas, e tentando isolar litígios pessoais deste tipo que mereçam um tratamento diferenciado.

No fundo, o consenso político em torno da descida generalizada das custas judiciais não se pode concretizar apenas numa descida generalizada das custas judiciais, sem ponderar os impactos na procura do sistema judicial e o modelo de Tribunais que queremos ter. Se assim for, acabaremos por daqui a uns anos estar a discutir a subida generalizada das custas judiciais. E é fácil perceber que isso é não sair do mesmo sítio.

 

2017-02-17

25 de maio de 2018. Falta, portanto, pouco mais de um ano para o início da vigência do Novo Regulamento Geral de Proteção de Dados em Portugal (“Regulamento”), pelo que começa a ser necessário traçar caminho no sentido da sua implementação - no caso de tal ainda não ter acontecido - até porque (ou principalmente porque) não será de um dia para o outro que a maior parte das regras aí previstas poderão ser postas em prática, pelas empresas.

A contratação de um “DPO”, por exemplo (“Data Protection Officer”, ou ”Encarregado de proteção de dados”), pode não ser tarefa fácil, já que os requisitos atinentes ao cargo são de tal forma específicos que poderão encontrar dificuldade de resposta, no nosso mercado de trabalho.

De acordo com o Regulamento, o DPO deve ser designado com base nas suas qualidades profissionais e, em especial, “nos conhecimentos especializados no domínio do direito e das práticas de proteção de dados”. Não se exige que seja um advogado, mas terá que ser alguém que, por um lado, tenha conhecimentos jurídicos relativamente vastos na área da proteção de dados e que, por outro lado, detenha comprovada experiência em lidar, na prática, com esta mesma matéria.

O DPO a designar terá também que ser alguém com capacidade para informar/ aconselhar a Administração da empresa e os seus trabalhadores a respeito das obrigações constantes do Regulamento, assim como das outras disposições de proteção de dados em vigor na UE e noutros Estados-Membros.

A pessoa deverá, pois, não só saber como ter capacidade para ensinar. A lei não exige um certificado ou diploma em formação de formadores, mas sem dúvida que se pretende que a pessoa designada tenha habilidade para comunicar, expor as suas ideias quer aos trabalhadores como à Direção e, efetivamente, fazer-se entender por todos os membros da empresa, que deverão ver no DPO alguém a quem podem recorrer, caso tenham alguma dúvida relacionada com o tratamento de dados.

Associada a esta exigência, surge igualmente a necessidade de conhecer a organização. E quando falamos em conhecer, não nos referimos a um conhecimento supérfluo, de quem entrou nas instalações e assistiu a um briefing sobre a atividade da empresa: a pessoa deverá conhecer os procedimentos de cada departamento, ser posta a par acerca dos mecanismos existentes (ou inexistentes) destinados à proteção dos dados pessoais de trabalhadores e de clientes e inteirar-se da vida da empresa, de forma a poder “organizá-la”, transmitindo as necessárias diretivas aos trabalhadores que integram a estrutura. É também nesse sentido que o Regulamento prevê que a empresa deve assegurar que o DPO é “envolvido, de forma adequada e em tempo útil”, em todas as questões relacionadas com a proteção de dados pessoais e que lhe devem fornecer os “recursos necessários” para o desempenho das suas funções.

Ao DPO exige-se também que controle a conformidade dos procedimentos adotados pela empresa com o Regulamento e com a restante legislação de proteção de dados e que coopere com a autoridade de controlo (CNPD) para assegurar o cumprimento da mesma.

Um DPO tem, portanto, que ser firme, já que deve poder discutir todas as questões relacionadas com privacidade a um nível superior - um papel que pode exigir dizer aos membros do Conselho de Administração coisas que eles não querem ouvir.

Deve também ser alguém que possa agir de forma independente e que seja capaz de manter uma ligação segura com a Comissão Nacional de Proteção de Dados, se necessário. Muito embora o Regulamento preveja que a empresa deve assegurar que o DPO não recebe instruções relativamente ao exercício das suas funções e que não pode ser destituído nem penalizado pelo exercício das mesmas, e sendo certo que existem países, como a Alemanha, em que o papel do DPO já se tem revelado como bastante independente, interventivo e denunciador, sem medo de informar o regulador acerca da não-conformidade da sua organização, surgem-nos algumas dúvidas acerca do sucesso da transposição deste cenário para o mercado português, com todas as diferenças culturais (e económicas) que o nosso país tem, em relação a outros países europeus. E se o Regulamento deixa à consideração da empresa contratar um DPO através de contrato de trabalho ou de prestação de serviços, claro nos parece que os deveres de lealdade e obediência característicos de uma relação laboral não se coadunam com o necessário papel de “denunciador” que um DPO pode ter que desempenhar, em relação à própria organização.

