2024-05-24

O Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (“Conselho Consultivo PGR”) proferiu recentemente um Parecer (4/2024) relativo ao direito à greve (no setor das infraestruturas ferroviárias) e aos seus limites, analisando a correspondência entre os serviços mínimos e o direito à retribuição de quem os valida, em particular quando há uma desconformidade entre os serviços efetivamente prestados e os serviços formalmente prestados, tendo referido o seguinte:

(i) O direito de greve, previsto no artigo 57º da Constituição é um direito fundamental, integrante do conjunto dos direitos, liberdades e garantias, diretamente aplicável e vinculante para entidades públicas e privadas e consubstancia uma parcela do princípio da socialidade, enquanto vertente fundamental do Estado de Direito democrático;

(ii) O direito de greve não se encontra definido na lei, sendo definido doutrinal e jurisprudencialmente como “abstenção coletiva e concertada da prestação de trabalho por um conjunto de trabalhadores com vista à satisfação de objetivos comuns”;

(iii) O direito à greve não é um direito absoluto;

(iv) Existem formas de declaração ou do exercício do direito à greve que são consideradas abusivas;

(v) A desproporção entre os prejuízos causados à entidade empregadora ou a terceiros e os prejuízos assumidos pelos trabalhadores não é, contudo, suficiente para provocar a ilicitude da greve ou para a denominar como “greve de maior prejuízo”, mas pode ter repercussões em matéria retributiva;

(vi) Por remissão do número 3 do artigo 57.º da CRP são definidas na lei as condições de prestação, durante a greve, de serviços necessários à segurança e manutenção de equipamentos e instalações, bem como de serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis;

(vii) Os serviços mínimos indispensáveis para ocorrer à satisfação de necessidades sociais impreteríveis e os meios necessários para os assegurar devem ser definidos por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou por acordo entre os representantes dos trabalhadores e os empregadores abrangidos pelo aviso prévio ou a respetiva associação de empregadores, sendo que, na ausência de previsão, os serviços mínimos são objeto de negociação na DGERT ou de definição por despacho ministerial ou por decisão arbitral;

(viii) Nas situações “em que por razões objetivas inultrapassáveis os serviços mínimos pressuponham a presença de todos os trabalhadores e em que estes por força da greve só realizem uma parte das suas tarefas diárias poderá ser reduzida a sua retribuição em função do volume de trabalho por estes efetivamente prestado”;

(ix) Mais, “a remuneração tem que ser correspondente ao trabalho prestado e à efetiva disponibilidade dos trabalhadores, pois, se assim não for, poderá afrontar as regras da gestão e, até, consubstanciar um enriquecimento indevido”;

Em suma: caso, por força da execução dos serviços mínimos, os trabalhadores apenas realizem parte das suas tarefas diárias “normais”, ainda que formalmente devam estar presentes no local de trabalho durante todo o respetivo período normal de trabalho, a empresa pode reduzir a remuneração dos trabalhadores, devendo esta ser paga em função do volume de trabalho efetivamente prestado e não em função da presença formal do trabalhador no local de trabalho.

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