O Governo português aprovou a primeira fase da privatização da companhia aérea portuguesa, TAP, incluindo a alienação de até 44,9% do capital a um investidor estratégico e 5% aos trabalhadores.

Esta decisão insere-se no âmbito do processo de reestruturação financeira do grupo TAP, iniciado em 2021, na sequência da pandemia de COVID-19. Neste contexto, o Estado injetou cerca de €3.200 milhões e reassumiu a totalidade do capital da empresa, após a saída do consórcio Atlantic Gateway — composto por David Neeleman, fundador da companhia aérea brasileira Azul, e Humberto Pedrosa, do Grupo Barraqueiro.

Embora tenha sido considerada a possibilidade de privatizar até 100% da TAP, o Governo defende que a venda de uma participação minoritária apresenta vantagens; no entanto, esta opção parece dever-se, em grande medida, às pressões tanto da esquerda como da direita contra uma privatização total. Com a proposta de privatização parcial, o Governo pretende assegurar a entrada de investidores privados que possam aportar financiamento adicional, sempre que necessário, bem como know-how técnico que contribua para valorizar a empresa e maximizar o retorno financeiro numa futura venda do capital remanescente, mantendo, contudo, o controlo das decisões estratégicas nas mãos do Estado. A venda de uma participação minoritária permite ainda alargar o leque de potenciais investidores, incluindo aqueles oriundos de países fora da União Europeia, uma vez que a legislação europeia exige que a maioria do capital seja detida por cidadãos ou empresas europeias.

Entre as condições da privatização que foram divulgadas destacam-se as seguintes:

  • Processo de venda. A venda será realizada por várias fases, a saber: a pré-qualificação dos interessados, a apresentação de propostas não vinculativas, a entrega de propostas vinculativas, a negociação final e a celebração do contrato.
  • Calendário. A processo deverá prolongar-se durante um ano, prevendo-se a concretização da venda para o terceiro trimestre de 2025.
  • Critérios de avaliação. A seleção do comprador privilegiará, nomeadamente, o plano industrial proposto, o crescimento da frota, o desenvolvimento de infraestruturas aeroportuárias em território nacional, o investimento em combustíveis sustentáveis e o montante financeiro imediato que os investidores estão dispostos a injetar na companhia, sendo que o Governo assume como principais preocupações a manutenção do hub da TAP em Lisboa, considerado essencial para a economia nacional e para o papel da companhia como plataforma de ligação entre a Europa, África e América do Sul, e a manutenção da identidade da TAP enquanto marca nacional, assegurando que esta não seja descaracterizada como mera subsidiária de um grupo internacional.
  • Gestão. Ao abrigo do modelo aprovado, os investidores privados assumirão a gestão, mas o Estado deverá ter direito de veto sobre assuntos estratégicos através de um acordo parassocial a propor pelos concorrentes.
  • Alienação do capital remanescente. O caderno de encargos a aprovar deverá atribuir um direito de preferência ao Estado numa eventual venda da participação do investidor privado e um direito de preferência ao investidor privado numa eventual venda futura do capital remanescente da TAP, sem que, em qualquer caso, exista uma obrigação de venda por parte do Estado.

Embora, à primeira vista, o novo modelo aprovado de gestão privada e capital maioritariamente público possa ter algumas virtualidades, tendo em conta a experiência passada, esta solução levanta vários riscos e desafios, nomeadamente:

  • Salvaguarda do retorno. Caso os investidores pretendam realizar investimentos significativos, é expectável que exijam mecanismos que salvaguardem o retorno esperado. Tais mecanismos poderão passar, por exemplo, por regras de distribuição de resultados que não se baseiem exclusivamente na percentagem de capital detida — algo que o Governo parece pretender impedir — ou por fórmulas de cálculo do preço de compra da futura participação de controlo que reflitam o contributo da sua gestão e dos investimentos efetuados na companhia. Esta última solução poderá reduzir o encaixe financeiro que o Estado venha a obter numa eventual alienação futura.
  • Risco de "nacionalização" de prejuízos. A experiência do anterior processo de privatização da TAP, que culminaria com a necessidade de nacionalização, criou um precedente difícil de ultrapassar se a TAP vier a ter problemas no futuro, sejam eles causados por uma estratégia errada, má gestão ou eventos fortuitos, como foi o caso da pandemia Covid19 que levou à injeção de fundos públicos hoje irrecuperáveis.
  • Interferência política na gestão. A manutenção do controlo do Estado poderá levar a que os investidores privados procurem salvaguardar a sua posição, reduzindo a margem de intervenção do Estado a aspetos muito limitados ou, em alternativa, exigirem formas alternativas de serem compensados por eventuais intervenções, sempre que estas afetem o retorno esperado, seja através de opções de venda da sua participação ou mediante ajustamentos ao preço. Exemplos passados com outras empresas semi-privatizadas, como a Portugal Telecom, mostram que a manutenção de uma supervisão política pode prejudicar a gestão e gerar conflitos de interesses que deveriam ser evitados nesta privatização.

Entre os interessados na privatização estão grandes grupos europeus, como a Lufthansa, a Air France-KLM e o grupo IAG, que detém, entre outras, a British Airways e a Iberia. Estes grupos já participaram na fase preliminar de consultas e manifestaram intenção de apresentar propostas. Não obstante, o Governo parece estar empenhado em procurar interessados fora da União Europeia, pelo que não será de excluir a participação de outros operadores.

O decreto-lei que estabelece as condições da privatização aprovadas pelo Governo deverá ser publicado em breve.

PRINCIPAIS INFORMAÇÕES

Capital social
100% detido pelo Estado Português (através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças)

Filiais
A TAP detém as seguintes filiais:

  • Portugália - Companhia Portuguesa de Transportes Aéreos S.A.
  • TAP Logistics Solutions, S.A.
  • SPdH – Serviços Portugueses de Handling, S.A.

Informação de natureza financeira

  • Lucro: €54 milhões
  • Receitas: €4.242 milhões (+1%)
  • EBITDA recorrente: €875 milhões (+21%)
  • EBIT recorrente: €383 milhões (+9%)
  • Oferta de lugares medida em ASK (2024): +1.6%
  • Receita por lugar medida em RPK (2024): +3.4%.
  • Dívida Líquida: €750.3 milhões
  • Classificações de crédito: BB- pela S&P e Ba3 pela Moody’s
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