Introdução
O Estatuto do Cliente Eletrointensivo (“ECE” ou “Estatuto”) foi criado pelo Decreto-Lei n.º 15/2022, que estabelece a organização e funcionamento do Sistema Elétrico Nacional (“SEN”) e visa reforçar a competitividade das grandes indústrias consumidoras de eletricidade em Portugal.
Dirigido a instalações com consumos elétricos elevados, contínuos e previsíveis, o ECE pretende corrigir um dos principais fatores de desvantagem competitiva da indústria portuguesa: o custo da energia elétrica. Ao reduzir os preços finais pagos pela eletricidade e ao garantir acesso à energia em condições mais competitivas, o ECE procura nivelar o custo da energia para as empresas portuguesas num contexto internacional cada vez mais exigente.
O ECE permite aos clientes beneficiar de reduções ou isenções de diversos encargos associados ao SEN — designadamente dos Custos de Interesse Económico Geral (“CIEG”) —, bem como de compensações pelos custos indiretos de CO?, da dispensa do critério de proximidade entre a Unidade de Produção para Autoconsumo (“UPAC”) e a instalação de consumo, e ainda do acesso a um mecanismo de cobertura de risco aplicável à celebração de contratos de longa duração para fornecimento de energia renovável.
A Portaria n.º 112/2022, veio regulamentar o ECE, definindo os requisitos de elegibilidade para adesão, bem como das obrigações e medidas de apoio às instalações abrangidas pelo Estatuto.
Contudo, a aplicação prática do ECE estava dependente de aprovação pela Comissão Europeia ao abrigo das regras de auxílios de Estado. Essa aprovação foi finalmente concedida no passado dia 24 de abril de 2025, desbloqueando a operacionalização do ECE.
Neste novo contexto, a Portaria n.º 203-A/2025/1, procede à primeira alteração ao regime de ECE, ajustando os requisitos de acesso, o modelo contratual de adesão e o respetivo quadro de obrigações e apoios.
Com uma dotação anual prevista de, pelo menos, 60 milhões de euros para cerca de 319 empresas, o ECE assume-se como uma ferramenta estratégica para o aumento da competitividade da indústria portuguesa.
Faz, agora que está em pleno vigor, todo o sentido analisar o regime do ECE à luz das alterações recentemente introduzidas com o objetivo de sistematizar os seus principais elementos e enquadramento atual.
Os Benefícios do Estatuto do Cliente Eletrointensivo
Redução Parcial de Encargos
A adesão ao ECE permite que as instalações consumidoras beneficiem de uma redução parcial dos Custos de Interesse Geral (“CIEG”) sobre o custo da energia elétrica adquirida na Rede Elétrica de Serviço Público (”RESP”).
A redução aplicável não poderá resultar numa taxa final inferior a 0,5 EUR/MWh.
- Redução de 85% do custo, se a instalação pertencer a um setor considerado em risco significativo, conforme estabelecido no Anexo I da Comunicação da Comissão Europeia 2022/C 80/01, sobre as “Orientações relativas a auxílios estatais à proteção do clima e do ambiente e à energia 2022”
- Redução de 75% do custo, se a instalação pertencer a um setor em risco, nos termos do mesmo Anexo. Esta redução poderá ser elevada para 85%, caso se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:
- ≥ 50% do consumo elétrico da instalação provém de fontes renováveis, e cumulativamente
- ≥ 10% do consumo elétrico da instalação seja assegurado por um instrumento de contratação a prazo ou contrato bilateral; ou
- ≥ 5% garantido por autoconsumo de origem renovável.
- O cumprimento da obrigação de comprovação de consumo abastecido por fonte renovável deve efetuar-se mediante o cancelamento, para a instalação consumidora, das correspondentes garantias de origem.
Redução Total de Encargos
A adesão ao ECE permite que as instalações consumidoras beneficiem, em caso de autoconsumo:
- Isenção total dos CIEG na energia veiculada através da RESP;
- Isenção dos critérios de proximidade entre a instalação de consumo e a unidade de produção para autoconsumo (“UPAC”).
-
A Redução total dos CIEG que incidam sobre a tarifa de uso global do sistema, na componente de energia elétrica autoconsumida através de UPAC, que seja veiculada através da RESP.
-
Isenção dos critério de proximidade entre as UPAC e a localização das instalações de consumo, que constitui um requisito para o exercício da atividade de produção para autoconsumo:
- 4 km para ligações em média tensão;
- 10 km para ligações em alta tensão; e
- 20 km para ligações em muito alta tensão.
Caso a ligação ocorra na mesma subestação, não há qualquer limitação de distância.
Mecanismo de Cobertura de Risco
O mecanismo de cobertura de risco para aquisição de eletricidade renovável a médio e longo prazo trata-se de uma ferramenta financeira que visa:
- Reduzir a exposição dos clientes eletrointensivos às variações de preços de eletricidade; e
- Estimular o consumo de energia renovável, através de uma garantia assegurada por entidades financeira, que cobre parte das obrigações contratuais, incentivando a celebração de contratos de aquisição de eletricidade renovável a médio e longo prazo.
