2021-07-08

Através do Acórdão n.º 272/2021, de 6 de julho, que apreciou um pedido de declaração de inconstitucionalidade, o Tribunal Constitucional decidiu declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da interpretação conjugada das normas contidas no artigo 334.º do Código do Trabalho (CT) e no número 2 do artigo 481.º, proémio, do Código das Sociedades Comerciais (CSC), na parte em que impede a responsabilidade solidária da sociedade com sede fora do território nacional, em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo com uma sociedade portuguesa, pelos créditos emergentes da relação de trabalho subordinado estabelecida com esta, ou da sua rutura, por violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.

A interpretação apreciada situa-se numa zona de confluência entre o regime jurídico aplicável à relação emergente de contrato de trabalho e o direito das sociedades coligadas, refletindo o modo como a articulação entre ambos foi feita pelos tribunais comuns a partir da remissão consagrada no artigo 334.º do Código do Trabalho (“(…) termos previstos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais”).

Importa recordar o essencial dos normativos apreciados:

(i) Artigo 334.º do CT

Dispõe sobre as garantias de créditos do trabalhador em caso de incumprimento do contrato de trabalho, estabelecendo como regime-regra aplicável ao universo das sociedades colgadas o da responsabilidade solidária da Entidade Empregadora e da sociedade “que com esta se encontra em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, nos termos previstos nos artigos 481.º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais”.

(ii) Artigo 481.º do Código das Sociedades Comerciais

Define o âmbito de aplicação do regime jurídico das sociedades coligadas, previsto nos artigos 481.º a 508.º-F, subordinando-o à verificação cumulativa de dois pressupostos: (i) forma jurídica dos sujeitos intervenientes na relação de coligação e (ii) com o âmbito espacial de aplicação das normas consagradas no Título VI do mesmo diploma.

No essencial, o Tribunal entendeu que, assim como o trabalhador pode demandar indistintamente, por créditos laborais, duas sociedades coligadas quando ambas têm sede em Portugal, também o pode fazer mesmo quando uma delas tenha sede fora do território nacional. Se não o pudesse fazer, ou seja, se só as pudesse demandar quando ambas tivessem sede em Portuga, mas já não o pudesse fazer quando uma delas tivesse sede no estrangeiro, estaríamos a violar o princípio da igualdade.

O Tribunal entendeu que tal diferenciação não poderia ser considerada “razoável, racional e objetivamente fundada”, sendo contrária à CRP.

Em sede de fundamentação, o Tribunal afirmou, até, que a captação de investimento estrangeiro não constitui uma razão suficientemente forte e ponderosa para justificar, no âmbito do direito aplicável à coligação de sociedades, uma desigualdade de tratamento que derivaria da atribuição de distintas garantias pelos créditos laborais aos trabalhadores de sociedades dominadas, dependentes ou agrupadas, consoante a sociedade com esta coligada tivesse a sua sede localizada em pais estrangeiro ou em território nacional.

Em suma: a interpretação normativa julgada inconstitucional radica na impossibilidade de aplicar o regime da responsabilidade solidária da sociedade que esteja em relação de participações recíprocas, de domínio ou em grupo, quando esta tenha sede fora do território nacional, pelos créditos emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, vencidos há mais de três meses.

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