O Governo português, agora cessante, quer deixar uma marca no sector com nova legislação sobre o Sistema Elétrico Nacional (SEN) que se encontra em consulta pública desde o dia 10 e até o dia 24 de novembro. Resumimos aqui os principais eixos do novo diploma.
A atividade administrativa de controlo prévio das atividades do SEN e o planeamento das redes
Deixa de existir diferenciação entre Produção em Regime Ordinário (PRO) e Produção em Regime Especial (PRE) e, consequentemente, extinguem-se os procedimentos diferentes quanto ao licenciamento da atividade de produção de eletricidade.
As atividades de produção, autoconsumo e armazenamento estão agora abrangidas por um único regime de controlo prévio que pode revestir a forma de comunicação prévia, registo prévio e certificado de exploração, ou licença de produção e exploração.
No âmbito de planeamento das redes, a proposta de Decreto-lei faz depender os novos investimentos em infraestruturas de rede de uma análise de custo e benefício relativamente a outras alternativas, tais como o armazenamento.
Mecanismos concorrenciais para o exercício das atividades do SEN
Faz-se depender a atribuição de licenças de (i) Comercializador de Último Recurso (CUR), (ii) Agregador de Último Recurso, (iii) emissão de garantias de origem e (iv) Operador Logístico de Mudança de Comercializador e de Agregador (OLMCA), de um prévio procedimento concorrencial.
O diploma prevê uma nova figura: o gestor integrado das redes de distribuição em Alta Tensão, Média Tensão e Baixa Tensão, que exercerá a atividade em regime de concessão, atribuída mediante prévio procedimento concorrencial.
As atividades de produção e de armazenamento de eletricidade passam a ser exclusivamente remuneradas a um preço livremente determinado em mercados organizados ou através de contratos bilaterais, eliminando-se de vez o regime de remuneração garantida.
Prevê-se, não obstante, a possibilidade de estabelecer regimes de apoio à produção a partir de fontes de energia renováveis, por exemplo, mediante a atribuição de prémios, fixos ou variáveis, condicionados à realização de procedimentos concorrenciais.
Participação ativa dos consumidores, na produção e nos mercados
Os consumidores passivos passam a agentes ativos produtores de eletricidade para autoconsumo ou para venda de excedentes e armazenamento com:
- A instalação de infraestruturas das redes inteligentes as quais abarcam sistemas e tecnologias de comunicações e tratamento dos dados de energia e os contadores inteligentes;
- Participação dos consumidores nos mercados de eletricidade através da criação da figura do agregador;
- Novos regimes para o autoconsumo coletivo e a partilha de energia através do estabelecimento de comunidades de energia.
Reforçam-se os deveres do comercializador que deve disponibilizar contratos de eletricidade a preços dinâmicos quando tenham mais de 200.000 clientes, na condição das respetivas instalações de consumo disporem de um contador inteligente.
No caso de o cliente dispor de um contador inteligente, o comercializador passa a ter, igualmente, o dever de incluir na fatura a distribuição do consumo médio de energia pelos dias da semana e horas do dia.
Quando o consumidor disponha de um contador inteligente, este tem direito, mediante pedido, ao acesso do consumo real de eletricidade e ao período de utilização efetivo, devendo estes dados ser de fácil acesso e não comportando custos adicionais.O consumidor tem ainda direito a informações complementares relacionadas com o histórico de consumo e dados pormenorizados relativamente aos períodos de utilização.
A proposta de Decreto-Lei prevê ainda um regime para a apropriação ilícita de energia.
Novas realidades: o reequipamento, os híbridos ou a hibridização e o armazenamento.
Prevê-se a criação de três Zonas Livres Tecnológicas (ZLT) para facilitar o desenvolvimento em novas realidades: (i) a primeira destinada a projetos-piloto de investigação e desenvolvimento no âmbito da produção de eletricidade offshore, a partir de energias renováveis de fonte ou localização oceânica; (ii) a segunda a desenvolver no âmbito do processo de descomissionamento da central termoelétrica a carvão do Pego, (iii) a última, a localizar no Perímetro de Rega do Mira, destinada ao estabelecimento de projetos de inovação e desenvolvimento no âmbito da compatibilização do uso do solo para atividades agrícola e de produção de eletricidade.
A proposta também prevê que o reequipamento de centro electroprodutor de fonte primária solar ou eólica não se encontra sujeito ao procedimento de avaliação de impacte ambiental. Por sua vez, mediante reequipamento total do centro electroprodutor, a potência de ligação é acrescida até um máximo de 20 % da potência de ligação inicialmente atribuída, sujeito a um procedimento de controlo prévio simples de mera alteração à licença de produção ou apenas de comunicação prévia.
O primeiro desafio ao mercado está lançado: o de responder em 15 dias a um tão amplo projeto de alteração ao enquadramento legal do sistema elétrico português.