-
Acesso a um mecanismo de cobertura de risco relativo ao pagamento do preço de aquisição a médio e longo prazo de eletricidade proveniente exclusivamente de fontes de energia renovável através de contratos bilaterais de longa duração, sujeito aos seguintes requisitos:
- Duração mínima do contrato de cinco anos; e
- Assegurar, no mínimo, 10% do consumo anual de energia elétrica;
- A cobertura de risco é assegurada por Sociedades de Garantia Mútua (“SGM”), com contragarantia as quais beneficiam, por sua vez, de uma contragarantia do Banco Português de Fomento, S.A., enquanto entidade gestora do Fundo de Contragarantia Mútuo.
- As SGM garantem a cobertura do risco de incumprimento do pagamento do preço estabelecido no contrato, limitada ao prejuízo efetivo.
- Por sua vez, o Banco Português de Fomento, S.A. assume as responsabilidades resultantes das obrigações garantidas pelas SGM, em percentagem não superior a 80%.
Adesão ao Estatuto do Cliente Eletrointensivo
O Pedido de Adesão
O pedido de adesão ao ECE é instruído com diversos elementos, nomeadamente:
- Identificação do requerente, da instalação de consumo, do setor ou subsetor e código da atividade da instalação;
- Comprovativo de contrato de fornecimento de eletricidade no mercado organizado, por via bilateral ou através de comercializador em regime livre;
- Comprovativo dos requisitos para o exercício da atividade da instalação de consumo, se aplicável:
- Regime de Comércio de Licenças de Emissão de Gases; e
- Sistema de Gestão de Consumos Intensivos de Energia.
- Declaração de consumos de energia elétrica e comprovativo da energia elétrica proveniente de autoconsumo e serviços de sistema, dos últimos três anos;
- Certificado auditado do valor acrescentado bruto anual da instalação de consumo dos últimos três anos;
- Declaração que comprove que não configura uma “Empresa em dificuldade "nos termos definidos UE 2014 C/249;
- Declaração que comprove que a Empresa não está sujeita a injunção de recuperação pendente, na sequência de um auxílio legal conforme decisão da Comissão Europeia;
- Declaração, sob compromisso de honra, de não ter recebido auxílio estatal para os mesmos custos elegíveis ou de que este não excede os limites legais.
O Pedido de Adesão de Forma Condicionada
O pedido de adesão de forma condicionada ao ECE é instruído com os seguintes elementos:
- Identificação do requerente, da instalação de consumo, existente ou futura, do setor ou subsetor e código da atividade da instalação;
- Comprovativo de contrato de fornecimento de eletricidade no mercado organizado, por via bilateral ou através de comercializador em regime livre;
- Declaração, sob compromisso de honra, de não ter recebido auxílio estatal para os mesmos custos elegíveis ou de que este não excede os limites legais.
- Memória descritiva com estimativa do consumo anual de energia elétrica e eletrointensidade para os quatro anos de contrato de adesão
- Estudo de desagregação com estimativa dos consumos previstos nos períodos horários de ponta, cheias, vazio normal e supervazio.
- Comprovativo histórico de energia proveniente autoconsumo e serviços de sistema e VAB anual, certificado e auditado, quando aplicável.
O Pedido de Adesão
O pedido de adesão ao ECE é instruído com diversos elementos, nomeadamente:
- Identificação do requerente, da instalação de consumo, do setor ou subsetor e código da atividade da instalação;
- Comprovativo de contrato de fornecimento de eletricidade no mercado organizado, por via bilateral ou através de comercializador em regime livre;
- Comprovativo dos requisitos para o exercício da atividade da instalação de consumo, se aplicável:
- Regime de Comércio de Licenças de Emissão de Gases; e
- Sistema de Gestão de Consumos Intensivos de Energia.
- Declaração de consumos de energia elétrica e comprovativo da energia elétrica proveniente de autoconsumo e serviços de sistema, dos últimos três anos;
- Certificado auditado do valor acrescentado bruto anual da instalação de consumo dos últimos três anos;
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Declaração que comprove que não configura uma “Empresa em dificuldade "nos termos definidos UE 2014 C/249;
Declaração que comprove que a Empresa não está sujeita a injunção de recuperação pendente, na sequência de um auxílio legal conforme decisão da Comissão Europeia;
Declaração, sob compromisso de honra, de não ter recebido auxílio estatal para os mesmos custos elegíveis ou de que este não excede os limites legais.
