Introdução
A nova Lei das Comunicações Eletrónicas (“LCE”), publicada no passado dia 16 de agosto de 2022, transpõe a Diretiva (UE) 2018/1972, que informa a mais recente reformulação do quadro regulamentar do setor estabelecendo o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (“CECE”).
Há 18 anos, Portugal optou pela condensação do essencial do então quadro regulamentar de 2002 num único diploma, o que facilitou a transposição do CECE mas não se traduziu num ganho de tempo nessa transposição. Podemos apontar como causa do atraso as convulsões do setor, e em particular o episódio da implementação da tecnologia 5G, mais do que a pandemia causada pelo vírus COVID-19, já que, quando esta foi declarada, já estava praticamente esgotado o prazo de transposição.
Tratando-se de um diploma totalmente novo, pode-se dizer que a nova LCE procurou manter (e bem) em grande parte o essencial da estrutura regulatória existente. No entanto, é importante sublinhar que não deixaram de ser introduzidas algumas alterações de relevo que terão certamente impacto no mercado.
Embora não esgote o elenco de alterações, a maior parte das novidades materiais mais relevantes estão concentradas em matérias relacionadas com os direitos dos consumidores, o regime sancionatório e o regime geral de privacidade nas comunicações eletrónicas. Em seguida, a título meramente exemplificativo, elencamos algumas.
Direitos dos consumidores
Relativamente às normas de proteção dos consumidores introduzidas pela nova lei, observamos algumas alterações:
- Período de retenção. De acordo com o novo n.º 3 do artigo 131.º, a disponibilidade de prestações com períodos de retenção mais curtos, 12 ou 6 meses, já não é obrigatória, contudo é definido um limite máximo de 24 meses.
- Indisponibilidade do serviço. A lei refere que qualquer situação reportada de indisponibilidade do serviço que se prolongue por mais do que 24 horas obriga ao crédito do valor equivalente por parte do operador. A devolução deste valor não se aplica somente aos casos em que há interrupções de mais de 24 horas consecutivas, mas também às situações em que as falhas somadas excedem esse tempo, por período de faturação. No entanto, para o consumidor poder rescindir o contrato sem custos, é necessário um período de 15 dias de persistência do problema, após este ser reportado.
- Situações em que não há cobrança de custos de rescisão antecipada. A nova LCE definiu um conjunto de situações perante as quais não podem ser cobrados custos de rescisão antecipada, como o desemprego (por facto não imputável ao consumidor), a incapacidade para o trabalho superior a 60 dias com quebras de rendimento ou a alteração de morada para um local onde o operador não possa disponibilizar um serviço equivalente.
Privacidade nas comunicações eletrónicas
- Alteração à Lei da Privacidade nas Comunicações Eletrónicas. No que diz respeito à Lei da Privacidade nas Comunicações Eletrónicas (Lei n.º 41/2004, de 18 de agosto), alteram-se os artigos 7.° e 10.° da mencionada lei. No essencial, as alterações prendem-se com o alargamento do universo das organizações a quem podem ser comunicados os dados pessoais de localização de comunicações de emergência, passando a abranger não apenas as organizações que têm competência legal para receber tais comunicações, mas também as competentes para as tratar
- Faturação detalhada. O n.°5 do artigo 122.° da nova LCE prevê que nas faturas detalhadas não é exigível a identificação das chamadas facultadas a título gratuito, incluindo as chamadas para serviços de assistência.
- Prevenção da contratação. Pela leitura do artigo 126.° não fica resulta claro se, no caso dos serviços prestados a uma empresa, quem vai integrar a base de dados é a empresa que contrata os serviços de comunicações eletrónicas ou se são os trabalhadores enquanto efetivos utilizadores dos serviços.
Regime sancionatório
O artigo 176.º da LCE, e em parte também o artigo 164.º, definem um novo quadro sancionatório muito alargado das comunicações eletrónicas em Portugal.
Mais alguns detalhes
- “Serviço de comunicações eletrónicas”. Alarga-se a definição de “serviço de comunicações eletrónicas” pelo que passa a incluir um leque atividades tipicamente realizadas por aplicações de mensagens instantâneas, correio eletrónico, chamadas telefónicas pela Internet e mensagens pessoais fornecidas através de meios de comunicação social.
- Regime de autorização geral. Impõe um dever de comunicação, segundo o qual as empresas que pretendam oferecer redes públicas de comunicações eletrónicas e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público devem comunicar previamente à Autoridade Reguladora Nacional (“ARN”) o início de atividade.