A querela jurisprudencial sobre a questão de saber se a atividade de alojamento local exercida em fração de prédio em propriedade horizontal destinada a habitação no respetivo título constitutivo se enquadra no conceito de habitação ou configura uma atividade comercial que viola aquele título constitutivo, teve um novo desenvolvimento.

Em acórdão de 23 de janeiro deste ano, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a indicação, no título constitutivo da propriedade horizontal, do destino das frações como sendo habitação não deve ser visto como mera repetição do indicado na autorização de utilização – desde logo, porque é menção facultativa – e que, pelo contrário, significa “para qualquer potencial adquirente das referidas frações (…) que a sua função económico-social é a de servir de fogos ou de residência para pessoas e agregados familiares, proporcionando-lhes o sossego, a tranquilidade, a segurança e o conforto requeridos por qualquer economia doméstica, num envolvente espaço comum instrumental desse tipo de convivência coletiva”.

Na apreciação que faz da atividade de alojamento local, o STJ concluiu que se trata de uma atividade comercial, sendo “artificioso dizer que essa atividade não é exercida pelo condómino na respetiva fração, quando o é precisamente mediante a utilização económica dessa fração, ao proporcioná-la onerosamente a terceiros”, e salientando que “uma vivência habitacional é essencialmente diversa da sua utilização em alojamento de terceiros (…).” que se caracteriza pela existência de “sucessivos e diversos utilizadores, transitórios”.

O STJ entendeu, ainda, que o facto de, para efeitos de registo do alojamento local, apenas se exigir a autorização de utilização e não o título constitutivo da propriedade horizontal não significa que o alojamento local integre o conceito de habitação. Significa, apenas, “que o legislador, em sede de registo dos estabelecimentos de alojamento local, teve como compatível com a atividade de alojamento local a mera existência de licença de construção ou de autorização de utilização para habitação, enquanto uso urbanístico.” (sublinhado nosso).

Referiu ainda o STJ que é em função do fim ou destino das frações configurado no título constitutivo da propriedade horizontal que cada condómino tem o direito de se opor a que qualquer das frações dos restantes condóminos seja usada para fim diverso do que lhe é destinado naquele título e que o facto de um condómino não poder usar a sua fração para esse outro fim diverso não afeta o seu direito de propriedade privada, pois este não é um direito absoluto.

Pelas razões acima resumidas, concluiu o STJ que na fração em causa não poderia ser desenvolvida a atividade de alojamento local por ser contrária ao fim habitacional a que se destinava a fração previsto no título constitutivo da propriedade horizontal.

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