O Pedido de Adesão de Forma Condicionada
O pedido de adesão de forma condicionada ao ECE é instruído com os seguintes elementos:
- Identificação do requerente, da instalação de consumo, existente ou futura, do setor ou subsetor e código da atividade da instalação;
- Comprovativo de contrato de fornecimento de eletricidade no mercado organizado, por via bilateral ou através de comercializador em regime livre;
- Declaração, sob compromisso de honra, de não ter recebido auxílio estatal para os mesmos custos elegíveis ou de que este não excede os limites legais.
- Memória descritiva com estimativa do consumo anual de energia elétrica e eletrointensidade para os quatro anos de contrato de adesão
- Estudo de desagregação com estimativa dos consumos previstos nos períodos horários de ponta, cheias, vazio normal e supervazio.
- Comprovativo histórico de energia proveniente autoconsumo e serviços de sistema e VAB anual, certificado e auditado, quando aplicável.
Os Requisitos de Elegibilidade
Requisitos de Elegibilidade para Adesão Condicionada
Os consumidores de eletricidade com instalações de consumo com menos de três anos de atividade podem requerer a adesão ao ECE de forma condicionada, no ano civil anterior ao ano de instrução do pedido de adesão.
Obrigação do consumidor eletrointensivo
- Obriga-se a cumprir com os requisitos de elegibilidade em, pelo menos, dois dos três anos posteriores ao pedido de adesão.
Avaliação do cumprimento
- O cumprimento será avaliado com base em dados reais ou estimados.
O Contrato de Adesão
Cessação do Contrato de Adesão
A cessão do contrato de adesão compete ao diretor-geral da DGEG e tem como consequência:
- a cessação das medidas de apoio; e
- a devolução até 1 de julho do ano da verificação das causas de incumprimento, dos montantes correspondentes aos CIEG não pagos no período do contrato de adesão.
O contrato de adesão cessa nos seguintes casos:
- Renúncia;
- Cessação de atividade;
- Incumprimento superveniente dos requisitos de elegibilidade;
- Incumprimento da obrigação de comunicação de alterações às condições contratuais;
- Apresentação de elementos de informação falsos ou a prestação culposa de falsas declarações para a celebração, renovação ou conversão do contrato de adesão; e
- Incumprimento das regras aplicáveis às auditorias energéticas e sistemas de energia.
As instalações que obtenham o ECE devem apresentar à DGEG, até 30 de abril de cada ano civil do contrato, incluindo o ano civil subsequente ao do seu termo, os comprovativos de manutenção dos requisitos de elegibilidade através da disponibilização dos respetivos elementos comprovativos.
As Obrigações dos Clientes Eletrointensivos
Auditorias Energéticas e Sistemas de Gestão de Energia
As novas obrigações previstas no ECE asseguram a transparência e a responsabilidade na utilização dos benefícios públicos, incentivando simultaneamente uma melhoria contínua do desempenho energético das instalações e a adoção de práticas sustentáveis e eficientes no setor eletrointensivo.
As instalações que obtenham o ECE e que não estejam abrangidas pelo Sistema de Gestão dos Consumos (“GCIE) ficam obrigados à realização de uma auditoria energética realizada por técnicos reconhecidos, até ao final do primeiro ano civil do contrato, salvo os contratos de adesão condicionados, até ao final do segundo ano civil a partir do ano civil em que se verificou a sua entrada em exploração.
Além disso, devem cumprir pelo menos uma das seguintes ações:
- Implementação de todas as medidas de eficiência energética identificadas no relatório de auditoria energética com um período de retorno do investimento ≤ 3 anos;
- Investimento de ≥ 50% dos apoios recebidos em projetos de redução de emissões de GEE da instalação; ou
- Garantir que ≥ 30% do consumo elétrico provém de fontes renováveis, via: autoconsumo, garantias de origem, contratos bilaterais ou outros mecanismos equivalentes.
Relatório de Execução Final
Até 30 de abril do ano civil subsequente ao do termo do contrato, o cliente eletrointensivo deve apresentar o relatório execução final.
O relatório de execução final deve conter:
- Análise da evolução dos requisitos de elegibilidade;
- Relatório da auditoria energética;
- Comprovativos do cumprimento, de pelo menos, uma das ações obrigatórias (eficiência energética, redução de emissões ou uso de renováveis);
- Evidência da instalação e funcionamentos dos sistemas de mediação, registo e controlo; e
- Comprovativo da instalação, certificação e auditoria do sistema de gestão de energia.
Regime Transitório
As alterações ao ECE não prejudicam os contratos de adesão em vigor.
Os consumidores de eletricidade que já possuem o ECE e têm contratos em vigor para o ano de 2025 devem adaptar os seus contratos às novas regras definidas.
O pedido de conversão deverá, segundo a segundo a nota explicativa nº 2/DG/2025 da DGEG:
- ser requerido junto da DGEG, através do Portal do Cliente Eletrointensivo; e
- até 31 de maio de 2025.
A não apresentação do pedido de conversão até à data referida obriga à apresentação atempada de requerimento para renovação do ECE até 15 de junho de 2025, sob pena de cessação do contrato.