Do mesmo modo, apesar de o Regulamento estabelecer que o DPO pode ter outras funções na organização (cabendo à empresa assegurar a inexistência de conflito de interesses), parece-nos mais eficaz a designação de uma pessoa exclusivamente dedicada a esta função, que se consiga articular com os diferentes departamentos (IT, marketing, RH, jurídico, entre os demais) do que alguém que, a par da função de DPO tenha uma outra atividade.

O DPO deve também prestar aconselhamento sobre as avaliações de impacto sobre a proteção de dados e controlar a realização das mesmas. Assim, caso certo tipo de tratamento de dados pessoais seja suscetível de implicar um elevado risco para os direitos e liberdades das pessoas singulares, deve ser sujeito à emissão de um Parecer, por parte do DPO, acerca da avaliação do respetivo impacto sobre a proteção dos dados.

O DPO deve também promover a realização de auditorias para avaliação de todos os dados pessoais detidos pela empresa e verificação de que a sua detenção é apta para o fim a que se destina; deve rever os contratos existentes, avaliar o impacto de medidas previstas no Regulamento como sejam a Portabilidade dos Dados e o Direito ao Esquecimento e, enfim, ser capaz de tomar uma série de medidas que lhe permitam atuar como o defensor da privacidade dos dados da empresa, dos trabalhadores, dos clientes e/ou consumidores. Com todos os requisitos que se exigem de um DPO, um dos maiores desafios para as empresas, pelo menos inicialmente, talvez seja mesmo encontrar um.

 

(1) Regulamento (EU) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril, publicado em 04 de maio de 2016

No primeiro artigo que escrevi no mês passado para o Dinheiro Vivo sobre o tema do “Networking” e que poderá encontrar no link https://www.dinheirovivo.pt/opiniao/networking-i-um-pensamento-out-of-the-box/
tentei passar a mensagem principal de que uma boa rede de networking é muito mais do que uma simples rede de contactos.

Para podermos elevar e maximizar o retorno do nosso investimento na construção de tal rede, é imperativo, como então referi, que o objectivo seja o de idealizar, construir, alimentar, expandir e utilizar uma rede de “relacionamentos”.
Desta forma, não só como uma ilustração e abordagem simplista mas também com o objectivo de provocar intelectualmente o leitor, usei a agricultura e a contabilidade como referências comparativas inerentes a esse modelo de construção, em que a primeira (agricultura) pretende lembrar-nos o “tempo” implícito a tal investimento e o segundo (a contabilidade) pretende trazer-nos as referências necessárias sobre o “equilíbrio” na gestão dessa mesma rede.
Ora, é exactamente sobre este segundo aspecto que o artigo de hoje pretende de forma breve tratar…

Um dos aspectos mais relevantes (não será com certeza o único, mas é sem dúvida um dos alicerces fundamentais deste edifício) na construção de uma boa rede de networking é a honestidade intelectual e a disponibilidade altruísta que deve existir não só na génese da estratégia de abordagem aos nossos contactos, assim como durante a vida dos relacionamentos dos mesmos que se pretendem criar e alimentar.

É esta a razão do título do nosso artigo de hoje.

Se queremos ter sucesso na criação de uma boa rede de networking devemos ter como base a criação de uma relação verdadeiramente “interessada” e não apenas e somente uma relação “interesseira” com os nossos contactos.

Alguns académicos e estudiosos deste tema por esse mundo fora, têm vindo a catalogar esta última como aquilo a que apelidam de “networking transaccional” (https://hbr.org/2015/03/the-right-and-wrong-way-to-network) em que a intenção de criar uma relação apenas e somente como uma pura troca mercantil, mais tarde ou mais cedo será uma estratégia e/ou acção condenada ao fracasso.

Em sentido contrário, a criação de uma relação verdadeiramente interessada ou aquilo a que alguns tentam traduzir como uma filosofia de “givers gain”, assenta no conceito de que quanto mais oferecemos de nós, mais possibilidades temos também de receber… e é exactamente isso o objectivo de todos que interagem no(s) universo(s) que vamos criando à nossa volta.

Como é óbvio, na gestão da nossa rede de networking será natural que algum fruto dela se pretenda retirar. Contudo é importante referir que apesar dessa necessidade ou desejo estar quase sempre presente, haverá a necessidade de providenciar um ambiente de reciprocidade em que os ganhos e proveitos dessa relação possam ser mútuos ainda que não coincidentes, no tempo, espaço ou valor tangível ou intangível dos mesmos.

Por outro lado, senão cuidarmos desse equilíbrio na gestão dos nossos relacionamentos, dificilmente conseguiremos uma boa e produtiva rede de networking, na medida em que por muitos novos contactos que possamos desenvolver, dificilmente uma rede minimamente relevante será criada se não soubermos cuidar dos anteriores.

Resumindo, expressões ou formas de tentar verbalizar esta postura que nos deve guiar permanentemente na criação da nossa rede de networking poderão ser múltiplas.
Sobre o que não poderá haver duvida alguma é de que não é possível criar esse mundo de relacionamentos e seu retorno desejado, em que o sinal positivo, em que o sinal positivo dos mesmos seja meramente unidireccional e que o lançamento a crédito seja feito sempre a nosso favor (isto para usar a linguagem contabilística do nosso primeiro artigo)... e esta questão levar-nos-á a falar da criação de uma proposta de valor como base de uma estratégia pessoal na construção e alimentação de uma boa rede de networking, mas sobre tais temas falaremos nos nossos próximos artigos ao longo do corrente ano.

2017-02-11
Guilherme Dray

A recente decisão do US Court of Appeals for the Ninth Circuit, de 9 de fevereiro 2017, que manteve e confirmou a suspensão temporária da Executive Order n.º 13769, “Protecting the Nation From Foreign Terrorist Entry into the United States”, do Presidente Donald J. Trump, que impedia o acesso aos EUA de nacionais de sete países islâmicos, é também uma vitória da Academia e da Ciência contra o retrocesso académico e científico.

Com efeito, apesar de sustentar juridicamente a sua decisão no facto de a Executive Order ser inconstitucional, por violar a 1.ª Emenda (quanto à liberdade religiosa) e a 5.ª Emenda constitucionais (quanto à necessidade de um due process of law para a restrição de direitos, liberdades e garantias), grande parte da decisão deste tribunal de recurso assenta na legitimidade processual dos Estados de Washington e do Minnesota para intentar uma providência cautelar contra a referida Executive Order presidencial. Ora, o principal argumento utilizado pelos referidos Estados para justificar a sua legitimidade processual foi o de que a manutenção daquela Executive Order seria gravemente prejudicial para as suas universidades. No essencial, os Estados reclamantes invocaram que ao banir a entrada no país de nacionais de sete países islâmicos – Iraque, Irão, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iémen - a referida Executive Order era gravemente prejudicial para as universidades norte-americanas, fortemente centradas na internacionalização e no acolhimento de estudantes, investigadores e professores de diversas nacionalidades, religiões e culturas. O argumento é lapidar: ao banir a entrada no país de estudantes, professores e investigadores de determinados países, a Executive Order prejudica fortemente as universidades, que passam a ficar impedidas de escolher e atrair os cérebros daqueles países, como sempre o fizeram no passado. Em concreto, os Estados alegaram que os efeitos produzidos por aquela ordem presidencial já estavam a causar prejuízo para as respetivas universidades, pois a mesma impediu, nomeadamente, no dia seguinte ao da sua entrada em vigor, a entrada no país de dois visiting scholars para a Washington State University e de três investigadores, dois médicos e três cientistas que iriam ser acolhidos pela University of Washington e que também já tinham viagens agendadas para os Estados Unidos. O Estado de Washington alegou, em suma, que “ambas as universidades têm um compromisso internacional e que para o efeito necessitam de acolher estudantes, investigadores e professores internacionais”, objetivo esse que é incompatível com a criação de barreiras à entrada de estrangeiros. De resto, os argumentos invocados pelos Estados de Washington e do Minnesota replicam e fazem eco do que tem sido reclamado e reivindicado nestes últimos dias pela generalidade da comunidade académica, científica e tecnológica estado-unidense: o segredo do seu sucesso, o facto de ocuparem sucessiva e reiteradamente os primeiros lugares do ranking mundial, a riqueza do seu sistema educativo e o progresso científico e tecnológico que os Estados Unidos e as suas empresas têm logrado alcançar assenta também na diversidade cultural, na internacionalização e na capacidade de atrair estudantes, académicos, cientistas e investigadores estrangeiros. Impedir as universidades e as empresas de escolherem livremente os melhores e mais habilitados apenas porque aqueles provêm de países eminentemente islâmicos ou de qualquer outra religião, para além de ser discriminatório, vai contra o que aquelas instituições e empresas preconizam, podendo pôr em causa a sua estratégia de globalização.

O ambiente académico e científico estado-unidense vive da criatividade e da diversidade e partilha de opiniões e conhecimentos de diversos quadrantes. É essa a chave do seu sucesso. E é assim que as sociedades progridem e evoluem. Assim, o que esta decisão judicial vem reiterar, portanto, é que grande parte do sucesso académico, cultural, científico e tecnológico dos EUA se centra na abertura, na tolerância e na natureza intercultural das suas universidades e centros de investigação. Mais do que afirmar a liberdade religiosa, a proibição de discriminação em função de convicções religiosas e a necessidade de um due process of law para efeitos de limitação de quaisquer direitos, liberdades e garantias, o que a recente decisão jurisprudencial vem fazer, também, é afirmar a vitória da Academia e da Ciência contra o obscurantismo e o retrocesso científico.

Washington D.C., fevereiro de 2017

 

Poderá aqui aceder à decisão judicial que confirmou a suspensão da executive order.
Independentemente de se concordar ou não com a decisão, impressiona a simplicidade da fundamentação.